Resenha: O Portão do Obelisco, de N.K. Jemisin

NK Jemisin é a primeira pessoa na história do Hugo Awards (tido como a maior honraria em Ficção Científica & Fantasia) a receber uma estatueta para cada livro da trilogia da Terra Partida. O Portão do Obelisco é o segundo volume desta premiada saga, seguindo o primeiro livro, A Quinta Estação. Este é o mundo do continente da Quietude que, além das quatro estações que todos conhecemos, possui mais uma: o apocalipse.


Parceria Momentum Saga e Editora Morro Branco


O livro

O pensamento era simples e previsível: é melhor morrer do que viver como escravo.

Página 137

Não são todo os autores que conseguem fazer com que o segundo volume de uma trilogia seja tão impactante quanto as obras que começam e fecham a saga. Mas NK consegue. Ela criou um segundo livro bombástico e ainda mais forte nas críticas e discussões feitas pelo olhar de sua protagonista, Essun. Começamos a jornada aqui imediatamente depois do fim do primeiro livro. Os capítulos se alternam agora entre Essun e sua filha perdida, Nessun.

Resenha: O Portão do Obelisco, de NK Jemisin

Vemos aqui com mais detalhes o que levou Jija, marido de Essun, a matar espancado o filho Uche ao descobrir que os filhos são orogenes e o que houve com Nassun, que sumiu no primeiro livro e que coloca Essun na estrada. Os orogenes (de orogenia, processo de formação de montanhas) são pessoas capazes de manipular rochas e a própria crosta, podendo desviar terremotos, liberar pressão e mover rochas. Porém, a população em geral, os chamados "quietos", tem um medo profundo dos orogenes, que são chamados pelo pejorativo nome de roggas, um neologismo criado pela autora a partir da palavra "nigger", termo pejorativo usado para ofender pessoas negras.

Acompanhar a jornada de Essun e Nassun é ver o efeito abrasador do racismo na sociedade da Quietude. São diversos os momentos em que as duas, separadas por vários quilômetros, sentem o preconceito das pessoas, não são definidas como humanos e seus corpos são vistos como descartáveis, podendo ser mortos das piores maneiras possíveis, até mesmo por seus parentes. Existem partes de documentos finalizando vários capítulos que explicitam o preconceito e como os roggas precisam ser controlados.

Decidimos, portanto, que, embora eles se assemelhem a nós de linhagem boa e saudável e, embora devem ser conduzidos com gentileza para o benefício tanto de acorrentados como de pessoas livres, deve-se partir do pressuposto de que qualquer grau de habilidade orogênica nega seu correspondente estado de ser humano. Eles devem ser legitimamente tidos e havidos como uma espécie inferior e dependente.

Página 320

Enquanto acompanhamos Essun e Nassun, encontramos novos personagens, alguns do livro anterior também retornam, ainda que em nova forma e muitas revelações são feitas. É este o grande mérito da obra, a de trazer aspectos novos e revigorantes para a saga, expandindo a mitologia e o universo, tornando a obra essencial. Ficamos sabendo para que servem os obeliscos, o que é o tal do portão do obelisco e que esta catastrófica estação que começou no primeiro livro pode ter um fim. NK mergulha na geologia e na magia neste livro, o que torna essa saga um sonho de consumo para os fãs de FC & Fantasia. Geólogos vão gostar bastante também!

Essun é ainda o grande destaque da obra. Uma mulher sofrida, alguém que já perdeu coisas demais nessa vida, extremamente poderosa e que sabe disso. Estando na comu de Castrima, ela tenta se habituar com essa sensação de pertencer a algum lugar, de conviver com quietos mesmo que eles saibam que ela é uma orogene, de se perdoar por atos do passado. Existe uma análise interpessoal das personagens muito maior do que no livro anterior. Até achei Nassun madura demais para alguém com apenas 11 anos de idade, no entanto acredito que foi proposital: um reflexo da criação dela por Essun, que foi bem rígida, e a jornada da garota depois que o pai a leva embora numa tentativa de "curar" a filha da orogenia.

A edição da Morro Branco segue a capa das edições gringas, como o primeiro livro. Está bem diagramada e revisada; não encontrei grandes problemas de digitação ou tradução, que foi de Aline Storto Pereira, também tradutora de A Quinta Estação. O livro tem também apêndices explicando alguns termos usados ao longo da narrativa para você tirar a dúvida quando for necessário.


Obra e realidade
Uma das discussões brilhantemente levantadas por NK no livro é o tratamento desprendido às minorias pela sociedade vigente. Os roggas são destratados, rechaçados, mortos e vivem sob um rígido controle do Fulcro e dos Guardiões. As pessoas acreditam em todo tipo de bobagem a respeito dos roggas, exatamente como nossa sociedade faz com os negros, com uma pseudociência racista que serviu de justificativa para um racismo institucional e escravidão.

Também discute a questão de como esse preconceito é parte do completo desconhecimento das pessoas. Como elas matam os orogenes, eles não os conhecem, não os veem como humanos, não veem que são muito parecidos e que o preconceito é baseado em mitos. Castrima mostra para a própria Essun que essa convivência pode ocorrer se os quietos deixarem o preconceito de lado.

N.K. Jemisin

NK Jemisin mora no Brooklyn, é psicóloga e conselheira educacional de formação e hoje é escritora em tempo integral. Foi resenhista do The New York Times por três anos e é também autora da Trilogia Inheritance, inédita no Brasil, além de vários contos. Mora com seu gato, Ozzy.


Pontos positivos
Essun e Nassun
Personagens bem escritos
Ciências da Terra
Pontos negativos

Final em aberto

Título: O Portão do Obelisco
Título original em inglês: The Obelisk Gate
Série Terra Partida:
1. A Quinta Estação
2. O Portão do Obelisco
3. O Céu de Pedra
Autora: Nora K. Jemisin
Tradutor: Aline Storto Pereira
Editora: Morro Branco
Ano: 2018
Páginas: 528
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Esse foi mais um livro que eu tentei postergar a leitura o máximo que deu para que ele não acabasse. Com um jeito brilhante de escrever e nos dar informações, quem lê tem que ter a delicadeza de não deixar os dados para trás, pois a forma como NK nos fornecesse é muito sutil. Mal posso esperar pela conclusão da trilogia e por saber o que acontece com Essun e Nassun. Cinco aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também.


Até mais!

É surpreendente como a sensação é revigorante. Ser julgada pelo o que você faz, não pelo o que é.

Página 163

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