Resenha: Mundos apocalípticos, de John Joseph Adams (org.)

Eu sempre falo que considero a ficção científica como sendo um gênero completo pela quantidade de discussões que podemos fazer dentro dela. São tantas as possibilidades que fico com preguicinha de quem acha que FC é só navezinha e ET. Nesta coletânea, John Joseph Adams reuniu contos pós-apocalípticos de alguns dos maiores autores do gênero, flertando com o fantástico e com o horror, mas absurdamente atual.



Parceria Momentum Saga e
editora Planeta


O livro
Com vinte autores consagrados, a coletânea aborda o pós-fim do mundo. Como as pessoas se organizaram depois que tudo aconteceu, o que mudou, como elas vivem. Se você espera um apocalipse zumbi, um buraco-negro engolindo a Terra, invasões alienígenas, então ele não é para você. Aqui temos contos bem pé no chão, ainda que tenha tons fantásticos, eles são muito terrenos, bem explicados, não há eventos extraordinários. É a sobrevivência da raça humana depois dos eventos que levaram à destruição da civilização e quase aniquilação da raça humana.

Resenha: Mundos apocalípticos, de John Joseph Adams (org.)

(...) muitas vezes a ficção científica pós-apocalíptica é uma forma de penitência literária por todos os nossos pecados modernos, reais ou imaginários.

Página 157

Com nomes como Elizabeth Bear, Octavia Butler, Stephen King, Cory Doctorow e Paolo Bacigalupi, o livro é uma ótima maneira de conhecer novos autores com obras mais curtas de ficção sobre um tema que faz sucesso há muito tempo. O organizador, John Joseph, começa o livro com uma introdução, onde fala da primeira obra moderna pós-apocalíptica, que é O último homem, de Mary Shelley. Sim, ela mesma!

Momentos históricos carregados de conflitos costumam gerar muitas obras nesse estilo. Um Cântico para Leibowitz, por exemplo, trata do apocalipse nuclear e como a civilização se reorganizou depois. Não vamos esquecer que o universo de Star Trek também é um mundo pós-apocalíptico, pois a raça humana quase foi destruída depois da Terceira Guerra Mundial e após a chegada dos Vulcanos, a raça humana se pacificou. São inúmeras as possibilidades de discussões que podem ser feitas com um tema desses.

O autor aponta que apenas dois contos foram publicados nos anos 1990 e depois o tema retorna nos anos 2000. É interessante pontuar que para alguns grupos é distopia todo dia. Quanto escritores homens e brancos começam a falar de distopia, é porque ela já engolfou outros grupos há muito tempo. Na coletânea não é diferente. O tema recorrente de todos é algo no estilo "você está colhendo o que plantou", de que nós fomos responsáveis pelo fim do mundo e agora precisamos sobreviver nas ruínas. Interessante apontar a quantidade de grupos nômades que os autores criaram. O mundo pós-apocalíptico é tão ruim que não podemos nos manter assentados em um lugar?

Além de indicar a tendência de voltarmos ao nomadismo, há um importante alerta, que é o do embrutecimento. Quando estamos em tempos muito difíceis, acabamos tão acostumados com a barbárie que a aceitamos e a observamos sem nos indignar. É justamente esse embrutecimento que nos torna coniventes com as injustiças, com as opressões e com a violência. Ficar em cima do muro também é se embrutecer.

Meus contos favoritos são "Sons da Fala", de Octavia Buttler, em num futuro próximo onde a sociedade se deteriorou por causa de uma doença que extingue a capacidade de falar do ser humano. E "O Povo da Areia e da Escória", de Paolo Bacigalupi, é um conto onde a tecnologia transformou tanto a humanidade que começamos a nos questionar se os protagonistas ainda são seres humanos. O conto Jack McDevitt, "Jamais se desespere", também foi uma grata surpresa, pois eu nunca tinha lido nada do outro, e fala de uma mulher que deixa sua cidade natal em busca de um lugar histórico que guarda os segredos dos Construtores das Estradas.

Os contos possuem tamanhos variados, uns mais longos do que outros. Há contos mais violentos e com objetificação feminina, cenários mais opressores, mas é um livro que se pode aplicar em sala de aula, em especial no ensino médio. O livro está em capa dura, bem diagramado e com poucos problemas de revisão ou tradução, nada que atrapalhe a leitura. A tradução ficou na mão de Rogério Galindo e Rosiane Correia de Freitas. O preço, por sua vez, pode ser um impeditivo para muita gente.


Ficção e realidade
O fim do mundo na ficção científica pode se dar de várias maneiras. Guerra nuclear, mudanças climáticas, meteoro, guerra ou desastre biológico, mas o foco é a forma como as pessoas vão se organizar e sobreviver. A humanidade tem a capacidade de se adaptar ao meio e tem instinto de sobrevivência, mas se a produção de ficção científica pós-apocalíptica tem nos mostrado uma coisa é que podemos ser extremamente resistentes, porém cruéis uns com os outros. Acredito que livros assim são ensinamentos e realidades alternativas, que nos dão uma ótima oportunidade de pensar E SE? O que eu faria? O que você faria?

John Joseph Adams

John Joseph Adams é um editor, crítico e editor de ficção científica e fantasia norte-americano. Organizou diversas coletâneas de ficção científica.


Pontos positivos
Pós-apocalipse
Capa dura
Bem escrito
Pontos negativos

Violência
Preço

Título: Mundos apocalípticos
Título original em inglês: Columbine
Organizador: John Joseph Adams
Tradutores: Rogério Galindo e Rosiane Correia de Freitas
Editora: Planeta (selo Minotauro)
Ano: 2019
Páginas: 496
Onde comprar: na Amazon!


Avaliação do MS?
A coletânea consegue cumprir com duas missões. A primeira é a de apresentar ótimos contos sobre mundos pós-apocalípticos e como as pessoas se adaptaram a estes mundos. Esse exercício de reflexão é que costuma nos atrair a esse tipo de livro. E a segunda é apresentar autoras e autores que não foram publicados aqui ainda ou sair do lugar comum de autores consagrados, como Stephen King. Uma ótima coletânea! Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!



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