Resenha: O Vampiro, de John Polidori

A figura do vampiro está profundamente enraizada na cultura pop. O sugador de sangue de presas afiadas aparece em filmes, séries de TV, quadrinhos, RPGs, desenhos animados, nas mais variadas formas em dramas, terror, comédias e produções infantis. Há toda uma aura de sedução e mistério na figura do vampiro, mas de tão enraizada na nossa cultura, sua origem acabou se diluindo. A fonte para todo esse fenômeno é em um conto curtinho de John Polidori chamado "O Vampiro", de 1819.

Cortesia da editora e da Revista Quatro Cinco Um

O livro
O jovem Aubrey está para partir em uma viagem. Pouco antes de zarpar, ele conhece um nobre inglês chamado Lorde Ruthven, um homem misterioso, não exatamente bonito, mas que emana uma aura de charme irresistível. Os dois acabam como companheiros de viagem, mas Aubrey começa a reparar que o comportamento de Ruthven não é muito salutar. O nobre inglês se refestela na tragédia das pessoas, se ilumina ao ver as pessoas sofrendo e usa as mulheres para descartá-las com a mesma facilidade. Cansado desse comportamento, Aubrey decide se afastar, apenas para reencontrar a figura maquiavélica em sua viagem.

Resenha: O Vampiro, de John Polidori

A figura do vampiro, até a criação de Polidori, era basicamente rural, fétida, bestial e bruta, uma fera que se apossava de cadáveres que não tivessem tomado os ritos cristãos. Nas áreas rurais era comum que mortes de crianças e de animais fossem atribuídos a vampiros sedentos para sugar sua força vital e seu sangue. Os mortos eram acusados de tais crimes e era comum que se exumassem caixões em busca de atividades vampíricas. Eis que encontravam pessoas com sangue saindo pelos lábios, com cabelos e unhas crescidos.

Tais supostos vampiros eram traídos pela própria biologia. Para populações iletradas e supersticiosas o que seriam provas incontestes de uma ação sobrenatural apavorante nada mais eram do que resultados da natural decomposição do corpo. A desidratação e recuo da pele deixava cabelos e unhas à mostra; a expulsão de líquidos pelos orifícios deixavam marcas de sangue e fluídos e; a pele quente era resultado da elevação da temperatura resultante de ação de bactérias relacionadas à putrefação.

O que Polidori fez foi tirar o vampiro da região rural e levá-lo para o centro da civilização ocidental, para o seio da sociedade dita civilizada e erudita, um vampiro nobre, elegante, sagaz, mas ainda assim uma fera. Você pode ter reconhecido pela descrição desde Drácula até Lestat, pois esse vampiro se torna o protótipo de todos os outros que surgiriam nos séculos seguintes.

A primeira menção escrita de que se tem notícia à palavra ❝vampiro❞ para designar esse tipo de assombração sugadora de sangue é relativamente recente, remontando o século XVIII, mais precisamente ao ano de 1725 (...) quando da publicação de um artigo sobre o assunto em um jornal vienense. Logo, o termo difundiu-se entre os povos de língua alemã, não tardando para chegar às imprensas francesa e inglesa em 1732 (...).

Página 20

O livro do Sebo Clepsidra e da Aetia não contém apenas o conto de Polidori. Essa edição, na verdade, é uma coletânea que abrange toda a obra além de resenhas, cartas, trechos de diários e uma biografia de Polidori no final. É uma obra definitiva, que serve como fonte de pesquisas, tamanho o esmero nos extras e nas notas. O prefácio de Matangrano já nos prepara para a leitura, resgatando a lenda original do vampiro e explicando como ele se tornaria viral depois de Polidori. Entre as narrativas relacionadas presentes temos Fragmento, o texto original inacabado de Byron, de 1819; O Vampiro Negro, uma Lenda de São Domingos, de Uriah Derick D'Arcy, também de 1819; A Noiva das Ilhas, de autoria anônima, de 1825 e O Vampiro, de Isidor, de 1833. Há também duas peças de teatro, mais apêndices complementares.

É preciso destacar também a qualidade gráfica impressionante do livro que vem em capa dura. Pertecendo à Coleção Imaginário Gótico, toda a arte interna da obra remete à arte gótica com seus floreios em preto e branco. No final temos também uma galeria de imagens com reproduções de pinturas, cartas e pôsteres. Encontrei, porém, alguns errinhos de revisão, como palavras sobrando, vírgulas fora de lugar e letras batidas a mais ou faltando. As traduções e os textos estão ótimos.

Embora seja pálida a face, e cintilantes os olhos, é impressionante a sedução sofrida pela vítima infeliz e cega, que desfalace em seu abraço como um pássaro fitado por um basilisco.

Página 195

Obra e realidade
O conto de Polidori é baseado em "O Fragmento" de Lorde Byron, de quem Polidori fora médico particular. Na auspiciosa noite de 16 de junho de 1816, em uma noite chuvosa na Suíça, estavam reunidos Mary Shelley (ainda usando seu nome de solteira), Percy Shelley, John Polidori e Lorde Byron. Os convivas conversavam sobre literatura e surgiu a ideia de uma competição para ver quem escreveria uma história aterrorizante de fantasmas. Esta noite lendária viu surgir Frankenstein e também "O Vampiro", dois seres seminais para toda uma literatura de horror e ficção científica que surgiria depois.

Byron nunca terminou seu conto, mas Polidori o pegou para si e nele se baseou para criar O Vampiro. Tanto que quando foi publicado, o editor creditou a autoria a Byron, o que ajudou a impulsionar o conto. A relação de Polidori com Byron era carregada de tensão e podemos ver isso através da leitura do conto, pois enquanto Aubrey é uma clara personificação do próprio John - ingênuo, carente e jovem - Lorde Ruthven é a personificação de Byron - sedutor, canalha e inconsequente - já que o próprio nome do vampiro foi retirado do romance Glenarvon, escrito por uma das amantes do poeta inglês.

John Polidori

John William Polidori morreria muito jovem, com apenas 25 anos, amargurado e com dívidas de jogo. Ainda paira uma dúvida se sua morte foi de causas naturais ou devido a um suicídio. Ele não viveu para ver sua obra eternizada em tantas outras, desdobrando-se nas mais diversas representações de uma figura deslumbrante que marcou toda uma cultura.

PONTOS POSITIVOS
Trabalho gráfico impecável
O Vampiro
Bem escrito e pesquisado
PONTOS NEGATIVOS

Alguns errinhos de revisão

Título: O Vampiro - edição comemorativa de 200 anos
Título original em inglês: The Vampyre
Autor: John Polidori
Organizadora: Marina Sena
Tradução e notas do inglês: Marina Sena
Tradução e notas francês: Bruno Anselmi Matangrano
Tradução e notas do alemão: Felipe Vale da Silva
Editora: Sebo Clepsidra e Aetia Editorial
Páginas: 404
Ano de lançamento: 2020
Onde comprar: na Amazon ou na loja do Sebo Clepsidra!

Avaliação do MS?
Um livro completo e perfeito. Você encontrará vários contos traduzidos pela Amazon, mas apenas essa edição é completa, uma fonte de pesquisa perfeita para qualquer pessoa interessada no assunto de vampiros. Se você é fã de sugadores de sangue misteriosos e charmosos, não pode deixar de ter esse livro na sua estante. Cinco aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!



Até mais! 🧛‍♂️

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