O Teste Tauriel

Nesta semana da mulher, de 1º a 8 de março, portais nerds feministas se juntaram em uma ação coletiva - Ação Nerd Feminista - para discutir de temas pertinentes à data e à cultura pop, trazendo análises, resenhas, entrevistas e críticas que tragam novas e instigantes reflexões e visões. São eles: Collant Sem Decote, Delirium Nerd, Ideias em Roxo, Momentum Saga, Nó de Oito, Preta, Nerd & Burning Hell, Prosa Livre, Séries Por Elas, Valkírias, Psicologia&CulturaPop. #WeCanNerdIt #FeminismoNerd #8deMarço

O Teste Tauriel



O teste é enganosamente simples, assim como é o Bechdel, mas é revoltante ver quantas personagens não conseguem passar nele. A simplicidade destes testes escondem algo que é de conhecimento público para as mulheres: o quanto somos mal representadas na mídia. Os requisitos do teste são:

1. Ter ao menos uma mulher.
2. Ela tem que ser competente e boa no que faz.

Passar no teste ou em qualquer teste, não é um atestado de qualidade. É apenas uma forma de medir representatividade.

Enquanto temos muitas Personagens Femininas Fortes em vários enredos, muitas vezes elas são incompetentes, irrelevantes para o final da história, precisam de ajuda em qualquer coisa, não evoluem e acabam mortas ou como prêmio do herói. Se elas estão trabalhando, elas são mostradas como OK, mas atrapalhadas, desastradas, um desastre fofinho e feminino, enquanto seus colegas homens são ultracompetentes, sérios e seus trabalhos são elogiados. A coisa piora muito se há um romance envolvido, implícito ou não, pois ela provavelmente vai largar seu trabalho no meio para ir atrás do cara ou vai gritar, chorar e se desesperar até o retorno dele.

Tauriel é uma personagem que não existe em O Hobbit e quando foi colocada no filme, foi como se Mordor explodisse sobre o longa de Peter Jackson, com o chororô dos caras, dizendo que tinham acabado com a história. Na verdade, Tauriel levou muitas moças ao cinema, que adotaram o estilo de cabelo e roupa da personagem no cosplay. Mesmo tendo um interesse romântico envolvido - e esse triângulo me soou forçado - a personagem é competente em sua função de guerreira.

Se analisarmos a cultura pop e filmes que contenham personagens femininas, é triste notar como existem filmes em que as personagens poderiam ser sensacionais se elas não perdessem o cérebro pelo meio do caminho e ferrassem com carreira, estudos ou trabalho. Pense em Bella, em Crepúsculo e o que aconteceu com o sumiço de Edward. Ela quase morreu só para poder vê-lo de novo e suas notas na escola despencaram.

Em De Repente 30, Jenna Rink sai correndo da revista onde trabalha, deixando o circo pegando fogo com o fechamento da revista e a venda das fotos do Matt, porque ele vai se casar. Oi!, você é a editora, será que não vão precisar de você para tentar apagar o incêndio que você mesma começou? A idade da personagem não conta aqui, já que meninas são criadas sempre voltadas para casamento, para arranjar um príncipe encantado, não para seguir uma carreira e ser competente nela. O comportamento de Jenna seria outro se esse fosse o caso. Trinity, em Matrix, devia ser muito boa no que fazia, já que ela foi trazida para o mundo real. E só também. Não sabemos mais nada sobre sua competência ou vida a partir do segundo filme, porque ela é apaixonada por Neo e é essa sua missão. Acaba aí sua relevância.

Agora vejamos a Detetive Joss Carter, de Person of Interest. Não só era uma policial altamente elogiada e condecorada como uma investigadora de primeira. Ela fica na cola do Homem de Terno na tentativa de prendê-lo e ao perceber que o sistema está corrupto, passa a ajudá-lo em seu trabalho. Ela gerou as situações que levaram ao fim que ela teve, assumiu as consequências, mas não deixou nenhuma investigação no meio para correr atrás de namorado. E o que dizer de Nikita? Mesmo com a óbvia sexualização da personagem, ela era absurdamente boa no que fazia.

