Resenha: Lua de sangue, de N. K. Jemisin

N. K. Jemisin já é uma das minhas autoras favoritas desde A Quinta Estação, um dos melhores livros que já li. Lua de sangue, seu terceiro livro, publicado em 2012, é um enredo inovador em um cenário memorável, inspirado no Antigo Egito, em uma história cheia de ação que não esquece das lutas e jornadas pessoais de seus personagens.

Parceria Momentum Saga e Editora Morro Branco

O livro
Ehiru é um sacerdote da Deusa dos Sonhos, Hananja, que tem a tarefa de conceder a paz – a morte – àqueles considerados contaminados pela corrupção ou que precisam desesperadamente escapar da vida de forma indolor. Ehiru é conhecido como Coletor; aqueles que vêm silenciosamente na calada da noite, na cidade sagrada de Guajareeh, para coletar a essência dos sonhos de seus alvos, matando-os no processo. Qualquer Coletor estremece só de ouvir a palavra “matar”, alegando que eles são apenas entregando as pessoas à paz de sua deusa.

Resenha: Lua de sangue, de N. K. Jemisin

Recontamos as histórias porque sabemos: a pedra não é eterna. Mas as palavras podem ser.

O enredo começa quando Ehiru está realizando uma reunião uma noite e fica surpreso com a resposta de sua vítima, que afirma que Ehiru não está fazendo o trabalho de Hananja, mas na verdade sendo usado por suas ordens. Isso o perturba e ele acaba deixando a alma do homem desaparecer em agonia. Ele mal tem tempo de se punir pelo erro. Ehiru é o Coletor mais famoso de Gujaareh, o mais fiel à causa e à sua doutrina, e a partir desse momento ele passa a questionar tudo em que sempre acreditou. E decide investigar por conta a fim de tentar salvar o lugar que ama.

Gujaareh é como uma cidade-estado. Um lugar quase idílico, de paz pelas ruas, com seus coletores seguindo sonhos e almas de maneira a garantir a manutenção dessa paz. Obedecendo à Deusa dos Sonhos, seus poderes podem ser usados de maneira a punir criminosos. Ehiru é um coletor que descobre que sua retidão o torna um alvo fácil para manipulação. Ele sempre viveu acreditando na ideia de que Guajareeh é uma cidade desprovida de corrupção e loucura. Em Guajareeh, a justiça é uma questão religiosa: é dura, rápida e sagrada.

Assim, Ehiru fica chocado com a acusação de que eles também podem ser corruptos, participando do mesmo mal contra o qual lutam. Como pode que as pessoas encarregadas de defender a paz também sejam corruptas? Esse começo em que Ehiru toma um "pedala Robinho" da realidade demora a fazer o livro engatar. Não vou mentir, teve horas em que queria fazer leitura dinâmica porque o livro começa devagar, mas o mistério, a ambientação de Jemisin, a complexidade de seus personagens, te seguram a cada virada de página. Você tem que continuar.

Descobrimos junto de Ehiru e dos outros personagens que a guerra e a corrupção deveriam estar extintas. Eles percebem que esses são elementos intrínsecos à natureza humana, e que uma sociedade que se afirma livre deles é apenas hipócrita. Assim como a maioria das coisas em sua cidade, Ehiru passa a compreender os problemas de sua fé, descobrindo que ela é uma faca de dois gumes. Não é assim no mundo real também?

Matar é proibido em Guajareeh, mas não para todos. A corrupção é proibida na cidade, mas não para todo mundo. Algumas pessoas estão acima de Hananja e de seu alcance, além das esferas da civilidade e da justiça sagrada, reservada apenas para aqueles que não estão no poder, ou seja, os oprimidos, os excluídos, os miseráveis e os estrangeiros. Parece familiar? Para essa parcela da sociedade, não existe o "bem maior". Aliás, uma coisa que percebemos junto de Ehiru é que o bem maior não quer dizer não significa algo melhor para todos, só para alguns.

Os verdadeiros sonhadores são gênios e loucos. A maior parte das terras consegue tolerar apenas alguns, e eles morrem jovens.

O livro está muito bonito, em uma edição em capa dura e papel pólen soft e uma ótima tradução de Aline Storto Pereira. Não encontrei grandes problemas de revisão ou diagramação nele. Uma coisa que senti falta no livro foi um mapa. Este é daqueles trabalhos em que o cenário é muito importante para o andamento do enredo e um mapa nos ajudaria a visualizar melhor algumas coisas. No final do livro temos um glossário e uma entrevista com a autora.

Obra e realidade
Este é um daqueles livros que revela a ambivalência de seus sistemas e organizações. Guajareeh é considerada pacífica, praticamente perfeita, mas é descrita como uma cidade onde a política era metade religião e metade mistério, um lugar com pouca privacidade e segurança, onde apenas os costumes e as cortinas mantinham um quarto seguro.

Essa sociedade reverencia as mulheres, uma vez que a sua principal deusa é feminina, entretanto isso não impede que os rígidos papéis de género restrinjam suas ações. Os coletores são sempre homens. O papel das mulheres está relacionado ao sexo, à família. Pode-se ter centenas de esposas, mas uma mulher certamente não pode ter mais de um marido. Apenas os "filhos do Sol” têm direito ao mundo desperto, afirma o antagonista, revelando o domínio masculino em Guajareeh. Na cidade, as mulheres ainda estão relacionadas à sedução, ao lar e à maternidade. Pode haver um Príncipe, mas nunca uma Princesa.

N.K. Jemisin

N.K. Jemisin mora no Brooklyn, é psicóloga e conselheira educacional de formação e hoje é escritora em tempo integral. Foi resenhista do The New York Times por três anos e é também autora da Trilogia da Terra Partida, pela Morro Branco e a Trilogia Legado, lançada no Brasil pela Galera Record. Mora com seu gato, Ozzy.

PONTOS POSITIVOS
Bem escrito
Ehiru
Discussão sobre política e corrupção
PONTOS NEGATIVOS
Não tem mapa
Começa devagar

Título: Lua de sangue
Título original em inglês: The Killing Moon
Série Dreamblood
1. Lua de sangue
2. Sombras do Sol
Autora: N.K. Jemisin
Tradutora: Aline Storto Pereira
Editora: Morro Branco
Páginas: 368
Ano de lançamento: 2022
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Se você procura uma obra de fantasia inovadora, baseada no Antigo Egito, com personagens complexos e um enredo com reviravoltas, então encontrou! Se o começo parecer difícil e meio embolado, não desista, pois seu enredo supera essa dificuldade inicial e muito. Personagens perfeitamente irritantes e imperfeitos, muita discussão sobre desigualdades e corrupção em um livro imperdível. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!


Até mais! 🌙

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