Comprando e dando livros de presente

Com a crise no mercado editorial desencadeada pelo calote de Cultura e Saraiva tem se falado muito pelas redes sociais sobre dar livros de presente. E acho uma iniciativa ótima, de verdade. Acontece que dar livros de presente não é uma coisa tão simples e impessoal quanto possa parecer. Você pode parecer chata ou antipática dependendo do livro que comprar e presentear.

Comprando e dando livros de presente

Quando eu trabalhava na Fnac, na época das festas de final de ano, o pânico tomava conta de muitos clientes. Era o amigo secreto, era o Natal e muitos tinham a ideia de comprar e dar livros. Mas um livro depende muito do gosto da pessoa, algo que nem sempre a gente entende ou conhece em profundidade. Presentear alguém com um livro pode ser algo tão pessoal quanto dar uma lingerie. Entende como pode ser desagradável se você errar e der algo que a pessoa não curte?

Na tentativa de ajudar esses clientes perdidos entre as estantes, a gente fazia várias perguntas. Você conhece bem a pessoa? Ela tem algum gosto específico? Você já a viu com um livro ou a ouviu falar? Ela gosta de ler? Sim, tínhamos que fazer essa pergunta, pois era comum a cliente ver que tinha algum livro em promoção e achava que seria uma boa ideia dar algo do tipo. Apesar de achar que a pessoa que diz não gostar de ler apenas não encontrou algo que goste, é melhor evitar e partir para outra coisa.

Então antes de correr para a livraria, pense em todas essas perguntas que fazíamos aos clientes. Se você acha que a pessoa curte livros já é meio caminho andado. Tem outras coisas que você pode associar à pessoa. Se ela curte jogos já existem várias adaptações literárias de jogos como Mass Effect, Starcraft, Halo e Warcraft. E em geral estes livros expandem arcos que o jogo não mostra, então esse é um ponto positivo que pode te ajudar.

(...) mantenha o cupom fiscal da compra. Pois se der merda, ela ao menos pode ser desfeita.

Se ela é do meio acadêmico, tente os livros de divulgação científica, mas tente sair do óbvio. Um astrônomo já conhece os livros do Carl Sagan. Tente partir para outra ciência. Que tal um livro sobre a história da ciência? Existem várias possibilidades dentro desse tema, inclusive falando sobre tecnologias de ponta que vão certamente agradar alguém.

Evite a todo custo buscar uma inspiração nas listas de mais vendidos. É sério. Muita gente, ao buscar algo para ler, olha o que está vendendo mais. E esse não é um bom indicador de gosto, é apenas um indicador de vendas. Víamos acontecer com frequência na livraria da Fnac: a pessoa comprava o mais vendido e depois a presenteada vinha trocar por outro livro. Por isso, fica aqui outra dica, mantenha o cupom fiscal da compra. Pois se der merda, ela ao menos pode ser desfeita.

Havia também um erro muito comum das pessoas ao comprar livros e cabia a nós lembrar ao cliente que o seu gosto não pode ser imposto. "Ahh, vou dar esse livro aqui pra Fulana, pois eu amei e acho que ela vai curtir". Acredite, ela pode ODIAR e ainda por cima ficar com um livro encalhado e amarelando na estante. Se eu não sei o gosto de uma pessoa, não posso chegar dando uma roupa que cabe apenas em mim e com livros é a mesmíssima coisa. Se você tirou uma católica devota no amigo secreto, um livro do Padre Marcelo Rossi pode ser um grande presente, ainda que você não curta esse tipo de leitura.

Por exemplo: queria dar um presente para o meu médico. Fiquei então pensando nos livros que ele poderia gostar. Sei que ele trabalha muito no consultório, talvez não tenha tempo para ler ficção. OK, então uma obra de não-ficção pode ser uma boa. Rodei por alguns títulos e pensei na biografia do médico e cirurgião vitoriano Joseph Lister, pai da cirurgia moderna, livro publicado pela editora Intrínseca com o título Medicina dos Horrores. Ele amou o presente. ♡

Buscar autores dentro do mesmo nicho é sempre uma maneira de acertar.

Se você já conhece um pouquinho do gosto literário da pessoa, pode comprar coisas semelhantes. Se ela gosta de Tessa Dare, pode apostar em Nora Roberts. Se ela curte Arthur C. Clarke, pode tentar o John Scalzi ou a Becky Chambers. Buscar autores dentro do mesmo nicho é sempre uma maneira de acertar. E pense em comprar livros mais novos, pois a possibilidade dessa pessoa já ter lido algum livro mais antigo é grande. Por isso, pode ser interessante você procurar os quadrinhos. Alguns livros foram adaptados para quadrinhos e mesmo que a pessoa já tenha lido o original, o quadrinho é uma boa pedida. E há filmes que também possuem suas novelizações, então se a pessoa curtiu o longa, pode curtir o livro ou o quadrinho adaptado.

Outra dica: não escreva uma dedicatória no livro. Escreva um cartãozinho bem fofo, desejando tudo de bom, mas não meta o canetão na página de rosto da obra. Nem todo mundo curte rabiscar o livro, ainda mais à caneta, e se o livro não agradar sua mensagem vai ficar lá eternizada. Contudo, se você der um cartão junto, mesmo que a pessoa se desfaça do livro no futuro, o cartãozinho com a boa intenção da sua parte vai ficar.

E a dica final que pode ser a mais útil de todas: não tem a menor ideia do que dar de presente, invista em um vale-presente e deixe a pessoa decidir o que quer. Esse certamente é um presentão!

Essas são algumas dicas para você não se perder na compra. Corre que dá tempo! Espero que ajude!

Até mais! 🎁

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