Os norte-americanos têm uma longa lista de assassinos em série. E Ed Gein é praticamente um arquétipo de muito do que seria visto na ficção neste quesito. Inspirando obras como Psicose, O Massacre da Serra Elétrica e O Silêncio dos Inocentes, Ed Gein foi um sujeito real que acabou ganhando contornos de mito conforme o tempo passava. Mas não só ele foi real como foi bastante perverso em seus crimes. Não recomendo essa leitura para menores de 16 anos.
O quadrinho
A abertura avisa logo de cara: esta é uma história real. Mas ela começa antes de Ed Gein nascer. Começa com sua religiosa (e fanática) mãe de joelhos, pedindo a Deus por uma filha para acabar com sua solidão. Mãe de um menino, Henry, Augusta abominava o sexo e via pecado em absolutamente tudo. Quando suas preces não foram atendidas, ela mergulha ainda mais na religião, tornando-se cada vez mais obcecada em julgar as pessoas e a abominar a imoralidade. Edward Theodore Gein nasceu em 27 de agosto de 1906.
O pai de Ed, George, era um bêbado, que não parava em nenhum emprego, causando mais vergonha do ponto de vista de Augusta. Ela abominava a forma como ele mergulhava na bebida e acreditava que todas as mulheres, exceto ela, eram naturalmente promíscuas e instrumentos do diabo. Os meninos eram obrigados a se devotar inteiramente a ela e não eram incentivados a ter amizades. Augusta reservava um momento todos os dias para ler a Bíblia para eles, principalmente partes do Velho Testamente e do Livro das Revelações, falando sobre morte e a retribuição divina.
Querendo fugir da "imoralidade" da cidade, a família Gein foi viver em isolamento em uma fazenda de 63 hectares em Plainfield, no Wisconsin, o que contribuiu ainda mais para a alienação dos meninos. Ed só saía da fazenda para ir à escola e mesmo sendo um pouco esquisito, era bom aluno. Qualquer tentativa deles em fazer amizades, em se divertir, era punida severamente por Augusta. Ed acabou influenciado a pensar nas mulheres da mesma maneira, com desprezo, o que acaba explicando boa parte do que ele faz em seguida...
Quem é fã de true crime vai encontrar um quadrinho bastante preciso em suas observações e quando não é os autores são honestos a respeito como quando precisaram entrar com a ficção a fim de justificar suas próprias percepções. Mas a obra em si é baseada quase que inteiramente em fontes primárias como relatos dos jornais de Wisconsin na época, documentos forenses e relatórios psiquiátricos. Personagens da infância de Gein foram recriados com base em seus depoimentos.
Repito que não indico este quadrinho para menores de 16 anos, nem para pessoas sensíveis. Gein assassinou e desmembrou mulheres, arrombou túmulos e roubou cadáveres para confeccionar máscaras com suas peles, enfeites com seus membros e utensílios de cozinha com seus ossos. Os autores tiveram cuidado de não serem explícitos demais, mas também não pouparam algumas cenas para mostrar a crueldade de Gein, tido como inofensivo pelos vizinhos, que o contratavam para trabalhos esporádicos.
Além da biografia da família Gein, temos excertos de vários momentos diferentes da história como Alfred Hitchcock falando sobre a história que teria inspirado Psicose ou a imprensa insaciável por um furo, além das reações daqueles que de fato conheceram Ed Gein e ainda estavam processando a informação sobre o que ele fazia com os corpos das mulheres em sua casa. Muitos boatos corriam aumentando a sensação de insegurança de uma cidade pacata que acabou marcada pela brutalidade.
O traço e as expressões vívidas dos personagens conseguem passar toda a angústia, o medo, o desespero, o fanatismo dos personagens. Há cenas perturbadoras dos policiais descobrindo o cenário macabro dentro da casa de Gein e como eles começam a ligar os pontos sobre os desaparecimentos estranhos de mulheres de meia idade com um perfil muito parecido com de Augusta Gein. Há questionamentos de policiais e psiquiatras sobre o que levou Gein a fazer o que fez e sobre os trâmites legais que quase o colocaram na rua novamente.
Todo em preto e branco, a obra vai agradar até o fã mais exigente de true crime. É difícil dizer que este é um ótimo quadrinho devido ao tema, mas a abordagem e a arte são de fato muito boas. Em capa dura e papel encorpado, ele conta com aquele capricho demoníaco da DarkSide Books. Quem comprar pelo site da editora ainda ganha brindes exclusivos. A tradução de Carlos Rutz está ótima e o quadrinho não tem problemas de tradução ou de revisão.
Obra e realidade
O quadrinho segue bem de perto os eventos da vida de Gein que levaram até sua prisão. Os autores são sinceros quando precisaram criar algo para fins de narrativa, mas que não atrapalham nem floreiam os fatos verdadeiros. Há menção de um possível abuso sexual que Gein teria sofrido quando criança, algo que talvez tenha deixado marcas profundas demais para que ele pudesse lidar.Mas o fascínio que assassinos em série causam nas pessoas é o que mais me incomoda. Pessoalmente gosto de ler true crime não pelos detalhes sangrentos, mas na esperança de tentar entender o que os leva a fazer isso. Porém, algumas pessoas se inspiram tanto nessas pessoas abomináveis, que chegam a usar bijuterias com o rosto de serial killers e até criam bandas com seus nomes.
Harold Schechter é um escritor americano de crimes reais especializado em assassinos em série. É o autor de Serial Killers: Anatomia do Mal, lançado também pela DarkSide Books.
Eric Powell é um escritor e ilustrador norte-americano de histórias em quadrinhos.
PONTOS POSITIVOS
Traço
Bem escrito
Projeto gráfico
PONTOS NEGATIVOS
Pode ser perturbador
Traço
Bem escrito
Projeto gráfico
PONTOS NEGATIVOS
Pode ser perturbador
Avaliação do MS?
Não é fácil dar nota para uma obra que fala de um serial killer. Pode dar a impressão de que estou endossando seus crimes. Mas o quadrinho foi criado com esmero, tanto no texto quanto na arte, que é primorosa, perturbadora e muito vívida. Os fãs de true crime podem esperar um quadrinho que abrange com bastante exatidão a história de Ed Gein, de sua criação, ao julgamento, ao imaginário popular. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!
Até mais!
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