Resenha: O Céu da Meia-Noite, de Lily Brooks-Dalton

O Céu da Meia-Noite, publicação original de 2016, é o livro que levou à adaptação da Netflix com George Clooney. Um livro que fala, principalmente, de solidão, de como a conexão humana faz falta e como demoramos a perceber isso, talvez até mesmo sendo tarde demais, como em um fim do mundo.

O livro
Augustine Lofthouse tem 78 anos. É um cientista renomado, praticamente uma lenda em seu meio, conhecido por ser egocêntrico, egoísta e arredio. Ele nunca foi muito bom em se conectar com as pessoas, na verdade. Sempre preferiu se manter distante, concentrando-se na ciência. Tanto ele gosta do isolamento que partiu para uma estação de pesquisa no Ártico, um lugar bem isolado e distante da civilização. Augustine já está na estação há um ano quando uma evacuação começa. Há medo no ar, ele percebe, as pessoas partem da estação, buscando parentes e conhecidos. Mas não Augustine. Ele não tem para quem voltar e preferiu ficar na estação.

Resenha: O Céu da Meia-Noite, de Lily Brooks-Dalton


Paralelo a isso, temos a nave Aether, que está retornando para a Terra em uma longa viagem depois de estudar Júpiter e suas luas. A pequena tripulação de seis pessoas percebe que tem algo errado quando não recebe mais nenhuma comunicação da Terra. A especialista de comunicações da nave, Sully, tenta obter informações do comando da missão, de qualquer agência especial, ao menos um sinal de satélite. Mas nada chega. A tripulação tenta se concentrar em sua missão, mas o silêncio está cobrando o preço. Eles estão irritados, cansados, se isolando dos colegas.

A autora foca nas angústias particulares de seus personagens, principalmente Augustine e Sully. Oscilamos entre as visões de um e de outro, seus medos, suas trajetórias, a forma como lidaram com problemas, com a família, o que deixaram para trás na vida ao fazerem suas escolhas. Devo dizer que curti acompanhar essas jornadas. Eu gosto de andar ao lado dos personagens, de ler seus pensamentos, de aprender mais sobre suas histórias pregressas e Lily é uma autora habilidosa nesse sentido, de ir e vir no passado e no presente dos personagens.

Nós estudamos o universo para saber das coisas, mas no fim das contas a única coisa que sabemos de verdade é que tudo acaba... Tudo, exceto a morte e o tempo. É difícil ser lembrado disso (...), mas é mais difícil esquecer.

Porém, sinto que o livro não se sai muito bem-sucedido ao deixar as razões para o silêncio da Terra e o sumiço das pessoas sem respostas. Se pegarmos o livro - e depois filme - A Estrada, o autor também não deu nenhuma resposta para o cataclismo que se abateu sobre o planeta, porém ele deixa pistas, como o céu sempre encoberto, as cinzas, a morte da vegetação. Fica óbvio em A Estrada que foi algo como o impacto de um grande asteroide, até mesmo a erupção de um supervulcão. Não temos a resposta, mas as pistas nos ajudam a entender o contexto.

Mas no livro de Lily a total ausência de pistas, de respostas, de um sentido para aquele silêncio absurdo deixam perguntas em aberto de forma inquietante. Entendo que o sentido que a autora quis dar ao livro era sobre os sentimentos particulares dos personagens, sobre suas vidas e não sobre a situação do planeta. Diante do silêncio de um planeta inteiro, o que resta para uma pessoa é apenas si mesma. É uma excelente proposta e bastante inquietante também.

Mas não consegui sentir esses personagens. Sabe quando eles passam a impressão de ser todos iguais? Tirando um tripulante russo da Aether, que ergue a voz de vez em quando, os outros são planos, vazios, chatos. É possível ler o livro com o mesmo tom de voz, porque nenhum deles se distingue, seja Augustine ou Sully, eles são planos e totalmente iguais. A mesma voz, a mesma angústia existencial, a mesma falta de um propósito agora que o planeta inteiro se calou. É como se eu estivesse lendo um diário de Lily e não um enredo de ficção.

O filme não difere muito do que li no livro. Aliás li o livro esperando mais do que o longa de George Clooney me apresentou e, infelizmente, recebi exatamente a mesma coisa. O final é um pouco diferente no filme, mas ainda assim achei bem ruim. Já no livro, a autora soube descrever muito bem as paisagens desoladas do Ártico de uma maneira quase poética, encontrando beleza na solidão.

Era quase impossível não voltar ao passado, não se perder pensando em tudo o que provavelmente nunca mais veria de novo.

Li o ebook e não o livro físico, mas não encontrei problemas de revisão ou diagramação. A tradução foi de Ana Guadalupe e está muito boa.


Obra e realidade
De certa forma, o livro de Lily me fez lembrar do filme de ficção científica e horror Pandorum. A autora trabalhou a questão do isolamento colocando seus dois personagens principais em locais bastante remotos, o espaço e o Ártico. Ela queria trabalhar a questão do isolamento e como as pessoas se sentiriam ao saber que são as últimas de sua espécie. Mas não consegui sentir nada disso no livro. Até Pandorum, um filme de terror espacial que tem alguns problemas, conseguiu trabalhar melhor esse sentimento aterrorizante de perder tudo o que já conhecemos.

Lily Brooks-Dalton


Lily Brooks-Dalton é uma escritora norte-americana. O Céu da Meia-Noite é seu terceiro livro.


Pontos positivos
A nave Aether
Discussão sobre solidão e amor

Pontos negativos
Fim de mundo sem explicação
Final em aberto
Personagens unidimensionais


Título: O Céu da Meia-Noite
Título original em inglês: Good Morning, Midnight
Autora: Lily Brooks-Dalton
Tradutor: Ana Guadalupe
Editora: Morro Branco
Páginas: 288
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Li o livro depois de ficar frustrada após assistir ao filme da Netflix. Curti acompanhar a jornada de Sully e de Augustine, mas só a jornada não adiantou para mim, pois os personagens são tão unidimensionais que você às vezes não consegue distinguir a voz de um e de outro. Para quem curte uma ficção mais introspectiva e que foque nas emoções de seus personagens pode acabar gostando. Três aliens para o livro.



Até mais!

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Comentários

  1. Parece que você leu minha mente, esse filme apareceu tem dois dias pra mim na lista de Sci-fi e eu só joguei pra lista, depois da resenha fiquei com um pé atrás. Mas, como sempre, ótimo trabalho! :)

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