Como meu gosto literário mudou ao longo dos anos

Tive o grande privilégio de estudar em um colégio com biblioteca e incentivos para a leitura e a escrita. Livros estão na minha vida desde que aprendi a ler e a escrever, por indicação das professoras ou às minhas idas às livrarias que, na época, não eram as megalojas de hoje. Eram portinhas mais tímidas, com pilhas pequenas na entrada e bem menos variedade do que hoje. Recentemente percebi que meu gosto literário mudou ao longo dos anos e isso é muito bom.

Como meu gosto literário mudou ao longo dos anos

Ainda que no colégio tivéssemos leituras obrigatórias, lembro com carinho da Coleção Vaga-Lume e de livros como Na Barreira do Inferno, Sílvia Cintra Franco ou Os Guardiões de Sotérion, de Ganymédes José, eu também buscava leituras fora. Lembro de ver clássicos universais em edições mais baratas na banca e comprar e trocar com as minhas amigas. A ficção científica veio com os livros de bolso da LP&M, em especial O Homem Bicentenário, de Isaac Asimov. Algum tempo depois, descobri Neuromancer, de William Gibson depois de ler uma indicação na revista Superinterassante.

Ainda que gostasse muito de ler, eu não tinha muito acesso a livros por falta de dinheiro. Na faculdade pude usar a biblioteca nas férias, frequentava sebos e buscava livros com desconto. Amo um bom romance histório e naquela época li muita coisa de Christian Jacq, sendo que a Pentalogia de Ramsés é a minha favorita. Ficção científica estava restrita a séries e a filmes, ainda que eu tenha lido Fundação, de Asimov, que no fim acabou não me agradando tanto.

A leitura se tornou bem mais frequente com a chegada do Kindle, em 2013. Lembro que em 2012 eu li 30 livros e em 2013, com o Kindle, li 73. Mais que o dobro, certo? Me concentrei em ler muita ficção científica, principalmente em inglês, mas conheci grandes livros de autoras brasileiras depois disso, como os contos de Cris Lasaitis e a distopia de Roberta Spindler.

Se você olhar na páginas das Resenhas aqui do blog, vai notar que predominam obras de ficção científica e fantasia. FC ainda é o meu gênero favorito, mas ultimamente ela não tem me ajudado muito a passar pela pandemia. Vai notar também muitas distopias juvenis, mas elas também não andam me agradando nesses tempos. Muitas repetem as mesmas fórmulas e depois de um tempo fica cansativo, porque você já sabe o que esperar.

Graças a portais como o da Jéssica Reinaldo, da Gabi Barbosa, das Valkírias, tenho me inspirado a buscar novas leituras, novos estilos e me aventurar em gêneros que antes não teriam me agradado. Não é fácil sair da zona de conforto, mas tenho descoberto bons livros nessa empreitada. Tenho seguido no Twitter editoras como a Todavia, a Ponto, a Wish, a Malê, a Instante, e descoberto leituras que estão me agradando e me surpreendendo, pois eu jamais teria procurado por conta própria.

É natural que a gente amadureça e nossos gostos sejam levados nessa jornada. Ainda amo uma boa ficção científica, uma aventura espacial com personagens cativantes, mas já não tenho mais tanto medo dos clássicos. Essa parte é a mais surpreendente para mim, pois por anos eu fiquei longe deles, achando que não tinha condições de ler e compreender o que diziam. Sei que muitos têm receio de pegar um livro clássico, pois eu também tinha. Mas acredite, com o tempo e com a bagagem literária que você acumula, a linguagem deles vai ficando mais palatável.

Vi isso acontecer na faculdade com os livros de Milton Santos, um dos grandes geógrafos e intelectuais do Brasil. No primeiro ano, seus livros eram como uma estela em hieróglifo, totalmente incompreensível para mim e meus colegas. No terceiro ano, depois de tanto ler textos geográficos e me aprofundar na teoria e métodos, ler Milton Santos foi incrivelmente mais fácil do que eu esperava. Eu acumulei bagagem, portanto estava mais apta para ler o Miltão.

Não se espante se você começar a curtir livros que antes lhe eram impensáveis. Faz parte da vida de cada leitora e leitor, é uma evolução e é benéfica. Recentemente estive na pilha pelos thrillers com mulheres fortes e determinadas e li vários, sendo que nem todos me agradaram. E tudo bem! Não dá para ler uma obra-prima por semana. Nem tudo tem que ser perfeito. Li todos os livros de Dan Brown, pois tem história da arte no meio, um assunto que eu adoro, além de serem thrillers.

Tenho lido muito mais quadrinhos também. Para quem cresceu com a Turma da Mônica e passou anos sem ler nada em quadrinhos, hoje eles constituem grande parte das minhas leituras costumeiras. Ou seja, estou expandindo o leque, fazendo um trabalho de curadoria em busca de obras que me interessam. Recentemente recebi em casa os dois volumes de O Conde de Monte Cristo e a edição pocket de Os Irmãos Karamázov. Ano passado chegaram A Muralha, de Dinah Silveira de Queiroz e A Sucessora, de Carolina Nabuco. Posso dizer quando vou ler todos? Não, mas posso dizer que isso não teria acontecido alguns anos atrás.

Tenho procurado mais livros de não-ficção e biografias, outra coisa que seria impensável até uns anos trás. Livros de ciência ou história da ciência também estão me agradando muito mais do que a ficção. Recentemente, em uma tentativa de entender o que está havendo com o mundo nessa pandemia, li A Bailarina da Morte, sobre a pandemia de 1918 e terminei A História das Epidemias, que reconta a história da civilização através dos grandes surtos epidêmicos, inclusive falando sobre a Covid-19. Não diminui o perigo desses dias, mas ao menos me fez entender o que estamos passando.

Acho que no fim, nossas leituras são uma extensão de nossos momentos, de nossos pensamentos e de como crescemos e amadurecemos ao longo do tempo. Hoje aquele livro que parece indecifrável poderá ser uma leitura surpreendente ano que vem. Faz parte de uma vida de leituras, faz parte do processo de curadoria de nossas bibliotecas.

Como estão seus gostos literários ultimamente? Mudaram?

Leituras


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Comentários

  1. Notei essa mudança também, na frequência (infelizmente tenho lido menos, mas gosto de ler por prazer e não pra bater meta rs) e no gênero (já passei pelos clássicos nacionais, policiais, FC, fantasia). Nós mudamos e o que a gente lê muda junto (e faz a gente mudar mais).

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  2. é, eu dei uma boa parada em livros de fantasia, Y.A ou não.
    acho que a última trilogia foi Daevabad, mas todas as outras que estão sendo as favoritas dos booktubers, simplesmente não me agradam tanto mais.
    Tudo muito repetido, sobretudo naquilo que segue a saga do herói, e na caracterização dos personagens.

    Do gênero, o realismo mágico latino ainda me agrada, e tenho lido mais nesse estilo.

    Mas na ficção científica ainda acho boas leituras, sobretudo em inglês.
    Acho que a ficção científica muda muito conforme os tempos, vai se renovando, então é mais diversificada.
    Infelizmente o mercado editorial brasileiro não traduz ou publica muitos livros de ficção científica modernos. Lendo agora Wayfarer #4


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