Estive reassistindo ao filme Substitutos (Surrogates, 2009) e me peguei pensando: se eu pudesse ter um substituto, será que teria um? Sei que o filme não é recente e acho que não teve muita agitação quando ele foi lançado, mas este é um daqueles filmes que trazem uma crítica social bastante pertinente. E é a respeito da sociedade da imagem, da imposição de padrões.
![Você teria um Substituto? Você teria um Substituto?](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgA5xpRWOhhlVcWlOLtRhhjusV98mdO5RDBy5y56r0lbArlmavNyxa2Ezqc046VszGXsHfOaKKMOgfndkIzzCADS_8WWP9G33TGGvCkeiNTaYRvzoqGy96mq6LRyzyRVkQIyPG8p77kUtU/s1600/Surrogates.jpg)
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Eu já tinha assistido ao filme fazia algum tempo. Reassisti ao procurar um filme para ver e de repente eu percebi a crítica que ele faz. Quem não sabe do que o filme fala: num futuro bem próximo, um cientista cria uma interface neural tão perfeita que é possível controlar robôs com a força do pensamento. A ideia era dar liberdade para que pessoas com paralisia cerebral ou deficiência física pudessem interagir com o mundo ao seu redor, para dar-lhes a autonomia que as outras pessoas possuíam.
A ideia é linda de fato. Enquanto não se pode curar o corpo, se a tecnologia puder dar a autonomia que eles precisam, por que não? O problema é que a ideia caiu no gosto popular. O filme não explica como que 98% de toda a população mundial conseguiu adquirir um Substituto, mas beleza, é ficção mesmo. Ele é um robô perfeito e você pode escolher que ele tenha sua cara, sua composição física ou pode ser o que você quiser, desde que tenha apenas um deles no seu registro. A interface neural faz o resto e você pode sair, trabalhar, estudar, ir para a balada, tudo sem se arriscar a sair com seu corpo físico e sofrer acidentes, por exemplo.
Mas logo entra a crítica. Vivemos - e no filme também os personagens vivem - em uma sociedade devotada à imagem e aos padrões de beleza. Os robôs conseguiram para as pessoas o que as revistas de beleza e moda querem desde sempre: impôr padrões. Vemos robôs magros, bem vestidos, bem penteados, muito fortes, portanto você teria autonomia física, ultra resistência, danos e machucados são inexistentes. Ou seja, é o ápice da sociedade de consumo, poder espelhar a si mesmo em uma máquina para que ela seja o que você não pode ser.
Vemos que os robôs são aquilo que seus donos querem ser e cuja imagem querem passar aos outros. Vemos que os verdadeiros operadores possuem cicatrizes, olheiras, marcas da idade, cansaço aparente. Mas assim como tudo na vida existe o lado contra, muita gente não aceita a existência dos robôs e assim surgiram Reservas onde a entrada de Substitutos é proibida. Apenas pessoas de verdade podem viver por ali e elas não aceitam muito bem a intervenção da polícia ou das Forças Armadas, que se utilizam de substitutos no trabalho diário. Existe uma cena muito interessante do Bruce Willis querendo viajar com a esposa e ela diz que os Substitutos podem ir no lugar deles, afinal a sensação é a mesma, mas ele quer a esposa, a mulher por trás daquele robô, aquela que vive trancada no quarto, com vergonha de sair. Ele sente falta do contato humano com a mulher que ama.
Então... eu teria um Substituto? Não sejamos hipócritas. Claro que eu teria. Só de pensar que eu não teria mais as dores nas costas e poderia sair, subir e descer escadas, correr, ir para a balada, estudar, encontrar os amigos, ter cara de saúde, viver maquiada e arrumada e ter todas as roupas caindo no meu corpo robótico com perfeição... Poxa, onde eu assino?? Não podemos ser hipócritas em achar que a tecnologia não nos beneficia ou achar que possamos viver sem ela. Eu não teria como criar um blog com pena e pergaminho, teria? Até isso pode ser considerado uma tecnologia. Se o robô me desse mais liberdade e autonomia do que eu tenho hoje, certamente teria um.
Por outro lado, o ser humano é dependente de seu meio e das interações que acontecem nele. Mesmo que um robô possa passar essa experiência com perfeição, estimulando as áreas corretas do cérebro, dando-nos a vívida experiência de tocar e sentir o mundo, isso seria 100% igual ao modo como nosso organismo pode receber as informações? As experiências pessoais não ficariam frias, mecânicas, dissimuladas com o uso de robôs? Assim como tudo na vida, ele tem lados bons e lados ruins. Já temos dificuldades no dia a dia, com pessoas de carne e osso, que nos humilham, ofendem, nos enganam, que não são o que dizem que são e que não cumprem o que prometem. Mesmo vendo seus rostos, mesmo podendo entrar em contato físico com elas, temos vários problemas. Imagine então um mundo de Substitutos?
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiq05pnWSgO6ULIM-D4ZI-J8bXCGmKkMxi34Fy1A-250Wp6fjx5uJiMBqNDuyj86SngX31vShnKeAK23qWUZzECv9lOZRyl_XJR08bV_D2xByozerue07kcybAC8jIT6XVGbrKUVOwsV1c/s1600/Surrogates2.jpg)
Se por um lado, ter um robô poderia beneficiar a sociedade, por outro ele poderia ser usado por pessoas mal intencionadas assim como se usa hoje o celular para passar trotes às pessoas de dentro de presídios. Imagine um vírus infectando toda a rede de Substitutos, que tipo de implicações isso causaria? E um Substituto pilotando um avião ou dirigindo um carro? Se a pessoa sofrer algum tipo de colapso enquanto está controlando o robô, o que aconteceria com as pessoas em volta?
Nem tudo que é tecnicamente possível é socialmente desejável. Por mais que me pareça uma tecnologia fantástica, creio que não trocaria o contato humano e as interações humanas, mesmo com os benefícios envolvidos. Nós já temos isso e se chama smartphone. Quantas vezes, numa mesa cheia de gente, eu vi a galera twittando ou entrando no Facebook ao invés de conversarem entre si. A história da raça humana é feita disso, de interações. Não podemos deixar que a tecnologia nos substitua de maneira tão grosseira a ponto de sentar com os amigos e não conversar com eles.
Até mais!
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