Resenha: Livre, de Cheryl Strayed

Iniciando as resenhas do Projeto Releituras, reli recentemente Livre, de Cheryl Strayed, uma autobiografia que virou filme com Reese Witherspoon. A autora conta sem rodeios sobre os percalços de sua vida, seus erros, e a forma como se reencontrou e achou seu lugar no mundo: colocando uma mochila nas costas e seguindo a trilha da Pacific Crest Trail.

👓 Este livro faz parte do Projeto Releituras!


O livro
Meu primeiro contato com o livro se deu depois de assistir ao filme. Apesar de ser uma obra bem adaptada e a atuação de Reese estar ótima, o longa não consegue dar ao expectador tudo o que o livro contém. Cheryl é uma moça de 22 anos que perdeu a mãe de maneira repentina, que viu sua família se afastar e seu casamento desmoronar. Seu pai era violento com os filhos, batia na esposa. Ou seja, a vida não facilitou em nada para Cheryl e ela se sente perdida e sem perspectiva.

Resenha: Livre, de Cheryl Strayed


Quatro anos depois, em 1995, Cheryl toma uma decisão súbita: ela decide percorrer parte da trilha de 1770 quilômetros da Pacific Crest Trail (PCT) – trilha que atravessa a costa oeste dos Estados Unidos, do deserto de Mojave, através da Califórnia e do Oregon, em direção ao estado de Washington – sem qualquer companhia. Foi uma decisão de impulso. Cheryl nada sabia sobre as dificuldades da trilha, nem mesmo sabia como fazer uma. Mas foi a caminhada que mudou sua vida.

Narrado em primeira pessoa, com vários diálogos e pensamentos da autora, Cheryl abre o coração ao falar de sua vida. Sua mãe morreu ainda jovem, de câncer de pulmão, uma doença silenciosa, algo que nunca superou. Cheryl nem acreditava que sua mãe pudesse morrer da doença, já que não fumava, não tinha outros fatores de risco, levava uma dieta equilibrada. É fácil entender porque a perda da mãe a abalou tanto.

Após a descoberta da doença, os médicos lhe deram apenas um ano de vida. Seus irmãos se afastaram, deixando Cheryl sozinha para lidar com tudo. Nós ficamos sabendo disso conforme acompanhamos a trilha de Cheryl, conforme ela volta em momentos dolorosos do passado. Carregando uma descomunal mochila, que ela mesma apelidou de Monstra, Cheryl sofre com esfoladuras, dores incontáveis, calos e bolhas, arranhões e cansaço, além de desidratação. A trilha age como uma materialização de seu sofrimento, obrigando-a a passar pelos obstáculos de forma a superar seus próprios traumas.

Sua mãe morreu em um mês, não em um ano como os médicos disseram. Foi quando Cheryl desmoronou de vez, sem o apoio da família e perdendo o marido após vários casos extraconjugais. Viciada em heroína e grávida do homem que a viciou, parece que é o fim da linha para ela. Cada pessoa lida com o luto de maneiras diferentes, mas conforme viramos as páginas, notamos que Cheryl tinha muitos traumas nunca resolvidos desde criança, quando seu pai a trancava junto dos irmãos fora de casa e os deixava passar fome.

A descoberta da trilha se deu por acidente. Enquanto tentava comprar uma pá para desenterrar seu carro da neve, Cheryl vê um livro sobre a Pacific Crest Trail, uma longa trilha que se estende da fronteira dos Estados Unidos com o México até à sua fronteira com o Canadá, com 4260 km em sua extensão total. Cheryl então decide: ela percorreria parte da PCT, partindo de Mojave, na Califórnia, até a Ponte dos Deuses, no Oregon, cerca de 1770 km.

Cada dia na trilha era a única preparação possível para o dia seguinte. E, às vezes, nem mesmo o dia anterior me preparava para o que viria a seguir.

É possível rir e chorar junto de Cheryl, de querer abraçá-la quando os momentos da trilha eram mais difíceis. Há momentos em que em tudo o que você quer fazer é sacudi-la para fazê-la cair na real e retomar as rédeas de sua vida. E é sempre importante ressaltar que este não é um livro de auto-ajuda, é uma biografia. Não é porque a trilha da PCT funcionou com ela que vai funcionar para qualquer pessoa. Cheryl usou drogas e sexo de maneira a tentar sanar a dor da perda da mãe e do marido, ela precisava de muita terapia, não apenas da trilha, então uma coisa não pode ser substituida pela outra.

Reli o livro na sua versão ebook, não o livro físico, mas não encontrei problemas de revisão ou diagramação, nem mesmo de tradução, que foi de Débora Chaves e está muito boa.

Obra e realidade
Existe uma tradição na literatura norte-americana do século XX de autores e personagens se jogando na estrada de forma a tratar suas dores e inquietações. Há uma busca interna dessas pessoas em achar um sentido em situações de risco. Estar em movimento na estrada dá vazão à essa fase instável da vida de maneira a desfrutar de um universo novo, instável e inédito, que seja diferente daquele ao qual a pessoa está acostumada. Movimentar-se seria uma forma de autotransformação, um perder-se para encontrar-se.

Cheryl Strayed

Cheryl Strayed é uma escritora e ensaísta norte-americana.

PONTOS POSITIVOS
PCT
Bem escrito
Biografia
PONTOS NEGATIVOS
Assédio
Pode ser meio lento

Título: Livre
Título original em inglês: Wild
Autora: Cheryl Strayed
Tradutora: Débora Chaves
Editora: Objetiva
Páginas: 304
Ano de lançamento: 2014
Onde comprar: na Amazon!
Avaliação do MS?
O filósofo alemão Goethe falava sobre a necessidade de todo ser humano de estar em contato com a natureza para que encontrasse um equilíbrio mental e emocional. Nossa sociedade urbana não poderia estar mais distante desse cenário, aquartelados em nossas residências cada vez mais compactas, ainda mais em um período de pandemia. De alguma forma, a jornada de Cheryl na PCT nos ajuda a encontrar um sentido em tempos difíceis, tal como a trilha a fez perceber. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!



Até mais!

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