Resenha: A última livraria de Londres, de Madeline Martin

Comecei a ler esse livro por acaso, em uma noite sem energia elétrica em casa. Escolhi aleatoriamente no Kindle e comecei a ler enquanto esperava a energia voltar. Quando vi, já tinha lido a metade dele antes de dormir e no dia seguinte tinha terminado. Baseado em fatos reais durante a Segunda Guerra Mundial, o livro é um deleite para os amantes da leitura e das livrarias, e como elas podem nos ajudar a passar por momentos difíceis.

O livro
Grace Bennett está realizando um sonho junto de sua amiga de infância, Viv. Deixando para trás uma vida de desgostos no interior da Inglaterra, em agosto de 1939, elas chegam a Londres. O que elas esperam de uma cidade grande é o charme cosmopolita com que tanto sonharam. Sentindo-se um pouco deslocadas, com suas roupas do interior, as duas chegam a uma cidade muito diferente daquilo que pensaram ser: a cidade está em compasso de espera, pois, no continente, Hitler está se preparando para uma guerra.

Resenha: A última livraria de Londres, de Madeline Martin

- Acredito que dentro de todos nós há um vazio, uma lacuna esperando para ser preenchida por algo. Para mim, esse algo são os livros e todas as experiências que eles oferecem.

Hospedadas na casa de uma grande amiga da mãe de Grace, a senhora Weatherford, as duas jovens buscam por emprego. Viv foi esperta, forjou uma carta de recomendação para si mesma e conseguiu emprego numa grande loja de departamentos, mas Grace não teve coragem de fazer isso. Então, a senhora Weatherford lhe consegue um emprego numa acanhada livraria local, a Primrose Hill, deslocada da avenida principal onde as grandes lojas estão.

Martin se baseou na história real das poucas livrarias que sobreviveram aos bombardeios na Segunda Guerra Mundial e em como os britânicos se apoiaram na ficção para enfrentar os períodos difíceis com os bombardeios noturnos, a perda de familiares, vizinhos, amigos. Acompanhamos a luta de Grace para se adaptar a essa nova realidade, não só na vida e na guerra, mas também no novo emprego. Grace não é exatamente uma especialista em livros, mas é especialista em comércio, tendo cuidado da loja dos tios antes de ser expulsa da própria casa por eles.

Como uma jornada de amadurecimento, acompanhamos a rotina de Grace para tornar a livraria Primrose Hill um lugar mais atraente para os clientes. O dono, Sr. Evans, um senhor ranzinza e de pouca fala, aos poucos aceita os conselhos da jovem e a livraria logo se torna uma loja bem sucedida, atraindo clientes e até a ira de lojas vizinhas pelo sucesso empreendido. Mas conforme a guerra avança, tanto Grace quanto Viv começam a ficar inquietas, sentindo que deveriam contribuir de alguma forma. Vendo tantos jovens indo para a guerra, Viv é a primeira a se voluntariar para trabalhar no esforço de guerra.

Mas os livros serviam a um propósito. As distrações sempre eram necessárias. Ainda mais em tempos de conflito.

Um livro é sempre um instantâneo muito específico de uma determinada época, de determinadas pessoas, de uma determinada situação. E aqui não é diferente. Li algumas críticas ao livro que me soaram estranhas como, por exemplo, dizer que ele tem passagens "patriotas demais". Se este é um retrato de uma situação difícil para o país, é meio óbvio que a chama do patriotismo surgiria. Com as personagens não foi diferente. Elas tentaram lutar com as ferramentas que tinham à sua disposição, e para as mulheres da década de 1940, as opções eram bem limitadas.

Também há um clima de romance lá pelo meio que me deixou receosa enquanto a leitura prosseguia. Temia que ele tomasse conta da narrativa e esquecesse do crescimento e amadurecimento de Grace, que é um dos focos do livro. Felizmente, a autora foi muito consciente de nunca apagar o protagonismo da personagem. Grace é uma moça tímida, até mesmo tacanha quando comparada à metrópole londrina, mas seu empenho em fazer da livraria um lugar agradável para os clientes acaba transformando-a. E até o romance achei que foi bem maduro e próprio para a época. Ele ocupa um espaço que é justo, sem roubar da história o que importa.

