Resenha: Ascensão e reinado dos mamíferos, de Steve Brusatte

Desde seu livro anterior, Ascensão e queda dos dinossauros, que virei uma fã do trabalho de Brusatte. Paleontólogo que, inicialmente, era especialista em dinossauros, agora ele se debruça sobre a origem e evolução dos mamíferos, grupo que conhecemos muito bem, afinal fazemos parte dele. Aqui nós temos um apanhado do estado da arte sobre origem, diversificação e evolução dos mamíferos, vindo de tempos bem distantes até os dias atuais.

O livro
Na paleontologia, quem rouba a cena em qualquer museu ou aula sempre são os dinossauros. Vindo na esteira do grande sucesso dos cinemas com a franquia de Parque dos Dinossauros, muita criança se sentiu atraída pela área, inclusive o próprio autor, Steve Brusatte. Mas há outra classe de animais que também merece a atenção do público, até porque nós fazemos parte dele: os mamíferos. Com uma longa e fascinante história evolutiva, aqueles seres tímidos, que corriam entre as patas dos grandes dinossauros e se escondiam em suas tocas, ganharam o mundo após a grande extinção do final do Cretáceo, levando a uma impressionante diversificação em todos os continentes.

Resenha: Ascensão e reinado dos mamíferos, de Steve Brusatte

A seleção natural não planeja o futuro; ela só trabalha no presente, adaptando os organismos a suas características imediatas.

Ao longo de todo o domínio dos dinossauros, os mamíferos coexistiram com eles desde a divisão inicial de nosso ancestral comum amniota em sinapsídeos (nós) e diapsídeos (eles) até a extinção dos dinossauros não avianos no final do Cretáceo. Em cerca de 100 milhões de anos, diversas linhagens evoluíram, todos mamíferos arcaicos ou protomamíferos, desenvolvendo gradualmente as características que hoje reconhecemos como tipicamente mamíferas: pelicosaurídeos com dentes caninos, os primeiros "sussurros de uma revolução dental"; terapsídeos com os primeiros pelos e um novo tipo de metabolismo, a endotermia; cinodontes, alguns dos quais se miniaturizaram enquanto os dinossauros se tornaram gigantes; mamaliaformes que desenvolveram uma nova articulação da mandíbula; docodontes e haramídeos planadores com pelos; multituberculados com dentes cada vez mais complexos; e os terianos, que deram origem aos atuais placentários, marsupiais e monotremados.

Lendo essa longa história evolutiva, parece até que ela foi linear, um progresso sem percalços ou incidentes, como um plano bem redigido. Mas não é assim que a evolução funciona, pois os mamíferos era um conceito ainda não finalizado. Suas diversas características surgiam aqui e ali, algumas sendo bem-sucedidas num certo grupo e em outros não. Eles não estavam evoluindo essas características para se tornarem mamíferos, estavam se adaptando a situações e características imediatadas. Cada espécie, em seu tempo e lugar, se deu bem porque foi preciso. Não somos a espécie mamífera mais bem-sucedida, somos os sobreviventes de uma longa história da vida.

Com a extinção dos dinossauros no final do Cretáceo (66 milhões de anos atrás), devido a um terrível impacto de asteroide que deixou sua cicatriz na cratera de Chicxulub, os mamíferos não só se estabeleceram, mas passaram a dominar os nichos ecológicos agora deixados vagos. Isolados em diferentes massas de terra após a fragmentação do supercontinente Pangeia, estavam prontos para um grande desenvolvimento taxonômico que se desdobraria ao longo dos próximos milhões de anos. No hemisfério norte, multituberculados e metaterianos foram substituídos por mamíferos placentários, que, após o Máximo Térmico Paleoceno-Eoceno, evoluíram rapidamente para primatas e ungulados de dedos ímpares e pares. Os ungulados de dedos ímpares deram origem aos brontoterídeos e calicoterídeos, alguns dos maiores mamíferos terrestres de todos os tempos, enquanto os ungulados de dedos pares deram origem aos cetáceos, alguns dos maiores mamíferos marinhos já conhecidos.

