Estado Elétrico e a busca por conexão humana

Recentemente estreou na Netflix a adaptação de Estado Elétrico, de Simon Stålenhag, um quadrinho sublime, sobre uma jovem e um robô, que atravessam paisagens distópicas, nos anos 1990, com robôs desativados por todos os lados. Ainda que a adaptação não siga à risca o quadrinho, a mensagem que carrega é a mesma: nossa necessidade por conexão humana.

Estado Elétrico e a busca por conexão humana

Adaptado pelos irmãos Anthony e Joseph Russo, responsáveis por vários filmes memoráveis, principalmente do MCU, ele é carregado de efeitos especiais e teve um orçamento impressionante de 320 milhões de dólares, um dos filmes mais caros já feitos. Em seu elenco, nomes grandes como Millie Bobby Brown, Chris Pratt, Ke Huy Quan, e Stanley Tucci, como um vilão corporativo. Ainda que muita coisa esteja diferente do quadrinho, a mensagem original se sustenta.

Em 1990, eclodiu uma guerra entre humanos e robôs. O mundo caiu em desordem e as pessoas estavam perdendo, até que o CEO da Sentre, Ethan Skate, desenvolveu uma tecnologia que permitia o upload das mentes humanas em drones. Esse foi o ponto de virada na guerra, que forçou os robôs a assinar um armistício. Banidos para uma área de exclusão, os robôs não são mais um perigo. Porém, a tecnologia neural da Sentre saiu do meio militar e ganhou o mundo civil. Todo mundo utiliza os capacetes de realidade virtual, plugados 24h por dia num mundo de mentira, enquanto utilizam drones para interagir com o mundo real (algo semelhante ao que vemos no filme Surrogates, de 2009).

Capacete de realidade virtual sendo utilizado por uma pessoa em um antigo telefone no meio da rua
Pessoa usando o capacete de realidade virtual da Sentre na rua. Cena do quadrinho.

Michelle (Millie Bobby Brown) perdeu a família em um acidente de carro e passou para a tutela do estado. Morando num lar adotivo, onde o dono da casa só se preocupa com o cheque mensal pela tutela, Michelle se recusa a utilizar a tecnologia na escola, enquanto sente saudades do irmão, que também morreu no acidente. Mas quando um robô sorridente invade a casa e pede sua ajuda, ela percebe que seu irmão ainda está vivo, de alguma maneia. E ele está pedindo sua ajuda para entrar na zona de exclusão de robôs para ajudá-lo.

Mas entrar na zona da exclusão não é tarefa fácil. Seguindo uma pista deixada pelo seu tutor legal, ela encontra um contrabandista e veterano da guerra, John D. Keats (Chris Pratt) e seu amigo robô Herman (Anthony Mackie), acostumado a entrar e sair da zona de exclusão para contrabandear produtos valiosos e raros. Os dois acabam trabalhando juntos quando surge o coronel Bradbury (Giancarlo Esposito), em busca do robô desgarrado, para desativá-lo. Assim, começa uma corrida contra o tempo para encontrar alguém capaz de ajudar o robozinho e descobrir o que de verdade aconteceu com o irmão de Michelle.

O quadrinho é basicamente a jornada de Michelle e o robô, mas o filme foca bastante em ação, provavelmente devido ao trabalho dos irmãos Russo em vários filmes do tipo. Não é uma obra-prima da ficção científica, mas é um filme que diverte, com grandes efeitos especiais e uma história sobre a busca constante por conexão. As pessoas buscam formas diferentes de se conectar, sendo que a verdadeira conexão humana acaba se tornando obsoleta. E é justamente essa que a gente não pode perder.

O mundo diminuiu de tamanho devido à internet e às mídias sociais. Elas apenas aceleraram um processo de globalização que já vinha acontecendo desde as Grandes Navegações, diminuindo distâncias e colocando diferentes lugares em um mesmo ambiente. Porém, quantas vezes não dissemos aos amigos "um dia a gente marca" e esse dia nunca chega? Quantas vezes demos curtir e gostei nas fotos e textos dos outros, mas não os encontramos na realidade?

Nossos celulares não são tão fechados e exclusivos como um capacete da Sentre, mas nós mergulhamos em seus aplicativos e vivemos uma vida online cada vez mais crônica. Se antes a internet era o nosso refúgio de um mundo barulhento e confuso, hoje é o mundo que se tornou o refúgio diante das hostilidades de um ambiente virtual cada vez mais violento e polarizado. Que tipo de conexões poderíamos ter usando a aparelhagem da Sentre? Metade do cérebro trabalhando, a outra em nossos drones? Precisamos de mais um aparato para dividir nossa atenção?

No longa, vemos robôs para várias funções, com uma estética desgastada de robôs que se exilaram e estão em baixa na manutenção. Há robôs cabeleireiros, carteiros, professores de beisebol, todos liderados pelo Mr. Peanut (Woody Harrelson), se escondendo dos robôs carniceiros, que fazem upgrades em sua própria estrutura matando outros robôs. Será que um dia chegaremos a esse dia? Onde robôs coloridos e simpáticos vão substituir pessoas nas mais variadas funções?

Michelle encostada na cabeça de robô do seu irmão

Focando demais no humor e nas cenas de luta, o longa às vezes se perde na mensagem. Mas ela está lá. Na busca por estarmos cada vez mais conectados, de termos mais espaço no virtual, estamos perdendo as conexões humanas. Você já deve ter ouvido aquela máxima de que ser famoso na internet é o equivalente a ser rico no Banco Imobiliário. É uma ilusão, que pode acabar a qualquer momento com uma pane na internet ou na rede elétrica. Tal como no filme Surrogates, onde os robôs deixam de funcionar e as pessoas precisam sair às ruas, talvez o mesmo acabe acontecendo quando o sistema estiver saturado e tudo o que importa sobre a humanidade estiver preso num algoritmo.

Estado Elétrico é daqueles filmes para se assistir num dia chuvoso e curtir os cenários. Dá para tirar várias reflexões sobre nossa cronicidade online se você prestar atenção.

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