Resenha dupla: Parasite e Symbiont, de Mira Grant

Essa deveria ser uma resenha de uma trilogia, mas eu mal consegui terminar o segundo livro e não pretendo ler o terceiro e achei melhor resenhar o que tinha lido logo de uma vez. Temos aqui mais um ótimo exemplo de uma grande ideia, de uma incrível premissa para se discutir muita coisa e de fazer um excelente thriller médico e distópico e que desceu a ladeira. A trilogia tinha muito, mas muito potencial.






Parasite
Após anos de pesquisa, a comunidade médica recebeu a notícia de que seria possível acabar com as doenças. Era criado o Diphyllobothrium symbogenesis, ou o Protetor IntestinalTM. A premissa é bem simples: o D. symbogenesis é uma tênia intestinal, geneticamente modificada, projetada para te proteger de alergias, infecções, inflamações entre vários outros problemas de saúde. Com ele você nunca mais ficará doente. Basta tomar um comprimido que contém o ovo e esperar. Uma empresa mantém o monopólio na confecção desses protetores, a Symbogen.


Em paralelo a isso, temos a história de Sal, Sally Mitchell, que depois de sofrer um grave acidente de carro e entrar em morte cerebral, acorda no hospital, sem nenhuma memória ou lembrança de quem era. Ela precisou aprender a andar, falar, comer, ler, e depois de seis anos, sua memória não voltou. Ela tem um namorado, um parasitólogo e vive com a família em uma casa confortável. Seu pai é médico do USAMRIID, um instituto de pesquisas médicas e infecciosas do Exército.

Sal tem todas as despesas médicas cobertas pela Symbogen. A empresa até ajuda no abrigo de animais onde Sal trabalha. Mas aí as coisas começam a ficar estranhas. Uma doença transforma as pessoas em zumbis catatônicos violentos que atacam as pessoas. Os casos estão se espalhando cada vez mais. Sal e o namorado testemunham a cena enquanto passeiam e resgatam o cachorro de um doente. Isso tudo que você leu acontece em cerca de 100 páginas e já deu para perceber que há uma conexão com o Protetor IntestinalTM, certo? Então, só Mira Grant que não percebeu.

Mira Grant nos enrola por boa parte do livro, segurando os fatos que ligam o D. symbogenesis com a doença, sendo que todo mundo já percebeu que tem algo a ver. Ela ainda nos insulta ao ligar o namorado da Sal com uma das pesquisadoras que criou o D. symbogenesis e depois dizer que não foi intencional. A autora arrasta o livro ao longo de exaustivas 504 páginas para nos revelar nada que já não soubéssemos e inclui cenas e fatos completamente desnecessários o tempo todo. É legal a gente ter fatos alheios e curiosidades, mas Mira repete as mesmas informações com uma frequência irritante e o que interessa ela revela em longos diálogos monótonos, intercalados com repetição de fatos e sensações e voltamos aos fatos inúteis tudo de novo. Sério, foi muito cansativo.

Pontos positivos
Ficção científica
Vermes
A capa
Pontos negativos
Sal
Encheção de linguiça
Muito longo

Título: Parasite
Trilogia Parasitology
1. Parasite
2. Symbiont
3. Chimera
Autor: Mira Grant
Editora: Orbit Books
Ano: 2013
Páginas: 504
Onde comprar: Amazon


Symbiont
O que era de se esperar em Parasite aconteceu: um apocalipse. As pessoas se tornaram zumbis conduzidos por tênias que migraram dos intestinos para o cérebro das pessoas. Lembra dos dinossauros em Parque dos Dinossauros e de como a natureza acha um jeito? Então, aqui as tênias, que deveriam ser estéreis, acharam um jeito. Só que você não sabe que houve um apocalipse. Na verdade o leitor não vê essa parte porque passamos o tempo todo com Sal, a estranha e estapafúrdia fixação que os zumbis têm com ela e com experimentos dolorosos feitos nela. Pronto, é isso o livro.


Mas não é esse o grande problema de Symbiont. Como todo mundo deve ter imaginado, desde Parasite, Sal não é Sally Mitchell. No momento de seu acidente de carro, o verme migrou para seu cérebro, a curou e ainda assumiu o corpo de Sally. Desta forma temos uma tênia intestinal de seis anos de idade, utilizando um corpo humano, falando, andando, namorando e correndo contra o tempo por causa de uma empresa maligna no estilo Umbrella. Aí temos aquela situação que fez o livro e a trilogia inteira perder todo o mérito. Você descobre que você não é você, que na verdade um verme intestinal tomou seu cérebro e a pessoa que residia naquele corpo morreu. Você descobre que outras tênias estão tomando os corpos de pessoas inocentes e atacando outras pessoas. Você:

a. Surta
b. Grita
c. Senta e chora
d. Fica feliz porque agora tem uma família controlada por tênias intestinais

Sério, Sal fica feliz que agora tem uma grande família composta por tênias intestinais que invadiram e parasitaram um corpo humano, tornando-se perfeitas quimeras. Isso é inacreditável. Nem suspendendo toda a descrença do mundo dá pra engolir uma coisa dessas.

