Resenha: Ascensão, de Nicholas Binge

A sinopse desse livro me chamou a atenção logo de cara, assim que a Morro Branco anunciou seu lançamento. Uma montanha misteriosa coberta de neve apareceu no Oceano Pacífico. Ninguém sabe quando, muito menos como. É por isso que uma equipe internacional e multidisciplinar é enviada para investigar e quem sabe aprender alguma coisa no processo. Seja sobre si mesmos, seja sobre a própria montanha.

O livro
Harold Tunmore, o protagonista, é um físico, mas originalmente é médico de formação. Ele desapareceu do radar da família lá pelos anos 1990 e por décadas seu irmão não teve notícias dele. Todos acreditavam que ele estava morto. Mas então um dia seu irmão descobre que Harold está vivo, velho e internado em um hospital psiquiátrico. Junto dele, várias cartas destinadas à sua sobrinha, que contam o que lhe aconteceu e como ele foi parar naquele lugar.

Resenha: Ascensão, de Nicholas Binge

Porque é isso o que é a vida. Uma escalada constante. Crescimento eterno. A contínua batalha contra a entropia. Não importa qual seja o destino ou o que esteja no topo; tudo o que importa é que você continue subindo.

Escrito de forma epistolar, semelhante ao que vimos no começo de Frankenstein, de Mary Shelley, Harold começa sua narrativa falando de fé e de como se sentia estranho, diferente das outras pessoas, até do irmão. A medicina era uma forma de encontrar respostas para suas dúvidas, mas ele acaba se voltando para a física após anos trabalhando como médico. Percebemos por esse começo que ele sofreu algum tipo de trauma na vida, mas que só será elucidado mais para frente, quando ele toma coragem de contar na carta o que aconteceu e qual a relação com a montanha.

Um dia ele é abordado com um homem que se chama de Vigia. Ele está recrutando Harold por sua experiência e conhecimento científicos para subir uma montanha misteriosa que apareceu no meio do Pacífico (a localização exata não é fornecida). Junto dele, vão um geólogo e um biólogo, o que faz sentido caso queiram estudar a origem dessa formação misteriosa e suas formas de vida, caso elas existam.

O que Harold percebe logo de cara é que, quanto mais eles sobem a montanha, mais o tempo se move de forma diferente. Minutos parecem horas, horas parecem dias, eventos parecem acontecer ao contrário e pessoas podem parecer jovens e velhas ao mesmo tempo. O frio é cortante conforme a altitude aumenta e os alpinistas começam a sentir membros dormentes, enquanto pensam em seus motivos para subir, em suas vidas antes da montanha. Aquelas vidas existiram mesmo? Eles estariam alucinando? Com o medo dos eventos misteriosos que estão sentindo, chega também a paranoia. Logo, ninguém mais é confiável.

O livro é descrito uma ficção científica, mas achei que ela pesa mais para o horror cósmico do que qualquer outra coisa. Na verdade, senti que o autor tentou atirar para todas as direções ao escrever o livro e na última hora decidiu deixar como estava. Se ele tivesse se concentrado apenas em um gênero, talvez o resultado tivesse saído melhor, mais amarrado. Tudo pareceu meio frouxo aqui. Desde as resoluções para os dilemas encontrados pela equipe até a própria existência da montanha, que é uma personagem importante.

A narrativa corre de uma maneira alucinante. Você quer chegar ao final, você precisa saber... Mas acaba com poucas respostas satisfatórias para todas as perguntas levantadas pelo autor. Toda a discussão sobre Harold, sua família, a tragédia que abala sua vida, sua luta para chegar ao topo da montanha e assim, quem sabe, ter respostas, está bem escrita. Ainda que o protagonista pareça tão frio quanto a montanha, eu me compadeci dele e de suas lutas pessoais. Mas achei que ele aceitou muito bem as contradições daquele lugar. Em nenhum momento ele para e analisa como sua situação é absurda. Na verdade, ele só pensa como cientista lá pelo meio do livro, deixando boa parte da leitura para seus dilemas pessoais e a saudade que sente da família.

E de novo, nada contra os dilemas, os problemas pessoais, os traumas, mas é que o personagem me pareceu falho. O livro promete muito e entrega pouco. Então quem quiser ter mais respostas para as perguntas que a trama faz, pode acabar se decepcionando. Cheguei ao livro assim, decepcionada, cansada, porque foi uma montanha-russa emocional, para no fim a viagem parar do nada. Acredito também que o formato epistolar não foi bem aproveitado aqui. Todo mundo em volta parece estar perdendo o juízo, então por que Harold parece tão são e calmo nas cartas para a sobrinha?

A tradução ficou na mão de Marcia Men e está ótima. Não encontrei grandes problemas de revisão ou diagramação nele.

Geólogos vitorianos chamavam as montanhas de "os grandes livros de rocha"; elas são arquivos do nosso planeta.

Obra e realidade
Diz a lenda que quando o chefe da tribo Cheyenne, Antílope Branco, estava morrendo no Massacre de Sand Creek, em 1864, ele cantou:

Nada vive muito tempo. Só a terra e as montanhas.

As montanhas sempre exerceram fascínio nos povos antigos. Algumas são centrais para algumas religiões e costumam ser cercadas de lendas. O pico das montanhas costuma ser o aspecto mais simbólico, pois é lá que estamos mais perto do céu e de outros reinos ou dimensões. Do Monte Meru para o hinduísmo, até o Monte Olimpo para a mitologia grega, em vários mitos e lendas, elas aparecem como locais de eventos sagrados ou são puramente míticas, como o Hara Berezaiti no zoroastrismo.

Montanhas são o antigo testemunho dos continentes perdidos. Resultado de dobramentos da crosta, vulcanismo e de choques de placas, elas viram todo tipo de mudança ambiental, climática e biológica e guardam em suas muitas camadas as respostas para decifrar o passado e até mesmo para indicar tempos futuros. Sinto que essa aura mítica das montanhas faltou no livro de Binge.

Nicholas Binge

Nicholas Binge é um escritor britânico de ficção científica.

PONTOS POSITIVOS
A montanha
Bem escrito
Cartas
PONTOS NEGATIVOS
Personagens rasos
A montanha
Final sem respostas

Título: Ascensão
Título original: Ascension
Autor: Nicholas Binge
Tradutora: Marcia Men
Editora: Morro Branco
Ano: 2025
Páginas: 336
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Este é um livro estranho... Ele deixa aquela sensação de que algo interessante demais ficou de fora da narrativa. Meio estudo de caso, meio diário, meio cartas pessoais, queria que o livro tivesse me agradado mais, ainda mais com um tema tão interessante. Três aliens para Ascensão.


Até mais! 🗻

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