Fiquei tão vidrada no livro de Riley Sager, A última mentira que contei, que peguei seu lançamento mais recente, que saiu em 2024 pela editora Intrínseca. Inspirado em um caso real de crime em família do século XIX, o autor construiu um suspense gótico em torno de um assassinato famoso e de uma poderosa família que se destruiu devido à mentiras e traição.
O livro
A rica família Hope é bem conhecida daquela região do Maine. Eles construíram uma grande mansão na ponta de um penhasco, conhecida como Hope's End, o que é até irônico se a gente for pensar. Em 1929, um crime terrível chocou a população. Pai, mãe e irmã foram brutalmente mortos e somente a filha mais velha, Lenora, sobreviveu. Obviamente, ela se tornou a principal suspeita, ainda que a polícia não tenha encontrado provas de seu envolvimento no crime. Mas foi o suficiente para que a população acreditasse que Lenora era de fato uma assassina. Lenora não foi mais vista e nunca falou sobre os crimes daquela noite.
A cruel realidade de ser um cuidador é que o trabalho é sempre temporário.
Décadas depois, a história é apenas uma cantiga de roda um tanto bizarra. Kit McDeere é cuidadora de idosos e conhece a história por ter crescido ouvindo os eventos de sessenta anos atrás. Tendo passado por uma tragédia familiar recente que quase lhe custou o emprego, Kit fica surpresa com a oferta que chega através da agência de cuidadores: Hope's End. A antiga enfermeira fugiu no meio da noite e Lenora Hope precisa de uma nova cuidadora. Sem ter pra onde correr, Kit aceita, mesmo sentindo que aquilo pode ser um erro.
O mesmo mau agouro que Kit sente ao chegar no lugar é o que a gente sente conforme lê, algo que o autor soube captar muito bem de romances góticos. O tempo parece estagnado no lugar assim que ela cruza os portões. A casa está em péssimas condições, com móveis antiquados nos cômodos, torta e quase despencando no penhasco. Já a paciente de Kit, Lenora, está com 70 anos, confinada a uma cadeira de rodas, sem poder falar ou se mover depois de vários AVCs. Além de olhares e gestos muito leves com uma das mãos, Lenora só consegue se comunicar com Kit por meio de uma velha máquina de escrever. Até que, uma noite, Lenora escreve uma frase inesperada:
eu quero te contar tudo
Se vocês estivesse na mesma situação de Kit, não ficaria curiosa por estar no meio de um dos grandes mistérios da sua geração e da anterior? Kit embarca nessa jornada e assiste à lenta daligrafia de Lenora, enquanto interage com os outros empregados da propriedade, que são bem poucos. E todos eles parecem enrolados nesse crime bárbaro, perdido no tempo, de alguma maneira. Chegou uma hora em que parei de tentar adivinhar o que tinha ocorrido de verdade, porque não conseguia mais ter certeza de nada.
Nenhum personagem ali é tão certinho, tão vil, tão indiferente quanto parece. Kit foi investigada após a morte de um paciente sob seus cuidados e também não parece ser quem a gente pensa que é. E enquanto ela tenta descobrir o que aconteceu naquele longínquo ano de 1929, temos flashbacks das irmãs, Virginia e Lenora Hope e sua família conturbada, repleta de segredos. Será que havia mesmo tanto ódio assim entre essa família que levou a filha a matar todos eles? De acordo com esses flashbacks, parece sim!
Mas este é um livro de Riley Sager. As coisas nunca são o que parecem. Quando chegamos ao final, percebemos que a verdade esteve na nossa cara o tempo inteiro e ainda assim não fomos capazes de enxergar. A chegada de Kit na mansão é o gatilho para esse desenrolar finalmente acontecer e quando acontece, é mesmo de cair o queixo. Fiquei pensando: como foi que eu não vi isso?? Mas né, a ideia é essa mesmo, nos enganar voluntariamente.
Senti que o livro perdeu um pouco de ritmo perto do final. Como se Sager precisasse responder a algumas perguntas em aberto, mas se segurou demais para fazer isso e aí soltou tudo de maneira um tanto apressada no final. Mas ele conseguiu criar um mistério que nos segura até a última página, porque você se ligou tanto àqueles personagens, que precisa saber de tudo o que acontece com eles. Devo dizer que foi bem chocante saber de algumas responsabilidades ali dentro.
Até mesmo uma prisão se torna reconfortante se for a única coisa que você conhece.
Diferente da edição da Gutenberg do livro anterior, a revisão da Intrínseca está bem melhor e praticamente não há problemas de revisão, diagramação ou tradução, que ficou nas mãos de Renato Marques. Acho que Siger exagerou nas partes em que Kit pensa no quanto já sabe e no quanto ainda precisa descobrir, porque ela faz isso o tempo todo, mas OK, são partes que dá pra pular e continuar lendo.
Obra e realidade
Além de se inspirar em obras góticas como A Queda da Casa de Usher e Morro dos Ventos Uivantes, a grande inspiração para o crime na mansão dos Hope foi Lizzie Borden, acusada e julgada de matar seu pai e sua madrasta a machadadas. As mortes, a investigação e o julgamento tornaram o caso célebre e uma inspiração para várias obras que viriam depois, inclusive este livro.Algo que deixou Sager pensativo, por sua vez, foram os últimos anos de Borden. E se uma pessoa precisasse cuidar de uma Borden idosa e doente, como ela se sentiria de fazer isso sabendo da fama de sua paciente? Mesmo sabendo que ali poderia estar uma assaassina brutal, ela teria que continuar com seu trabalho. Quem teria esse sangue frio?

Riley Sager é um escritor norte-americano de suspense.
PONTOS POSITIVOS
A mansão
Lenora e Virginia
Suspense
PONTOS NEGATIVOS
Partes cansativas
Perde ritmo perto do final
A mansão
Lenora e Virginia
Suspense
PONTOS NEGATIVOS
Partes cansativas
Perde ritmo perto do final
Avaliação do MS?
Comecei a ler sem saber exatamente o que estava acontecendo, achando que sabia de tudo e no fim o autor me mostrou que eu não tinha ideia do que estava acontecendo. O autor se arrasta em alguns momentos, demora em outros, mas entrega um livro com começo, meio e fim. Se você curte livros de suspense gótico, então se joga nesse aqui. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!
Até mais! 🔪
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