Resenha: Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley e Fred Fordham

Admirável Mundo Novo, publicado originalmente em 1932, é uma assustadora distopia clássica que figura em muitas listas de leituras obrigatórias de ficção científica. Curiosamente, meu primeiro contato com essa obra foi na adaptação para o cinema de 1998 com ninguém menos que Leonard Nimoy. Agora, esta obra atemporal ganha uma primorosa versão em quadrinhos tão perturbadora quando o livro original.

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O quadrinho
Londres, 2540, ou ano 632 depois de Ford (referência a Henry Ford, o primeiro a implantar a linha de montagem em série na produção de carros). As pessoas são fabricadas em instalações industriais estéreis e padronizadas, em lotes, onde são classificadas como alfas (os dominantes), betas, gamas, deltas e ípsilons. Úteros artificiais substituíram os nascimentos naturais, que são vistos como nojentos e degradantes. As castas designam a inteligência de cada indivíduo e desde pequenos todos são doutrinados a pertencer a cada uma. É uma visão bastante industrial da criação e educação de crianças, cuja justificativa seria para pôr fim às guerras que ameaçavam destruir a espécie humana. E essa sociedade dita perfeita tem muitos defensores.

Admirável Mundo Novo

Entre os personagens principais está Bernard Marx, um psicólogo um tanto quanto tímido, frustrado por sua baixa estatura, que se sente atraído por Lenina Crowne, uma jovem mulher totalmente imersa nessa cultura hedonista e controlada ao extremo, que incentiva a promiscuidade como um dever de todo cidadão (no filme de 1998, ela é interpretada pela atriz Rya Kihlstedt e tem uma participação bem mais ativa e profunda). Seu trabalho com aprendizagem durante o sono lhe permite compreender e desaprovar os métodos de sua sociedade para manter a paz de seus cidadãos, o que inclui o consumo constante de uma droga calmante e produtora de felicidade chamada "soma", a droga perfeita que “tem todas as vantagens do cristianismo e do álcool, mas nenhum de seus defeitos”.

Bernard é veemente e arrogante em suas críticas, e seu chefe pensa em exilá-lo para a Islândia devido a seu inconformismo. Seu único amigo é Helmholtz Watson, um escritor talentoso que acha difícil usar seus talentos de forma criativa em uma sociedade livre de dor. Um dia, Marx leva Lenina a uma reserva de "selvagens", pessoas que nasceram de forma natural e que vivem de maneira diferente. Tal como os horríveis zoológicos humanos, as pessoas "civilizadas" contemplam sua própria superioridade nestes momentos, mas depois de testemunharem um ritual, eles conhecem Linda, uma mulher que já viveu no "mundo civilizado" em Londres, que vive com um jovem homem, seu filho John. Bernard logo descobre que John é filho de seu chefe e este é um nascimento ilegal.

Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley e Fred Fordham

John decide conhecer esse "admirável mundo novo", enquanto Linda está ansiosa por voltar parar a "civilização". E o choque entre as duas culturas será demais para todos, enquanto John é tratado como uma celebridade, uma novidade excitante para a maioria das pessoas. Como uma sociedade baseada no consumo desenfreado, drogada para ser permanentemente feliz e desligada da realidade, incapaz de reagir a injustiças pelo individualismo causado pela perda de valores familiares e humanos pode se importar com a tragédia vivida por John? Parece familiar??

O quadrinho, ilustrado por Fred Fordham, quadrinista britânico, possui uma a experiência visual que torna a leitura ágil e dinâmica, em especial quando os diálogos são intercalados entre os diferentes cenários. As cores intensas usadas por Fordham provocam e despertam a sensibilidade de quem está lendo. É possível perceber a passagem do tempo com a mudança da paleta, mudanças nos cenários, mudanças nas expressões faciais dos personagens, tudo isso alternado com as passagens dramáticas do livro, com longos trechos de reflexões e uso de onomatopeias em vários momentos. Tudo é muito claro, colorido, como uma loja instagramável onde a pessoa sente vontade de comprar tudo o que está a vista e também muito limpo, higienista, ordenado.

Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley e Fred Fordham

Com uma primorosa tradução de Luisa Geisler, o quadrinho vem em capa comum, uma pena, e papel branco encorpado no miolo, com impressão colorida e vibrante. Não encontrei problemas de diagramação, revisão ou tradução.

O mundo é estável agora. As pessoas são felizes, conseguem o que querem, e nunca querem o que não podem conseguir. Estão bem de vida, estão seguras, nunca adoecem, não têm medo da morte. Vivem em um estado de feliz ignorância em relação à paixão e à velhice; não são atormentadas por mães nem pais; não têm cônjuges, nem filhos, nem amantes por quem sentir emoções fortes. Estão tão condicionadas que é praticamente impossível não se comportarem como devem. E, se alguma coisa der errado, existe o Soma.

Obra e realidade
A sociedade consumista do livro (e do quadrinho), que acredita que descartar é melhor do que consertar, toda permeada por frágeis relações de amizade e amorosas, alienada e desconectada da história, vista como uma farsa, é muito mais próxima de nós do que gostaríamos de acreditar ou admitir. É assustador pensar que um livro publicado em 1932 possa dialogar com tanta facilidade com os dias atuais. Queremos tanto nos basear na ciência e no progresso, mas como estamos fazendo isso? Em que estamos baseando nosso conhecimento, nossos relacionamentos, nossa sociedade?

Quando Huxley escreveu este livro, o mundo ainda estava imerso nas consequências da Grande Depressão de 1929, onde havia uma visão pessimista do futuro e uma feroz crítica ao culto positivista à ciência. Havia dúvidas sobre o progresso, sobre os regimes democráticos e as sociedades ocidentais sentiam que o mundo estava fadado a se autodestruir. O que o livro mostra é uma "americanização" mundial e aqueles que reagem ao sistema, são selvagens excluídos da sociedade, condenados a viver nas terras ermas, longa da "civilização".

Aldous Huxley e Fred Fordham

Aldous Huxley foi um proeminente escritor inglês, autor de livros de ficção, ensaios e poesias, guias de viagens e crônicas.

Fred Fordham é um quadrinista e ilustrador britânico, autor de obras como a graphic novel de O sol é para todos.

PONTOS POSITIVOS
Lindamente ilustrado
Clássico scifi
Bem escrito
PONTOS NEGATIVOS
Violência
Acaba rápido!

Título: Admirável Mundo Novo
Título original em inglês: Brave New World
Autor: Aldous Huxley
Ilustrador: Fred Fordham
Tradutora: Luisa Geisler
Editora: Companhia das Letras (selo Quadrinhos na Cia)
Páginas: 240
Ano de lançamento: 2023
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
A leitura de Admirável Mundo Novo, seja o quadrinho, seja o livro, é essencial para os dias de hoje. Tal como suas obras assemelhadas, 1984 e Fahrenheit 451, ela dialoga com a sociedade atual de maneira profunda e chocante. O quadrinho capta as principais partes dramáticas da história em uma obra colorida, gritante, higienista, que captou muito bem a mensagem original. Quatro aliens para o quadrinho e uma forte recomendação para você ler também!


Até mais!

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