Nikita, de vestido vermelho, sentada em uma poltrona
Nikita

Coronel Samantha Carter, em Stargate-SG1 é uma personagem bem escrita e com um arco narrativo completo, sendo uma das melhores personagens da ficção científica. Mesmo sendo uma pessoa sensível e emotiva, ela nunca deixou os colegas na mão, é excelente em seu trabalho, tendo um doutorado em astrofísica e já salvou a Terra mais vezes do que posso contar. Ela é um dos cérebros da equipe e o melhor de tudo, não morre.

Muitas personagens fortes estão se perdendo pela Síndrome de Trinity, que é quando a personagem feminina forte morre para auxiliar a jornada do herói. E ela também pode se tornar completamente incompetente e desastrada para servir de prêmio, como no caso do horrível e lamentável desperdício de dinheiro e película, Passageiros (2016). A personagem de Jennifer Lawrence serve apenas para gritar e fazer nada. E pior, um romance inverossímil e machista é construído em cima do relacionamento dela com o homem que a condenou à solidão e morte em uma nave.

Há críticas com relação ao Teste Tauriel, justamente pelo triângulo-amoroso-Crepúsculo-like do enredo. Para uma história tão masculina quanto a do universo de O Senhor dos Anéis, ter uma personagem feminina de ação é sim positivo e, felizmente, Tauriel é uma excelente guerreira, pois se não fosse, esse teste teria outro nome, certamente. Ainda acho desnecessário ter um triângulo amoroso que soou tão forçado. E sim, é possível ter amor e romance em um filme, mas não é necessário emburrecer a personagem. Ela pode e deve continuar boa em seu trabalho.

É preciso mais mulheres escrevendo personagens femininas. Talvez assim não sejam necessários tantos testes para mostrar o óbvio.

Até mais!

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Comentários

  1. Eu lembro que fiquei bem triste quando cheguei lá pra ver a Tauriel (representada ainda por uma atriz que amo desde Lost) e ela terminou naquele romance tosco pra c*ralho. Tanto potencial perdido... Mas o terceiro filme em si é puro potencial perdido.

    As mulheres de Person Of Interest são maravilhosas! <3

    Você já assistiu a Broadchurch UK? Porque tem a Ellie e ela é uma personagem que eu amo muito, fora dos padrões de beleza e cuja moral e foco em seu trabalho e na sua vontade de fazer o bem a tornam uma heroína maravilhosa. Eu acho que a série não é muito famosa por aqui, mas é muito boa e é impossível não amar Ellie. Ah, nesta temporada eles estão lidando com o tema de abuso sexual e estão lidando de uma maneira muito séria e bem feita!

    Adoro o blog, sempre bom ler as suas opiniões, até mesmo quando não concordamos 100% em algo. =*

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  2. Não conhecia este teste e AMEI! Tens toda razão! Eu AMEI a Tauriel, só detestei o rolo dela com o Legolas. E sobre o teste ainda, eu sempre penso nisso, só não sabia que já existia um teste sobre isso. Lembrei da Gillian Anderson em The Fall (nunca lembro os nomes dos personagens da serie), a série passa no teste com méritos, que personagem maravilhosa! Continuaremos de olho, agora com mais uma arma em mãos! Ótimo post!

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  3. Não sabia desse teste, mas já tinha reparado isso. A construção de personagens fodonas só na teoria pq na prática o roteiro joga elas de lado. Isso ficou muito mais claro pra mim quando vi Homem Formiga -- filme que achei suuuper chato, aliás haha

    Eles pintam a personagem feminina como super forte, inteligente, maravilhosa, e nem se quer a usam para nada. Deixam a ação toda com o cara e ela nem tem nenhuma relevância depois de ter 'cumprido seu papel'. Pra quê criar uma personagem assim, só pra servir como um mecanismo da história?

    Post muito bom! :)

    Beijo!

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  4. Ótimo artigo! Eu já conhecia o teste Bechdel, mas esse ainda não. Sendo escritora, percebo que é difícil mesmo se livrar das convenções que aprendemos sem nem perceber. Acho q parte disso vem muito do q absorvemos assim. Preciso ler mais das suas recomendações de autoras e rever as coisas q eu escrevo! Tento manter minhas personagens mais independentes, mas nem sempre eu percebo, isso foi de grande ajuda, obrigada.

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