Wandinha: abraçando a excentricidade

Um dos fenômenos do streaming no final de 2022 foi a minissérie Wandinha! A primogênita do clã dos Addams estreou em grande estilo em uma série própria com criação e direção de Tim Burton e com a fenomenal Jenna Ortega no papel principal, Wandinha tem de tudo um pouco: tensão, amor, risadas, amizade, monstros e luta do bem contra o mal.

A ficcional e excêntrica família foi criada como tirinhas de jornal em 1938 por Charles Addams, cartunista da revista The New Yorker. O primeiro rascunho de Addams foi em 1932. Até sua morte, em 1988, ele publicou 1300 tirinhas na revista, mas apenas 58 deles eram com a família Addams, publicados em 1940 e 1950. Em 1964 estreava a adaptação dos quadrinhos para a televisão com um tom mais puxado para a comédia do que para os tons mais "diabólicos" das tirinhas da revista, durando apenas duas temporadas.

Parada durante a década de 1980, ela voltou para a mídia com os dois já clássicos filmes de Barry Sonnenfeld que acabou por cristalizar na mente da maioria do público o visual da família. O segundo filme, porém, foi muito mal na bilheteria, em 1993 e depois da morte de Raul Julia, o Gomez Addams, Sonnenfeld desistiu de continuar com a franquia. Outras produções vieram em seguida, mas não conseguiram repetir o feito do primeiro filme. Duas animações saíram, uma delas em meio à pandemia, sendo que não foram tão bem, mesmo contando com um elenco de sucesso. Aí estreou Wandinha em novembro de 2022.

Wandinha é expulsa do colégio por causa de uma brincadeirinha cruel contra alguns rapazes que maltrataram seu irmão. Por isso, seus pais decidem mandá-la para a Escola Nunca Mais (Nevermore Academy), onde os próprios Gomez e Mortícia, o casal mais sensual das trevas, estudaram. Se nos filmes dos anos 1990 Wandinha tinha 10 anos, aqui ela já está no ensino médio, com 16 anos de pura frieza e calculismo.

Os filmes dA Família Addams nos anos 1990 forma um fenômeno. A crítica pode até não ter gostado, mas o público curtiu e muito as interações daquela família esquisita porque, provavelmente, encontrou nela várias similaridades com suas próprias famílias. Assim como eu, muitas meninas queriam ser inteligentes, sombrias e espertas como Wandinha Addams. Muito bem interpretada por Cristina Ricci, que também participa da série nova, Wandinha era um lembrete à todas nós de que estava tudo bem ser estranha e diferente (e potencialmente homicida). Os vilões de verdade eram aqueles que tentavam nos fazer caber em padrões.

Gomez e Feioso são animados. Mortícia é temperamental, silenciosa, espirituosa, às vezes mortal. Vovó Addams é tremendamente bem-humorada. Wandinha é filha de sua mãe. Uma família muito unida, a verdadeira chefe sendo Mortícia - embora cada um deles sejam bem resolvido - exceto a vovó, que é facilmente persuadida. Muitos dos problemas que eles têm como família se devem ao caráter desajeitado e fraco da vovó. A casa está um bagaço, é claro, mas esta é uma família orgulhosa de ter uma casa assim onde todas armadilhas estão em bom estado. Dinheiro não é um problema para eles.

Charles Addams, A Família Addams: Álbum de Família (2021)

Quando eu era criança nunca fui muito fã dos filmes das princesas da Disney. Meus filmes favoritos eram justamente os filmes do Batman, de Tim Burton, bem como Os fantasmas se divertem, Os Caça-Fantasmas e A História Sem Fim. Ou seja, nada de princesas cantando com os passarinhos na floresta, eu curtia mesmo era o visual sombrio das cidades, seus fantasmas, mortos e criaturas míticas. Com a chegada dos filmes de A Família Addams não foi diferente.Wandinha era aquela anti-princesa que cativou o público rapidamente com sua pele pálida, trancinhas impecáveis e a roupinha preta de gola branca.

Portanto foi uma ideia genial trazê-la como protagonista de sua própria história e não apenas um apêndice ao romance caliente de seus pais. Com uma interpretação surpreendente de Jenna Ortega, a família continua sombria e esquisita, resgatando os traços e intenções originais de Charles Addams. Wandinha é inteligente, perspicaz, mordaz em suas observações e bastante talentosa em tudo o que se dispõe a fazer. Ela mostra que dá para conciliar o lado sombrio com inteligência sem nenhum problema.

Outra coisa que surpreende no arco da personagem tanto nos anos 1990 quanto nos dias de hoje: ela não tem interesses românticos. Se acontecer, OK, mas caso contrário ela não está interessada em ficar com meninos. A cultura pop socou esse estereótipo de comercial de margarina na cabeça das meninas por muito tempo. As princesas da Disney talvez sejam o melhor exemplo, onde a Bela Adormecida não pode ser acordada pelo amor dos pais, mas pode ser por um príncipe completamente desconhecido. Wandinha inclusive disse no filme de 1993 que teria pena do sujeito que se apaixonasse por ela.

Wandinha sempre tem uma resposta para todos aqueles que apontam sua esquisitice. Longe de ser uma dama em perigo, Wandinha não se vê como a esquisita do grupo. Na verdade, todos os outros é que são os diferentes. Ela não se importa em ser aceita em nenhum grupo já que os grupos padronizam as pessoas e Wandinha é tudo menos uma garota padrão. Por isso é tão fácil para aqueles que também nunca se encaixaram em lugar algum se identificarem com ela.

Por baixo de todo o mistério sobrenatural da escola, está uma jornada para jovens aprendendo a assumir responsabilidades - tanto de suas ações quanto de seus efeitos sobre os outros. Ao salvar a escola da destruição, Wandinha também tem o desafio de reparar o dano que ela causou em seus próprios relacionamentos com os colegas e com a família. O apelo duradouro de personagens como ela, uma pária de bom coração (quase sempre), é justamente o desejo de todo jovem esquisito de se sentir visto e aceito do jeito que é.

E aí, você assistiu Wandinha? Até mais!

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