Brusatte tem uma grande habilidade em dar vida a uma enxurrada de nomes estranhos. O livro não é um monótono compilado de características físicas de animais extintos, mas um álbum rico e dinâmico com nossos ancestrais. Como eles eram? Como viviam? Dá para deduzir isso de seus fósseis? O autor consegue atravessar até as partes mais complicadas para os leigos, entregando uma narrativa coerente, compreensível e muito gostosa de acompanhar, que vai agradar desde o especialista até o aluno do ensino médio que estejam curiosos com o livro.

A história da macroevolução mamífera é fascinante por si só, mas Brusatte a torna ainda mais interessante com suas observações. Costumamos pensar que os dinossauros dominaram os mamíferos, mas ele sugere algo bem diferente: ainda que seja verdade que os dinossauros impediram que os mamíferos se tornassem grandes, os mamíferos fizeram o oposto: eles impediram que os dinossauros se tornassem pequenos. Além disso, estudos de DNA indicam que muitas linhagens modernas de mamíferos surgiram já no Cretáceo.

Rastejar no meio da noite, para comer e socializar, era uma boa tática para evitar as bocarras e os pés esmagadores dos dinossauros, provavelmente criaturas diurnas.

O livro está muito bem escrito. Como um thriller de investigação, você quer chegar ao final, quer ler mais sobre as descobertas e correlações entre fósseis e DNA. Quer saber como os mamíferos se diversificaram e quais são as características que nos ligam. A tradução de Alessandra Bonrruquer está ótima e não encontrei grandes problemas de revisão. Gostaria de ter mais imagens e mapas, mas o que existe no livro já é suficiente para se acompanhar a leitura.

Obra e realidade
Brusatte começou sua vida acadêmica estudando dinossauros, porém hoje faz parte de um consórcio de pesquisa que está construindo uma árvore genealógica mestre com base tanto na anatomia quanto no DNA. O autor conta como migrou de um grupo para outro, além de entrelaçar as histórias de outros pesquisadores por trás da pesquisa. São jovens paleontólogas, como Amusuya Chinsamy-Turan, uma pioneira em histologia óssea que reuniu evidências a favor dos terapsídeos endotérmicos, mas também fala do trabalho pioneiro de cientistas como Zofia Kielan-Jaworowska, que Brusatte visitou em sua casa na Polônia, falando de suas expedições pela Mongólia em busca de fósseis de mamíferos. O autor mostra o estado da arte no momento atual e não esconde das leitoras o que ainda falta descobrir para montar toda a árvore genealógica dos mamíferos.

Mas Brusatte também é um otimista! Ele sabe que muitas descobertas empolgantes ainda estão esperando para serem feitas e os próximos anos prometem muitas novidades na área.

Steve Brusatte

Steve Brusatte é um paleontólogo e divulgador científico norte-americano, especialista na evolução dos dinossauros, professor e pesquisador da Universidade de Edimburgo, na Escócia.

PONTOS POSITIVOS
Bem pesquisado
Bem escrito
Muitas fontes no final
PONTOS NEGATIVOS

Poucas imagens
Revisão

Título: Ascensão e reinado dos mamíferos: das sombras dos dinossauros até nós
Título original em inglês: The Rise and Reign of the Mammals: A New History, from the Shadow of the Dinosaurs to Us
Autor: Steve Brusatte
Tradutora: Alessandra Bonrruquer
Editora: Record
Ano: 2024
Páginas: 462
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Foi uma leitura deliciosa, bastante proveitosa e educativa. Uma pena o livro não ter mais imagens ou mapas para que a experiência ficasse mais completa. Com uma narrativa bem tranquila de acompanhar, você vai ficar sabendo do estado da arte da ciência que estuda os mamíferos e, quem sabe, perceberá o quão maravilhosa é a evolução da vida na Terra. Cinco aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!


Até mais! 🐘

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