No fim, acho que o livro é uma homenagem ao poder da ficção de nos confortar em tempos difíceis. Quantas de nós mergulham de cabeça em livros, séries, filmes, quadrinhos, para viver nestes mundos diferentes do nosso, de maneira a deixar os problemas de lado? Em um mundo em guerra, as artes muitas vezes são condenadas, apagadas, queimadas, perseguidas, mas elas também vicejam, ressurgem como a plantinha que encontra uma brecha no concreto, para cumprir seu papel. O livro de Martin é um recorte específico sobre Londres, mas a autora já escreveu sobre o assunto em outros lugares, como em seu novo livro, The Keeper of Hidden Books, que se passa na Polônia ocupada pelos nazistas. Aliás, espero que esse livro seja traduzido por aqui também!

A tradução de Simone Reisner está ótima. Não encontrei grandes problemas no ebook, que está bem diagramado e revisado.

Obra e realidade
Londres permaneceu o centro da indústria editorial e da vida literária durante a Segunda Guerra Mundial, apesar do "segundo grande incêndio de Londres" em 29-30 de dezembro de 1940 durante a Blitz, quando armazéns e as instalações de 27 editoras foram atingidas, destruindo cinco milhões de livros. O papel também era escasso, com os editores reduzidos a apenas um quarto de seus suprimentos pré-guerra. Mais tarde na guerra eles ainda estavam abaixo de 50% do que estavam acostumados antes. Essa escassez de papel levou O Senhor dos Anéis a ser publicado em três volumes, ao invés de um, como queria Tolkien.

O número de livros publicados caiu de cerca de 14 mil em 1939 para apenas 6.700 em 1943, permanecendo nesse nível até o fim da guerra. Mas a escassez relativa parecia aumentar a procura por livros, pois, ao mesmo tempo os gastos do público leitor com eles aumentaram dramaticamente, de 9 milhões libras em 1939 para 23 milhões em 1945. Livros novos eram vendidos rapidamente e seus estoques acabam em questão de semanas. As bibliotecas também estavam em maior demanda e a venda de livros usados estava crescendo.

Além da ressurgência dos livros clássicos, os livros de detetives se tornaram bastante populares. Fundada em 1930, a Penguin Books ganhou o mercado o livro de bolso acessível. Houve uma enorme demanda pelos 'Penguin Specials', os livros de bolso com preço de seis pence que cobriam a história e assuntos recentes. Para os 87 títulos produzidos em 1941, a Penguin vendeu mais de 100 mil cópias coletivamente. Um título anterior, Where Do We Go From Here? (1940), de Harold Laski, vendeu mais de 80 mil exemplares sozinho – um grande feito para um trabalho sobre teoria política de esquerda.

Madeline Martin

Madeline Martin é uma escritora e historiadora norte-americana.

PONTOS POSITIVOS
Bem pesquisado
Bem escrito
Grace e Viv
PONTOS NEGATIVOS

Acaba rápido!


Título: A última livraria de Londres
Título original em inglês: The Last Bookshop in London
Autora: Madeline Martin
Tradutora: Simone Reisner
Editora: Arqueiro
Ano: 2022
Páginas: 272
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Sofri com esses personagens. Chorei com eles, fiquei feliz com eles, caminhei ao seu lado pela Londres destruída e acompanhei as leituras públicas que Grace fez aos vizinhos durante as noites de bombardeios. Enquanto ela descobre essa nova paixão pelos livros, acompanhamos as várias referências literárias que a autora colocou pelo meio e em como o interesse dos londrinos pela literatura os ajudou a suportar o período. Inclusive gostaria que o livro fosse mais longo, pois eu certamente leria mais cem páginas da jornada de Grace. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!


Até mais! 📖

É através dos livros que podemos encontrar a maior esperança.

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