Análise do inimigo: Os Marcianos

Poucas raças alienígenas foram tão retratadas pela ficção científica quanto os habitantes do nosso planeta vizinho. De formas variadas, mas com características semelhantes, como pouca estatura, pele verde e cabeçudos, os marcianos veem a Terra como um lugar a conquistar, fazer travessuras ou simplesmente para destruir tudo.

Análise do inimigo: Os Marcianos




Leia também:


Poucos planetas exerceram tanta paixão e admiração da raça humana como Marte. Desde tempos antigos, que o planeta é observado e ainda hoje é o alvo preferencial de missões da NASA. Os antigos egípcios o chamavam de Her Descher, que significa vermelho. Ele era o amante de Vênus (Afrodite, muito mais charmoso em grego) e com ela teve o Cupido e a Harmonia. É o ponto vermelho no céu que não pisca e desde a acensão da ficção científica, tornou-se a origem de um dos mais perigosos vilões que nosso planeta já teve.


Eles estão chegando!
Marciano é o nativo do planeta Marte. Ele já foi imaginado de várias maneiras, mas em geral temos sempre a impressão de que marcianos veem à Terra para nos atacar e nos destruir. A imaginação a cerca de nosso vizinho vermelho começou a pulular quando as primeiras imagens foram observadas dele por meio de telescópios. Era possível observar longos canais, profundos vales que pareciam estar cobertos por rios, mares e lagos. Daí para imaginar uma civilização como a nossa, foi rápido.

Mapa feito por Giovanni Schiaparelli por meio de observações telescópicas da superfície de Marte no séc. XIX. 

O primeiro trabalho publicado que falava de uma forma de vida vinda de lá pode ser atribuída a W. S. Lach-Szyrma, autor polonês que em 1883 cunhou o termo marciano na novela Aleriel, or A Voyage to Other Worlds (Aleriel ou A Viagem para Outros Mundos). O protagonista, Aleriel, cai em Marte e reconstrói sua nave no meio da neve, para que "nenhum marciano viesse perturbá-lo se passasse por ali". Os séculos XIX e XX marcam a evolução das observações planetárias, o que não é de se estranhar o advento e o estabelecimento da ficção científica neste período conforme imagens cada vez mais reveladoras chegavam.

Mas foi em 1898 que os marcianos fizeram sua estreia de verdade no livro Guerra dos Mundos de HG Wells. Marte se torna um lugar frio demais para seus residentes e eles resolvem vir para a Terra. Os trípodes talvez sejam o exemplo de marciano mais conhecido da cultura pop-alien (bem, talvez rivalizando com Marvin). Sua figura não lembra em nada um ser humanoide, o que causa uma imediata sensação de estranhamento, já que não temos como nos identificar com seus habitantes.

Trípodes, de Guerra dos Mundos.

Como as imagens de Marte mostravam canais e vales, muita gente imaginava que observavam os restos de uma antiga civilização. Percival Lowell em seu livro Mars and Its Canals (Marte e Seus Canais), de 1906, com base nas imagens obtidas por Giovanni Schiaparelli, supôs que os canais eram antigos aquedutos construídos pelos marcianos para trazer a água dos polos do planeta e de vários vales ao longo do planeta. Schiaparelli influenciou vários autores e até astrônomos com suas observações sobre uma antiga civilização marciana, e Lowell lançou em 1910 um novo livro sobre tais informações, Mars As the Abode of Life (Marte Como a Morada da Vida), onde descreve com riqueza de detalhes as construções de Marte. Começava então um longo período de especulações, gerando vívidas imagens na cabeça dos leitores.

Edgar Rice Burroughs foi além, criando um romance interplanetário de John Carter, veterano da Guerra Civil que vai à Marte e encontra uma civilização de guerreiros humanoides e se vê envolvido na guerrilha deles. Os principais pontos a ser observados é que os marcianos seguiam certos estereótipos: se não são invasores, são humanoides com uma civilização semelhante à humana; podem estar extintos também, deixando suas construções pelo planeta ou podem ser humanos que colonizaram Marte e adotaram a identidade marciana.

Flash Gordon's Trip to Mars, de 1948. Rainha Azura subjugou seu próprio povo.

