Já conhecia a escrita enérgica de Nagorski por outro livro do autor, A Batalha de Moscou, lançado pela Contexto, em 2018. Nagorski escreve sobre fatos históricos como se fosse um thriller ou uma ficção histórica, com personagens reais cujas vidas queremos acompanhar. E com esse aqui não foi diferente.
O livro
No rescaldo de um dos conflitos mais sangrentos e mortíferos da humanidade, havia muita coisa a se fazer. Milhões de mortos, perdas sem precedentes de infraestrutura e civis em vários continentes e um novo mapa geopolítico do mundo apresentavam sérios desafios aos sobreviventes. Mas após os julgamentos de Nuremberg e o começo da Guerra Fria, os vencedores da Segunda Guerra se deram por satisfeitos e perderam o interesse em punir os nazistas que cometeram crimes durante o conflito. E aí? Nada aconteceria com aquelas pessoas que cometeram atos tão terríveis?
(...) na esteira da guerra e do Holocausto, não era de admirar que as noções de vingança e justiça com frequência se misturassem, fossem quais fossem os motivos dos próprios carrascos.
Os Aliados foram os responsáveis por providenciar os primeiros julgamentos de crimes de guerra assim que os conflitos terminaram. Os mais conhecidos, certamente, foram os julgamentos de Nuremberg, onde vários oficiais nazistas foram condenados à forca, como Hermann Göring, comandante da Luftwaffe; Ernst Kaltenbrunner, membro de alto escalão da SS e; Joachim von Ribbentrop, ministro das Relações Exteriores da Alemanha Nazista.
Mas tão logo os corpos foram retirados do cadafalso pelo carrasco, os Aliados começaram a perder o interesse em culpar criminosos de guerra, pois havia outra ameaça no horizonte: a União Soviética e a Guerra Fria. E na ânsia por querer virar a página daquele capítulo tão doloroso, muitos países se viram concentrados em combater o comunismo e não os nazistas que, muitas vezes, nem mesmo se escondiam, principalmente aqueles de patentes mais baixas e guardas de campos de concentração.
Muita gente não conseguia esquecer tão facilmente os crimes cometidos na guerra. Assim surgiram os caçadores de nazistas, pessoas que devotaram uma vida de trabalho e prospecção de arquivos do Terceiro Reich para encontrar aqueles que conseguiram escapar por alguma razão. Havia muito desejo de vingança devido à magnitude dos crimes, mas era preciso seguir os procedimentos legais, achar os culpados e, principalmente, fazer com que tivessem algum tipo de punição.
Qualquer pessoa que busque um equilíbrio entre os crimes que foram cometidos e a punição acabará frustrada.
Assim que a Alemanha assinou a rendição, muitos dos antigos seguidores de Hitler procuraram se dissociar do regime nazista. Alguns foram capturados, mas outros, como Josef Mengele ou Klaus Barbie, conseguiram escapar para a América do Sul e, no caso do primeiro infeliz, nunca foi julgado pelos crimes hediondos que cometeu. O autor reconhece que os caçadores de nazistas precisaram enfrentar a burocracia, o humor político da época e a indisposição de vários governos em buscar criminosos soltos pelo mundo. Houve exceções, como o sequestro de Adolf Eichmann na Argentina e seu julgamento midiático em Israel, mas no geral muitos nazistas morreram de velhice, ainda que alguns tenham sido levados à justiça.
O estilo de escrita de Nagorski é bastante envolvente. Nem parecia que eu estava lendo um livro de não-ficção. Ele consegue conduzir a narrativa como se este fosse um livro de ficção, passando-se na Segunda Guerra. A leitura fluiu, ainda que tenha sido difícil passar por alguns momentos, como a descrição dos crimes que eles cometeram. Essa violência irrestrita que muitos nazistas cometeram ainda me é assombrosa.
Também me impressionou a indisposição de muitos países em querer procurar e julgar nazistas, sendo que muitos deles nem ao menos mudaram de nome ao longo dos anos. A Guerra Fria e o medo dos "vermelhos" era muito maior do que buscar alguma reparação pelo Holocausto, por exemplo. O cinema e a televisão nos passam a impressão de que os nazistas foram amplamente responsabilizados por tudo o que fizeram na Segunda Guerra, mas o livro deixa bem claro que não foi bem assim. Se nazistas foram presos e julgados foi porque teve gente que lutou muito por isso e conseguiu mudar a percepção do público sobre o que aconteceu.
Nagorski conta as histórias de caçadores emblemáticos, como Simon Wiesenthal, Serge e Beate Klarsfeld, e daqueles que trabalharam longe dos holofotes da imprensa, incluindo os promotores americanos dos tribunais de Nuremberg e Dachau, Benjamin Ferencz e William Denson, respectivamente; o juiz polonês Jan Sehn, que comandou o caso de Rudolf Höss, um dos cabeças do campo de concentração de Auschwitz; o juiz e promotor da Alemanha Fritz Bauer, que forçou seus conterrâneos a confrontar os registros do genocídio; o agente do Mossad, Rafi Eitan, que liderou a equipe israelense responsável pela prisão de Adolf Eichmann na Argentina; e Eli Rosenbaum, que liderou os esforços pela extradição dos criminosos de guerra que residiam tranquilamente nos Estados Unidos.
O livro está muito bem traduzido por Berilo Vargas e bem revisado. Não encontrei problemas de revisão ou diagramação nele. No meio existe um compilado de imagens tantos de alguns nazistas condenados como os caçadores. Nagorski me surpreendeu em vários momentos da leitura, como quando disse haver rixas e disputas pessoais entre os caçadores e como alguns deles engrandeciam seus feitos ou os floreavam.
(...) se não havia indício de frança loucura entre os nazistas, o argumento de que "poderia acontecer aqui" - ou em qualquer lugar, para falar a verdade - estava certo.
Obra e realidade
Agora em 2025 faz 80 anos que a Alemanha nazista se rendeu incondicionalmente aos Aliados na Segunda Guerra Mundial em 7 de maio de 1945, na cidade francesa de Reims. Sobreviventes estão morrendo e aqueles que cometeram crimes de guerra também. Os próprios caçadores de nazistas estão minguando, ainda que ocasionalmente a imprensa noticie alguma coisa sobre um guarda de um campo de concentração sendo preso ou julgado tardiamente.Crimes contra a humanidade não podem ser julgados como crimes comuns. Isso foi algo que os juristas e advogados envolvidos nos casos de ex-nazistas perceberam. Mas se as sentenças não agradavam, ou se eram brandas demais, a ideia era poder, pelo menos, educar pelo exemplo. E mais do que nunca, hoje em dia é preciso lembrar o que eles eram e o que defenderam 80 anos atrás.
Andrew Nagorski é um jornalista e escritor norte-americano, nascido na Escócia. Por 30 anos foi correspondente e editor da revista Newsweek.
PONTOS POSITIVOS
Bem pesquisado
Bem escrito
Imagens e fontes
PONTOS NEGATIVOS
Violência e nazismo
Bem pesquisado
Bem escrito
Imagens e fontes
PONTOS NEGATIVOS
Violência e nazismo
Avaliação do MS?

Até mais!
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