Mira parece não decidir o que quer fazer com esses livros. Ela não sabe se escreve um thriller médico (o que seria uma excelente maneira de trabalhar questões de saúde pública, gênero e engenharia genética) ou se escreve sobre um apocalipse zumbi-parasitário (o que também seria legal se fosse bem executado e ainda traria a praga zumbi em uma nova roupagem). Sal é uma personagem que não convence. Mira confunde sexo biológico com gênero, depois conserta no segundo livro, fez de Sal, uma tênia de seis anos, uma moça super articulada e que escapa milagrosamente de todas as desgraças. São muitas ocasiões em que você não consegue acreditar no que está lendo.

Aliás, a melhor coisa do segundo livro é um antagonista chamado Ronnie. Ronnie é uma tênia projetada para hospedar um homem grande, truculento, acostumado ao trabalho braçal. Por problemas de compatibilidade, a tênia precisou ser implantada em um corpo de uma mulher e ninguém respeita a identidade de gênero de Ronnie, exceto Sal. Se Mira tivesse se aprofundado nessa parte, teria rendido uma excelente discussão aos leitores, mas ela passa por cima muito brevemente para voltar às longas explicações repetitivas.

Algumas pessoas precisam entender que saúde pública é mais importante que margem de lucro.Tweet:

Parasite

Depois de tudo isso, perdi a vontade de ler Chimera, o último livro da trilogia. Pelas resenhas que andei lendo, muitas pessoas odiaram a trilogia, em especial o último, que mantém os mesmos problemas dos anteriores, uma pena.

Pontos positivos
Ficção científica
A capa
Ronnie
Pontos negativos

Todo o resto


Título: Parasite
Trilogia Parasitology
1. Parasite
2. Symbiont
3. Chimera
Autor: Mira Grant
Editora: Orbit Books
Ano: 2014
Páginas: 499
Onde comprar: Amazon


Ficção e realidade
A ideia de criar um simbionte que cuide de nossa saúde seria uma consequência da Hipótese da Higiene, proposta por David Strachan em 1989. A ideia é que o excesso de limpeza levaria à uma maior incidência de doenças alérgicas e auto-imunes. A maneira de lidar com isso seria a de permitir que crianças se sujem e tenham a oportunidade de brincar em ambientes ao ar livre, ao invés dos ambientes excessivamente limpos do interior das residências.

É uma ideia muito criativa de combater doenças, mas seria aceitável socialmente? A Symbogen até mudou a forma de chamar a tênia, usando o termo Protetor IntestinalTM para que as pessoas não lembrassem que tinham vermes nos intestinos. A tênia ou solitária é um verme que infesta vários animais, inclusive o ser humano e é um problema sério em países pobres e em desenvolvimento devido à carne contaminada ou falta de saneamento básico. Não faz muito tempo que um ex-jogador do Sport, Leonardo, morreu devido à neurocisticercose, uma complicação no sistema neurológico causada pela tênia.

O que Mira Grant fez e nisso a trilogia têm seu mérito, foi pegar um flagelo para a raça humana e transformá-la em algo que promova saúde. Mas assim como em sua trilogia anterior, Newsflesh, a natureza nos supera a cada vez que tentamos lhe passar a perna.


Avaliação do MS?
Uma pena. Sério. Eu curti Newsflesh, mas os mesmos problemas da trilogia anterior foram carregados para cá e piorados. Personagens repetitivos, rasos, repetição eterna de diálogos, reviravoltas manjadas e um enredo que não traz nada, nem surpresas, nem um bom caminho para o leitor seguir. A capa impressiona, o tema é ótimo, mas a execução é péssima. Não indico para ninguém. Um alien.



Até mais!


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Comentários

  1. Acompanhei seus comentários sobre o livro no Skoob, mas só agora fiquei realmente sabendo de que se tratava a história e achei a ideia super original - pena que a autora não soube lidar com ela. Que pena :(

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  2. Não li, e pela sua resenha, devo continuar sem ler hehe

    Essa história de parasitas me lembrou um ótimo anime chamado (oh!) Parasyte. Não sei se você já viu esta animação, mas achei muito interessante. Se tiver interesse, assista: http://myanimelist.net/anime/22535/Kiseijuu__Sei_no_Kakuritsu

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  3. Bah, eu também queria muito gostar dessa série, mas li o primeiro livro e achei muito chato. O pior é que a Seanan McGuire (para apressadinhos: Mira Grant é pseudônimo) escreve tanto e tão variadamente que eu não posso evitar pensar que a culpa é do editor. Faltou apontar "olha, aqui está chato".

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