Fungos na ficção + 5 indicações de livros

Com o sucesso estrondoso da série da HBO The Last of Us, baseado no jogo de mesmo nome, os fungos caíram na língua do povo. Os fungos constituem um dos grupos de organismos mais bem-sucedidos do planeta. Separados das plantas, animais e bactérias há mais de 1 bilhão de anos, eles chegaram a ser classificados juntos das plantas por compartilharem algumas características, mas os fungos são muito mais estranhos e espetaculares, inspirando vários trabalhos de ficção ao longo do tempo. Infelizmente a maioria não tem em português.

Fungos na ficção + 5 indicações de livros
Arte de Anton Kurbatov
Todos os fungos são comestíveis.

Alguns só uma vez.

Terry Pratchett

Acredita-se que o primeiro trabalho envolvendo fungos e ficção foi o conto de William Hope Hodgson, publicado em 1907, chamado "The Voice in the Night" (publicado na coletânea Mestres do Gótico Botânico da editora Wish). Hodgson foi um dos grandes escritores de horror, tendo inspirado HP Lovecraft. "The Voice in the Night" foi adaptado várias vezes, inclusive inspirando o filme Matango, de 1963. Preparando o terreno para muitos trabalhos que viriam depois, um náufrago se depara com uma ilha coberta por um fungo espesso que logo começa a envolver todo o seu corpo. Este é um conceito muito presente em vários livros de fungal horror, um total desconhecimento das capacidades dos fungos justamente por eles serem tão estranhos.

Os fungos conseguem fazer coisas impressionantes. Podem causar doenças nojentas, como o pé de atleta, mas podem nos dar a penicilina e os deliciosos cogumelos do estrogonofe. Eles vivem em todos os tipos de organismos, em superfícies, dentro e abaixo do solo, no ar, na água, no refugo nuclear de Chernobyl, em fundos oceânicos profundos e dentro de rochas sólidas. Eles decompõem rocha, fazem e preparam o solo, nutrem e matam plantas, sobrevivem no espaço, induzem visões, produzem alimentos e remédios, manipulam o comportamento animal e influenciam até a composição da atmosfera. Eles estão altamente disseminados no ambiente, mas cerca de 90% deles nem ao menos foi descrito pela ciência.

Sabendo que cerca de 90% deles nem ao menos foi identificado e descrito, fica fácil se impressionar com o cenário de The Last of Us. Algumas características bizarras deles chamam a atenção de escritores há muito tempo:

  1. Os fungos crescem em tudo até que tudo seja dissolvido por eles, da mesma forma que certos tipos de fungos crescem em frutas em decomposição.
  2. Os fungos assumem o controle do sistema nervoso e do cérebro de um organismo ainda vivo, da mesma forma que o Ophiocordyceps unilateralis assume o controle dos corpos das formigas.
  3. Formas de vida fúngicas sencientes existem em vez de ou ao lado de humanos e outras formas de vida. Em outras palavras: ele coexiste ou compete com você em um nível senciente.
  4. Os fungos podem ser utilizados de maneiras que ainda não descobrimos. Assim há um potencial quase infinito para todas as suas funcionalidades.

Em um exemplo mais recente, Stephen King escreveu o conto “Grey Matter”, onde um homem desaparece depois de beber uma cerveja em uma loja de conveniência. Mas a cerveja estava embolorada e o homem passa a sofrer uma transformação. Fungos podem representar uma ameaça não apenas aos nossos corpos, como também para o ecossistema. No mangá Nausicaä of the Valley of the Wind, de Hayao Miyazaki, o mundo lida com as consequências de uma catástrofe ambiental envolvendo uma invasão de fungos tóxicos, que ameaçam acabar com toda a vida humana.

Alguns enredos com zumbis usam o fungo como protagonista, ao invés de um vírus como em The Walking Dead. No livro A menina que tinha dons, de Mike Carey, uma variante do fungo Ophiocordyceps unilateralis passas a infectar os seres humanos e não mais as formigas, espalhando-se por contato corporal através de fluídos e não mais por esporos. Essa também é a premissa de The Lasf of Us.

Os criadores do jogo disseram que a inspiração surgiu depois de assistir a um episódio da série documental “Planet Earth”, da BBC, onde um fungo do tipo cordyceps infecta uma formiga e controla seu cérebro, manipulando seu comportamento. Sei que soa assustador, mas felizmente não temos um corpo de inseto, somos um organismo muito mais complexo e a maioria dos fungos é totalmente inofensiva para nós. São poucos os fungos que podem de fato nos fazer mal.

Nem todas as histórias de ficção especulativa envolvem infecção fúngica. Alguns descrevem um mundo no qual criaturas fúngicas sencientes e inteligentes (geralmente com aparência de cogumelo) existem em competição ou ao lado dos humanos. Uma versão benigna disso pode ser encontrada em The Wonderful Flight to the Mushroom Planet, de Eleanor Cameron. O livro conta a história de duas crianças que constroem uma nave espacial e voam para um planeta coberto de cogumelos e habitado por pessoas que são essencialmente também cogumelos, embora andem e falem, tendo uma civilização completa.

Não podemos esquecer de Star Trek Discovery que tem um motor de esporos capaz de navegar pela rede micelial e que transporta a nave instantaneamente para qualquer lugar do universo. A série nos dá um bom exemplo da peculiar biologia do mundo real é complexa e pode acabar influenciando boas histórias. Impossível não lembrar também dos cogumelos em Alice no País das Maravilhas ou o gosto peculiar dos Hobbits por cogumelos em O Senhor dos Anéis, de JRR Tolkien.

Alguns livros em português que trabalham com fungos ou tem contos com eles:


Os fungos fornecem um vasto material para a ficção especulativa porque são muito, muito diferentes dos seres humanos. Ainda há muita coisa sobre eles que não foi totalmente compreendido e porque as possibilidades de contar histórias que apresentam são quase infinitas. Seja como agentes de horror corporal, forças aterrorizantes ou controladores de mentes, essas incríveis formas de vida permeiam a ficção especulativa na página e na tela.

Até mais! 🍄

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Comentários

  1. Mas esse layout está lindo demais, UAU! *-*
    Fungos são mesmo fascinantes ~ eu adoro um cogumelinho, não posso negar (na comida & no imaginário estético-cultural). Eu não sabia que essa era a premissa de The Last of Us, fiquei super intrigada. Você começou a assistir? Recomenda? Beijos

    Não Me Mande Flores

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    Respostas
    1. Ficou lindão, né??

      Menina, minha TL do Twitter tá totalmente pirada na série. Aí fui assistir - sem saber nada do jogo - e é tudo isso mesmo! Pra quem curte esse tipo de enredo, é uma baita série. Muito bem feita!

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  2. Olá! Adorei o texto e a arte do post. Quando passou este tweet na minha timeline fui curiosa para ver quais seriam os livros indicados (adoro o tema). E inconscientemente ou não, eu estava buscando Aniquilação entre a listagem por ser um livro que gostei tanto, mesmo não sendo fã de terror ou de horror.
    Li Contágio e A Trama da Vida está aqui na fila de leituras. Com certeza é um tema com muito potencial dentro ficção. Que mais tramas elaboradas apareçam por aí :)

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