Resenha: Cidade de Jade, de Fonda Lee

Desde que esse livro saiu lá na gringa que seu enredo me chamou a atenção, então logo que foi publicado aqui, eu tinha grandes expectativas. Em um mundo contemporâneo bem familiar, inspirando em países do sudeste asiático, mafiosos desfilam pelas ruas portando suas armas e suas pedras de jade.

O livro
Kekon é uma ilha imaginária e o único lugar no mundo onde é possível encontrar jade. Mas essa não é uma jade comum, é um mineral mágico, que concede capacidades sobre-humanas a uma pequena parcela da população compatível com ela. A ilha é dividida e controlada por famílias poderosas, como os Kaul e os Ayt. Aqueles que são sensíveis a jade são chamados de Ossos Verdes e brigam pelas ruas pelo controle de bairros inteiros. É um sistema bem parecido com O Poderoso Chefão.

Resenha: Cidade de Jade, de Fonda Lee

Ouro e jade nunca devem se misturar (...).

Kekon não sofreu com interferências externas devido às habilidades dos Ossos Verdes. Mas nada impede uma guerra interna entre as famílias que lutam pelo controle da capital, Janloon. Enquanto isso, ladrões tentam se apoderar de jades alheias, já que a pessoa deve merecer suas pedras em combate. Logo, o perigo ronda cada esquina, onde os soldados de cada lado se digladiam.

Conhecemos Janloon pela perspectiva dos Kaul, principalmente, ainda que volta e meia tenhamos a visão de um ladrão que terá uma função bem importante lá para frente da leitura. Kaul Hilo é o braço direito do pilar, seu irmão Lan, que assumiu a liderança do clã depois que a saúde do avô se deteriorou. Enquanto Lan é calmo, mais introspectivo, Hilo é impulsivo e dado a explosões repentinas de raiva. Junto de seus homens, ele mantém a ordem pelas ruas, enquanto tenta lidar com os problemas da família.

Do outro clã, o Ayt, temos poucas informações sobre ele, pois toda a ação é centrada na jornada da família Kaul. Existem vários personagens no enredo, tanto que às vezes é possível confundi-los. Senti falta de um glossário, pois a autora joga várias informações de uma vez sobre um lugar fictício e a gente que se vire para entender tudo com o bonde andando. Ainda que esta seja uma ilha inventada, é possível identificar as inspirações da autora como o Vietnã, Camboja, China e Japão e a complicada história da região.

A situação entre os dois clãs está mais ou menos calma, até que uma droga nova surge na área. O perigo dela: qualquer pessoa, até os estrangeiros, poderá usar jade. Isso é um perigo para os Ossos Verdes, mas a autora acalma não destacando isso ao longo da leitura. Só ficamos sabendo dela e a disputa por sua produção e pouco se fala de seus riscos. O sistema de extração de jade também não é bem explicado e gostaria de saber mais sobre essa magia poderosa.

Sendo uma fantasia urbana, temos telefones, aviões, carros, num cenário que lembra muito os anos 1980. E a presença da máfia nos remete ao cenário e até aos figurinos de O Poderoso Chefão, a diferença é que não se passa nos Estados Unidos, nem na Itália. Mas uma coisa que me incomodou ao longo da leitura foi a representação feminina. Até nisso a autora usou as histórias da máfia como exemplo, onde as mulheres são todas dependentes dos personagens masculinos e têm pouco poder. São irmãs, namoradas, mães e é isso aí.

Não é um livro ruim. Gostei muito de toda a construção da ilha e de Janloon, de seus personagens secundários, da jade mágica, ainda que não tenhamos muitas explicações sobre elas, mas a autora perde tempo com algumas coisas quando poderia aumentar nosso conhecimento sobre seu universo. Com tradução de João Pedroso, a revisão tem alguns problemas, que não chegam a afetar a leitura, mas que incomodam quando se repetem.

— Expectativa é uma coisa engraçada (...) Quando a gente nasce com elas, criamos rancor e lutamos para ir pelo caminho contrário. Já quando ninguém espera nada da gente, passamos a vida inteira sentindo a falta que uma perspectiva faz.

Obra e realidade
A autora contou no Twitter que algumas vezes vê questionamentos dos leitores que a incomodam. Um deles, por exemplo, é sobre o machismo que o livro tem e que se as pessoas reclamam da existência dele no livro é porque não sabem como é o mundo. Justamente por saber como é o mundo que eu gostaria de ter visto mulheres melhor representadas em Kekon. Todos os grandes e fortes personagens são homens, enquanto as mulheres estão em posições muito específicas, como mãe, noiva, irmã. A única mulher de relevância, a líder da família Ayt, mal aparece.

A ficção especulativa nos leva para fora da realidade e em um universo onde gemas de jade podem dar poderes sobre-humanos a quem as usa, ver mulheres nas mesmas posições subalternas que vemos no nosso mundo foi decepcionante.

Fonda Lee

Fonda Lee é uma escritora canadense-americana de ficção especulativa.

PONTOS POSITIVOS
Jade
Famílias mafiosas

PONTOS NEGATIVOS
Representação feminina
Violência
Final em aberto


Título: Cidade de Jade
Título original: Jade City
A Saga dos Ossos Verdes
0,5. The Jade Setter of Janloon
1. Cidade de Jade
2. Guerra de Jade
Autora: Fonda Lee
Tradutor: João Pedroso
Editora: Alta Novel
Ano de lançamento: 2024
Páginas: 280
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
A leitura me fisgou, ainda que tenha me incomodado em vários momentos. Mas senti que ela poderia ter sido muito mais legal se a autora fosse mais ousada e tivesse criado um universo que se distanciasse mais da realidade. Se você curte máfia e fantasia urbana, com certeza vai gostar. Três aliens para Cidade de Jade.


Até mais!

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