Se pegarmos o estereótipo de malignos invasores, os marcianos mais conhecidos são de HG Wells, o que alimentou ainda mais a visão de invasores ao longo de 100 anos, desde o lançamento da obra. Não é à toa que em 1948, a Warner Bros. criou Marvin, o Marciano, com forte influência nos escritos de Wells, uma figura cômica, de roupa romana estilizada (dando alusão ao deus romano da guerra), com grandes olhos, boca ausente, que com suas armas avançadas vem ao nosso planeta e se envolve em várias aventuras. Marvin é um símbolo. Ele mostra o imaginário popular tornando-se cada vez mais popularizado e estabelecendo padrões para comportamentos de seres que existem apenas na nossa imaginação.

Ray Bradbury, em suas Crônicas Marcianas, mostra um povo tranquilo, onde o autor discorre por 26 textos sobre o choque cultural, a chegada dos humanos, os problemas causados pela convivência. Um dos principais pontos fortes da obra é apontar os conflitos humanos utilizando Marte e seus habitantes como nossos antagonistas, quando nós mesmos encarnamos esse papel. Talvez seja por isso que a visão de um nave marciana no horizonte seja uma ótima maneira de explorar nossos defeitos, nossos dramas, já que trata de um inimigo que está tão perto.

Marvin, o Marciano.


Algumas coisas os marcianos têm em comum:

  • são baixos - possivelmente por causa da menor gravidade de Marte ou por escassez de recursos;
  • costumam ter cabeções - por causa do tamanho do cérebro?
  • são verdes - a cor verde causa uma sensação de estranhamento, já que não temos nenhuma pele dessa cor;
  • querem nos destruir;

Eles possuem naves avançadas e muitos usam capacetes, porque não conseguem respirar na nossa atmosfera. Podem nos desintegrar com a maior facilidade ou pulverizar nossas cidades. Não possuem compaixão, afinal deve ser um sentimento só nosso se analisarmos como eles têm um apetite de destruição por nossas cidades e civilização. Acredito que Marte Ataca!, de Tim Burton, retrate de maneira fiel (?) toda a mitologia por trás dos marcianos. Os militares desconfiados, uma parte da população orando e pedindo orientação aos marcianos, e a total e completa ignorância dos reais propósitos deles.

Mas nem sempre eles são alienígenas maquiavélicos. CS Lewis, em 1938, imaginou os marcianos como criaturas inteligentes, mas não humanoides. Doom os retrata como uma raça humanoide já extinta, superior à raça humana e que até nos originou. Philip K. Dick fez várias novelas de FC no planeta vermelho, fosse com colonos humanos tentando se estabelecer no planeta ou com uma analogia ao racismo terrestre ao lidar com seres de Marte. E claro, temos Meu Marciano Favorito, mostrando que eles podem ser civilizados e benignos... nem sempre.

Recentemente, com as observações mais acuradas da NASA, mostrando que Marte está mais para um deserto gelado do que um planeta idílico, a mitologia sobre os marcianos hostis - que fizeram toda uma comunidade fazer as malas às pressas, ao ouvirem o relato de uma invasão no rádio produzida por Orson Welles - sucumbiu aos dados científicos que mostram não haver formas avançadas de vida na superfície do planeta. O que, no entanto, não reduz a imagem do nosso vizinho vermelho, tampouco nossa curiosidade.

Pontuação
Os marcianos causaram muito medo numa época em que o perigo vermelho do comunismo despontava no horizonte das nações capitalistas que produziam muita ficção científica. Foi uma abordagem transportada para Marte, mas a base era muito terrena, mostrando aliens (estrangeiros) vindo para nosso planeta para nos destruir ou acabar com o modo de vida norte-americano, tido como o padrão por décadas. Eles causaram danos, terror, fuga em massa, despertaram paixões, medos e fazem parte de uma cultura pop que ainda lhes reserva um cantinho especial como os primeiros vilões diretos do espaço que temos notícia. Eles não causam mais terror hoje, mas serviram ao seu propósito. Quatro aliens para os marcianos.



Até mais!


Já que você chegou aqui...

Comentários

Form for Contact Page (Do not remove)