Indicado pelo ex-presidente norte-americano Barack Obama em sua lista anual de leituras, Os náufragos do Wager é uma não-ficção preciosa, que traça os eventos ocorridos no século XVIII como se fosse um romance do mar. O premiado autor, David Grann, mergulhou nos arquivos empoeirados do caso do almirantado, para reconstruir os eventos históricos da tripulação do HMS Wager.
O livro
Era janeiro de 1742 quando uma embarcação precária, uma montagem de mau gosto baseada em um navio de verdade, apareceu na costa do Brasil, tripulada por trinta homens famintos, quase morrendo, mas com uma história assombrosa para contar. Eram sobreviventes do HMS Wager, um navio britânico que naufragara em uma ilha deserta na costa da Patagônia. Abandonados durante meses e sob circunstâncias bastante difíceis, os homens construíram o próprio navio e viajaram por mais de cem dias, sendo recebidos como heróis.Todos nós procuramos dar coerência - propor um significado - para os eventos caóticos da existência. Vasculhamos as imagens cruas de nossas memórias e as selecionamos, polimos, apagamos. De tal forma que emergimos como os heróis de nossas narrativas, nos permitindo conviver com o que fizemos - e com o que deixamos de fazer.
Só que seis meses depois desse evento incrível, um outro navio, ainda mais precário que o primeiro, chegou à costa chilena, desta vez com apenas três náufragos em pele e osso e uma narrativa bem diferente: os trinta marinheiros que desembarcaram no Brasil não eram heróis, e sim amotinados. Foi assim que começou a guerra de narrativas. Cada grupo defendia seu lado, demonstrando que enquanto estavam na ilha, a tripulação entrou em guerra (algo parecido com as crianças em Senhor das Moscas), com cada facção lutando pelo domínio.
E agora? Quem estava falando a verdade? Era um apontando o dedo para o outro, diários sendo escritos e publicados, cada um defendendo a veracidade dos relatos, a ponto de o Almirantado determinar uma corte marcial para averiguar os fatos num processo que poderia ser letal, afinal era o pescoço de cada um ali em risco.
Grann tem grande habilidade em transformar um evento histórico, por vezes esquecido, em uma experiência quase cinematográfica. O autor mergulhou nos detalhes da jornada do HMS Wager, desde sua trágica viagem até os desdobramentos do motim e do julgamento que seguiu. O autor nos transporta para o mundo sombrio e brutal dos marinheiros que enfrentaram fome, traição, mortes e dilemas morais inimagináveis em meio à desolação da Patagônia. A forma como Grann humaniza os personagens é especialmente marcante; eles não são meros nomes em um registro histórico, mas pessoas complexas cujas motivações e escolhas ganham vida na narrativa.
Qual seria a missão do Wager? Tudo começou com uma orelha cortada. Um marinheiro espanhol alegou que cortou a orelha de um marinheiro britânico. Esta era uma guerra de impérios, onde britânicos e espanhóis conquistaram o mundo e depois caíram matando uns sobre os outros. Em 1749, o Wager foi despachado para uma missão secreta no Atlântico, para abordar um navio de tesouro espanhol na costa chilena.
Mas os marinheiros enfrentaram dificuldades ao contornar o Cabo Horn, onde as correntes mais fortes do mundo golpeavam o navio com tanta força que até os veteranos cambaleavam das amuradas. Foi também aí que o escorbuto e o tifo se instalaram. Nesse ponto inicial da história, Grann começa a se desviar do romance da antiga literatura marítima. Ele relata o custo físico e psicológico da viagem.
Ainda que tenha sido bem documentado na época, grande parte dessa documentação se vale dos diários dos sobrevivente, em especial de dois indivíduos: o artilheiro John Bulkley e o jovem aspirante John Byron (que viria a ser o avô do poeta Lord Byron). Havia também as transcrições da Corte Marcial anos depois, tudo muito bem costurado pela narrativa ágil de Grann que, primeiro fala da expedição, do navio e de seus sobreviventes e depois tece uma crítica ao imperialismo.
O livro vem em capa comum e papel pólen natural e possuí imagens coloridas no miolo. A tradução de Pedro Maia Soares está ótima e não encontrei grandes problemas de revisão ou diagramação.
Obra e realidade
O HMS Wager era um navio da Marinha Real Britânica com 28 canhões e velas quadradas. Originalmente construído por volta de 1734 como um navio mercante para a Companhia das Índias Orientais, fez duas viagens à Índia antes de ser adquirido pela Marinha Real, em 1739. Fazia parte de um esquadrão comandado pelo comodoro George Anson e naufragou na costa sul do Chile em 14 de maio de 1741.O naufrágio do Wager tornou-se famoso devido às extraordinárias aventuras dos sobreviventes, que ficaram isolados na desolada Ilha Wager em pleno inverno patagônico. O episódio também ganhou notoriedade por conta do motim que ocorreu entre os sobreviventes após o naufrágio.
David Grann é um jornalista e escritor norte-americano. Autor de vários livros, escreve para a revista New Yorker.
PONTOS POSITIVOS
Tem imagens
Bem escrito e pesquisado
Análise sobre imperialismo
PONTOS NEGATIVOS
Pode ser devagar
Tem imagens
Bem escrito e pesquisado
Análise sobre imperialismo
PONTOS NEGATIVOS
Pode ser devagar
Avaliação do MS?
A combinação de um rigoroso trabalho de pesquisa com uma escrita fluida e envolvente faz deste livro uma leitura obrigatória para fãs de histórias de aventura, exploração e conflitos humanos. O Wager é mais do que um relato de naufrágio, motim e assassinato; é uma reflexão poderosa sobre a fragilidade da civilização quando confrontada com a força implacável da natureza. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!Até mais! 🔱
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