Resenha: Rota da Seda, de Otávio Luiz Pinto

Lembro de ter ouvido falar pela primeira fez sobre a Rota da Seda em uma aula de história lá no ensino fundamental. Mas o assunto nunca foi aprofundado. Da maneira como nos foi apresentada, ela parecia mais uma grande rodovia da Antiguidade por onde circulavam caravanas de um lado para o outro. A Rota da Seda foi muito mais que uma simples rota de caravanas. E este livro aqui quer te contar como tudo começou e qual é a sua importância, inclusive nos dias de hoje.

Parceria Momentum Saga e editora Contexto

O livro
Estamos tão acostumadas a um mundo globalizado, onde culturas estão em constante contato, que tendemos a achar que isso é um evento recente. Na verdade, a globalização e o contato de cultura já aconteciam antes. A velocidade pode não ser a mesma de hoje, mas isso não quer dizer que produtos, religiões, pessoas, costumes, ideias, não circulassem por vias que conectavam pontos extremos. E a Rota da Seda é uma dessas vias, talvez a mais importante delas.

Resenha: Rota da Seda, de Otávio Luiz Pinto

Em seu sentido mais amplo, a Rota da Seda pode ser definida como um "conjunto de estradas e trajetos comerciais abertos pela China entre o leste asiático e o Mar Mediterrâneo". Entre os século II a.C. e o XVI d.C. a rota atravessava oásis, desertos, montanhas, territórios de vários povos, levando produtos exóticos e bens de luxo para as grandes metrópoles da época, como Roma, Alexandria e Bagdá.

Porém, além de ser uma rota física, ela também foi um processo de aproximação cultural entre diferentes sociedade asiáticas, africanas e europeias, pois as caravanas levavam, além das mercadorias, pessoas, idiomas, textos, tecnologias, ideologias e práticas sociais e políticas que se disseminaram, ajudando a criar um mundo mais cosmopolita. Existiram outras vias de comércio, mas a Rota da Seda é a mais significativa justamente por sua capacidade de integração cultural. Consigo até imaginar o fascínio das pessoas ao verem chegar as caravanas que despejavam objetos maravilhosos nos mercados...

Este livro é uma grande aula de história e geografia sobre como a Rota da Seda se estabeleceu e qual sua importância para a Eurásia e para a região do Mediterrâneo numa época que antecedeu as Grandes Navegações. E para falar de como a rota surgiu, é preciso falar da história da China e da Ásia Central, pois esta região foi fundamental para um processo globalizante começado pela China, no século II a.C., que ganhou forma e depois vida própria, onde vários grupos nômades intermediaram o comércio de seda da China.

As trocas de longa distância não são desconhecidas pela humanidade. O autor cita, por exemplo, o lápis lazúli, pedra valiosa para os antigos egípcios e que adornava várias joias e obras de arte, como a famosa máscara de Tutancâmon, que era importada das minas do Badaquistão, uma região histórica da Ásia Central, que abrange parte do nordeste do Afeganistão e do sudeste do Tajiquistão. Ou seja, a pedra viajava mais de 2500 km até o Egito, o que nos dá uma ideia de como os povos da antiguidade interagiam e realizavam comércio.

Mais do que um simples tecido luxuoso e iridescente, a seda era um pilar cultural e religioso para a China e foi usado como moeda, principalmente pelos diplomatas chineses, em várias ocasiões. O Império Romano amava (e alguns romanos odiavam) a seda, a ponto de esvaziar os cofres imperiais. O autor trouxe tantos fatos novos, tanta histórias e personagens cativantes, que tornou o livro muito gostoso de ler. Por mais que seja um livro introdutório, já é uma grande aula de história e geografia e uma ótima adição à literatura sobre a Rota da Seda em língua portuguesa, que ainda é escassa.

Interessante apontar que o termo, Rota da Seda, não é um consenso nem entre os pesquisadores. A ideia de uma rota é um fenômeno moderno, já que nenhum documento anterior ao século XIX fala de uma Rota da Seda ou identifica um caminho regular de comércio entre a China e as cidades da Ásia Central. Concordo com o texto quando diz que o termo é conveniente e bem conhecido e não precisa ser descartado, mas sim aprofundado.

(...) o celebrado tecido chinês era então uma língua franca do poder, do luxo e do exótico. (...) a seda foi um dos poucos materiais na história que alcançaram um sentido tão universal.

Página 55

O livro é bem curto, mas cheio de conteúdo. Há imagens e mapas em preto e branco ao longo do texto e aqui preciso apontar algo negativo. Os mapas são péssimos. Nem dá para chamar de mapas, pois a maioria nem legenda tem, quanto mais escala. Em alguns casos é impossível para o leitor comum identificar qual região está mapeada, pois há apenas os contornos geográficos e mais nada. Para uma segunda edição, espero que os mapas sejam refeitos e melhor editados.

Obra e realidade
A Nova Rota da Seda é um plano de investimentos adotado pelo governo chinês em 2013, envolvendo desenvolvimento de infraestrutura e investimentos em países da Europa, Ásia e África e que, desde 2018, envolve também a América Latina. Mas o Brasil anda reticente em aderir aos planos ambiciosos da China. Enquanto uma parte do governo acredita que o Brasil não precisa aderir ao projeto por já ser alvo de parte significativa dos investimentos internacionais chineses, outra parte acredita que a adesão seria uma maneira de alavancar projetos de infraestrutura no Brasil.

Poder, guerra, religião e literatura eram os produtos "imateriais" da Rota da Seda, mesmo que eles estivessem "inseridos" no comércio de objetos tangíveis, como a própria seda, cavalos, textos religiosos e cartas ou outros documentos.

Página 112

Otávio Luiz Pinto

Otávio Luiz Pinto é professor de História da África no Departamento de História da Universidade Federal do Paraná e no Programa de Pós-Graduação em História da mesma instituição. É doutor em História pela University of Leeds e especialista nos movimentos e nas trocas materiais e simbólicas entre sociedades africanas e asiáticas na pré-Modernidade, especialmente entre os séculos VI e XVI.

PONTOS POSITIVOS
Rota da Seda
Bem escrito
Didático
PONTOS NEGATIVOS

Mapas
Acaba rápido


Título: Rota da Seda
Autor: Otávio Luiz Pinto
Editora: Contexto
Páginas: 128
Ano de lançamento: 2023
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Gostei muito de ler este livro e revisitar temas que estudei faz tanto tempo. Tirando a parte dos mapas, que poderiam ser melhores, o livro é uma aula de história e geografia que agradará até aos leitores mais exigentes. Ele pode ser facilmente utilizado no ensino médio e no ensino superior para dar um pontapé inicial no tema da Rota da Seda, trazendo o tema até a atualidade com o plano da nova rota pela China. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!


Até mais!

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Comentários

  1. Gostei muito da resenha e cumpriu sua função, despertando vontade de ler!
    Pelo tema e contexto, concordo que livros assim deveriam ser mais difundidos em escolas.
    Abraços e bom final de semana!

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