Resenha: A única mulher, de Marie Benedict

Se você está lendo essa resenha por um celular, saiba que você tem uma dívida de gratidão com Hedy Lamarr. A atriz austríaca, considerada uma das mais belas mulheres do mundo, a inspiração para a aparência de a Branca de Neve na bem-sucedida animação da Disney, foi uma mulher intensa, inteligente, que sofreu nas mãos de um marido abusivo e buscou trilhar seu caminho sem a interferência de ninguém.

Parceria Momentum Saga e editora Planeta

O livro
Esta não é uma biografia de Lamarr, mas sim uma versão romanceada, onde a autora tomou algumas licenças poéticas para preencher as lacunas na vida de Hedy. Aqui temos uma visão maior de como deve ter sido a vida da autora antes da fama, um período do qual ela mesma nunca falou muito. Aos 19 anos, Hedy já era uma atriz celebrada no teatro de Viena, tendo chamado a atenção da mídia de uma forma controversa: ao estrelar o filme mudo Êxtase, Hedy protagonizou a primeira cena de um orgasmo feminino em tela e escandalizou a sociedade.

Resenha: A única mulher, de Marie Benedict

O filme a perseguiu por um bom tempo. Mas ela esperava que, ao se casar com um homem rico e poderoso de Viena (e também mais velho que ela), Friedrich Mandl, Hedy garantiria a proteção da família em uma época de ascensão do nazifascismo. Seu pai temia que as políticas antisemitas de Hitler atingissem os judeus de Viena, inclusive sua família. Ainda que não fossem tão religiosos quanto alguns vizinhos, para a política de Hilter não fazia diferença.

Mas o casamento de Hedy foi tudo, menos pacífico. Mandl era um poderoso empresário, fabricante de armas e achava que podia controlar o mundo e sua esposa. Se de início ele parecia um homem apaixonado, que se deliciava com a independência de Hedy e sua inteligência, ele não demorou a demonstrar seu lado controlador quando o casal foi a Paris para escolher o vestido de noiva e ele deixou o braço de Hedy marcado de dedos ao recusar o vestido que ela escolhera. Como cláusula do casamento, ele mandou que Lamarr deixassse os palcos. E Hedy o fez.

Um dos subtítulos do livro comenta que "o mundo não estava preparado para Hedy Lamarr". Hedy era uma mulher que quebrava convenções e escandalizava a sociedade apenas por ser quem era. Quando fugiu do marido e retomou a carreira de atriz, seus pensamentos não deixavam de voltar a Viena, à mãe, que se recusou a sair da cidade, e às conversas que entreouviu enquanto ainda era casada com Mandl. Nesta parte a autora confessa que preencheu algumas lacunas, mas acredita que ela teria ouvido planos secretos, já que seu marido tinha contatos com pessoas como Mussolini.

Eu era como um pássaro exótico, que só tinha permissão de sair da gaiola dourada para apresentações e, logo em seguida, era trancafiado de novo.

Página 92

Hedy prezava por sua liberdade. E a liberdade da mulher ainda é vista como algo a ser combatido, basta ver como somos obrigadas a ter que tomar um monte de cuidados na rua, no transporte público, nas festas, pois sempre tem alguém que se acha no direito de dispor de nossos corpos. Hedy precisava combater essa visão, esse preconceito, lutando por seu salário, por seus papéis, por sua vida privada.

A famosa invenção que deveria ter ajudado nos esforços de guerra ao ajudar torpedos a acertar seus alvos foi preterida. A Marinha não teve interesse e engavetou a patente, ainda que compreendesse a engenhosidade do equipamento. Não é uma ironia que sua invenção hoje seja a base para uma indústria trilhardária? Sem a invenção de Hedy e do músico George Antheil como seria o mundo hoje? Outras pessoas teriam tido a mesma ideia? E a Segunda Guerra? O que essa tecnologia poderia ter mudado se tivesse sido aceita e aplicada?

É uma pena o livro ser tão curto, eu leria facilmente mais páginas sobre a incrível vida de Hedy. Infelizmente, Marie interrompe o livro no auge da fama de Hedy e não sabemos sobre seus últimos anos (Lamarr morreu em 2000, aos 85 anos). Hedy era uma mulher espetacular e eu gostaria de ter lido mais sobre sua vida. No final, a autora responde a algumas perguntas sobre a obra e escreveu uma nota sobre seu objetivo ao romancear a vida de Lamarr.

O livro é em capa comum com tendência a dar uma deformada pelo manuseio. A tradução foi de Isadora Prospero e está ótima. Encontrei alguns problemas de revisão ao longo da leitura, mas não chegam a atrapalhar.

O fogo não é vermelho nem laranja quando suas chamas estão mais quentes, mas branco.

Página 155

Obra e realidade
Lamarr teria hoje 106 anos. O que ela teria pensado ao ver casas conectadas via Alexa, Siri, Cortana, smartphones, envio de arquivos por bluetooth e redes domésticas conectadas por wifi? Todas essas tecnologias foram baseadas em sua tecnologia de interferência em rádio, criada no auge da guerra para auxiliar nos esforços. Os nazistas bombardeavam navios repletos de inocentes e Hedy, possivelmente com culpa de sobrevivente, teria encontrado uma maneira de colaborar com os Aliados e assim mudar a balança dos conflitos.

Autodidata, mergulhou nos livros para aprender sobre tecnologia e não consigo deixar de pensar: se ela tivesse tido a oportunidade de ir para o ensino superior e ser engenheira, que tipo de tecnologias ela poderia ter desenvolvido? De fato, o mundo não parecia pronto para a chama incandescente de Lamarr.

Marie Benedict

Heather Benedict Terrell é uma romancista e advogada norte-americana que escreve alguns de seus romances como Marie Benedict.

PONTOS POSITIVOS
Vida antes da fama
Pesquisa
Bem escrito
PONTOS NEGATIVOS
Acaba logo!


Título: A única mulher
Título original em inglês: The only woman in the room
Autora: Marie Benedict
Tradutora: Isadora Prospero
Editora: Planeta
Ano: 2020
Páginas:320
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Foi uma ótima leitura. Quem quiser começar a compreender a intensa vida de Hedy Lamarr, pode se jogar nessa leitura. Não é uma biografia completa, afinal é só uma versão romanceada de uma parte de sua vida, mas ainda assim é um ótimo pontapé inicial para entrar na vida de Lamarr. Quatro aliens para o livro e uma forte indicação para você ler também!


Até mais!

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Comentários

  1. Não sabia desse livro até ver um post no Twitter que me trouxe para cá! E me interessei muito pela história. Obrigada pela resenha!

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