A série The Handmaid's Tale é um dos grandes sucessos da televisão. Baseada no livro de Margaret Atwood, O Conto da Aia, de 1985, a série traça paralelos assustadores com a realidade ao mostrar uma nação fundamentalista cristã que tirou os direitos das mulheres e as dividiu em castas, cada uma com uma função extremamente rígida. Agora chegou ao Brasil a versão em graphic novel, pelo incrível traço de Renée Nault.
A graphic novel
Acredito que o sucesso da série tenha feito com que todo mundo saiba, mais ou menos, do que se trata, certo? Os antigos Estados Unidos deram lugar à República de Gilead, onde fundamentalistas cristãos retiraram os direitos das mulheres. Começou com uma medida ali, outra aqui, até que as mulheres se viram desempregadas e sem dinheiro. Depois famílias inteiras foram separadas, especialmente aquelas compostas por casais divorciados.Este mundo pavoroso - no qual Margaret disse que não usou características ficcionais, tudo ali, com exceção do enredo em si, já aconteceu em algum momento histórico - as mulheres em idade fértil se tornam as Aias. Destituídas até mesmo de seus nomes e obrigadas a usar a cor vermelha, elas passam por estupros em rituais específicos feitos pelo dono da casa, na intenção de dar um filho ao casal.
Renée soube usar muito bem as cores e os cenários opressivos para compor a graphic novel. Se você está esperando a história inteirinha do livro, melhor ler o livro mesmo, pois não dá para encaixar tudo o que a obra original traz e discute. E olha que essa graphic novel tem mais de 200 páginas, então tem bastante conteúdo do livro aqui. Todos os pontos principais do enredo estão muito bem ilustrados, sensíveis, brutos e crus, como vimos no livro original.
Bendito seja o fruto.
Gostei muito do fato de que a Offred seja morena, pois tanto no filme de 1990, quanto na série de TV, a aia é loira. Muito expressiva, é impossível não se emocionar com sua trajetória, ao viajar por suas memórias do tempo de antes e de como ela teme pelas novas meninas, que nunca conheceram o mundo em que elas poderiam trabalhar, estudar e ser donas de seu dinheiro e de sua vida. Offred pensa em sua filha, em como ela está, o que estão lhe ensinando. Será que lembra dela?
São quadros amplos, muitas vezes com apenas o vermelho das aias a se destacar nas páginas. Existem cenas de violência e tal como no livro são igualmente perturbadoras. Renée primeiro pintou à mão e depois digitalizou os desenhos e mesmo sabendo que fazer digitalmente é mais rápido, prefere o tradicional para poder deixar sua marca e sua identidade nas ilustrações. Nos quadros em que a cena é à noite, é possível sentir a opressão da casa sobre Offred, como ela se sente sozinha e precisando de um contato físico com alguém. Ela é só um útero ambulante, ninguém olha para uma aia.
Renée praticamente não trabalhou com Margaret na confecção da graphic novel, então ela teve bastante liberdade de colocar sua visão a respeito do livro e da história nas páginas e acredito que o trabalho ficou excelente. Também é curioso notar como traços tão belos podem ilustrar uma história tão dolorosa, tão horrível e opressiva. É como se mostrasse uma extensão do pensamento da própria aia, de tentar achar um pouco de beleza em sua vida, mesmo que seja uma vida marcada pela opressão e pela violência.
O livro é em capa rígida, macia, com folhas de alta gramatura e impressão de alta qualidade. Vem com fitinha para marcar as páginas. Não há problemas de revisão ou de tradução, que é de Ana Deiró. A brochura tem pintura trilateral com vermelho e flores, que também decoram as partes internas das capas.
Obra e realidade
O que mais assusta na história das aias e em como as mulheres são divididas e destratadas nem é o fato de Margaret ter usado apenas coisas que de fato aconteceram. O que mais me enraivece em livros como esse, como Vox, entre outras distopias feministas, é a conivência dos homens. Para a maioria esse mundo é ótimo. São poucos aqueles que de fato estão preocupados com a vida que as mulheres levam, pois para eles esse é o lugar da mulher. E pior, muitos desses homens estão hoje em posições em que têm poder de tomada de decisão. Com uma canetada, as mulheres perdem direitos.Por isso se vestir de aia e ir protestar em casas legislativas é tão forte e tão significativo, pois a roupa vermelha simboliza a opressão com a qual aqueles senhores muitas vezes concordam. É preciso ficar vigilante, pois até mesmo aqueles caras que nós conhecemos e que parecem tão legais, em uma situação parecida, estariam colaborando com o sistema apenas para poder sobreviver.
Margaret Atwood é ensaísta, roteirista, escritora e professora universitária canadense, ganhadora de vários prêmios. Renée Nault é uma ilustradora, escritora e quadrinista canadense.
PONTOS POSITIVOS
Baseado no livro original
Ilustrações e cores
Bem escrito
PONTOS NEGATIVOS
Violência
Preço
Baseado no livro original
Ilustrações e cores
Bem escrito
PONTOS NEGATIVOS
Violência
Preço
Avaliação do MS?
Curti muito mais a leitura da graphic novel do que do livro em si. Pessoalmente, nunca curti a escrita da Margaret e nem algumas de suas declarações. Mas não nego a importância de sua obra e de seu livro e se essas adaptações, tanto na TV quanto na graphic novel, puserem as pessoas para pensar, acredito que já teremos uma missão cumprida. Não tive coragem de assistir à série ainda, mas acredito que ela seja tão chocante quanto o livro. Cinco aliens para a graphic novel de O Conto da Aia e uma forte indicação para você ler também!Até mais!
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