Resenha: Em Águas Profundas, de Patricia Highsmith

Não sabia o que esperar dessa leitura. Conhecia o nome da autora e apenas isso. Esse foi o primeiro livro de Patricia Highsmith que li e certamente lerei mais de suas obras. Foi uma leitura intensa, onde eu não conseguia parar de virar as páginas. A escrita da autora é tão boa que você se pega, em vários momentos, simpatizando com o vilão!

Este livro foi uma cortesia da editora Intrínseca

O livro
Vic e Melinda são casados, têm uma filha e parecem ser um casal normal. Apenas parecem. Longe de serem felizes, os dois têm um arranjo um tanto incomum e que alguns amigos do casal não compreendem: Melinda têm relacionamentos com outros homens sem que Vic se importe. A única coisa que não pode acontecer é um divórcio que será desgastante para todos. Vic praticamente cria a filha sozinho, já que Melinda não se importa com a criança, apenas com seus amantes, um mais idiota do que o outro.

Resenha: Em Águas Profundas, de Patricia Highsmith

Percebemos na leitura que o arranjo do casal é apenas válido para Melinda. Vic não se importa em ter ou não intimidades com a esposa, nem com mais ninguém. Vic vive para seus livros, seu trabalho em uma pequena gráfica, seus experimentos na garagem e para observar os casos de Melinda. Aliás foi bem enervante acompanhar esse casal. Os dois podem ser hipócritas e fingidos, irritantes e superficiais, mas a escrita de Patricia é tão boa que você não consegue parar de virar as páginas.

É quando Vic começa a se irritar com os novos casos de Melinda que uma situação inusitada surge. Um conhecido do casal, que teve um caso com Melinda, foi morto em Nova York e o caso está sem solução. Vic então comenta com um dos novos casos da esposa que ele foi o responsável, assustando o rapaz. O problema é que o boato se espalha pela cidade pequena e algumas pessoas começam a ficar nervosas, imaginando que seja verdade. Essa fofoca boba acaba desencadeando ações da parte de Vic e Melinda que se tornarão cada vez mais extremas.

Na vida, havia muitos momentos em que a lógica não trazia conforto algum.

Página 90

Acontece que muita gente na pequena cidade de Little Wesley está do lado de Vic. Ele é visto pelos amigos como um coitado, um grande incompreendido que tenta de tudo para proteger a família e conquistar a esposa, que o destrata levando homens para casa. E é claro que eles não acreditam que Vic possa ter matado ninguém. Quer dizer, não foi ele né? Não pode ter sido, é loucura. Esse comportamento de negação é recorrente na maioria dos amigos, que nunca tiveram motivo para crer que Vic pudesse ser violento.

Mas essa mentirinha não pode mais ser contida, pois agora o casal ficará no centro de um turbilhão de ações que serão desconcertantes. Sério, uma vez que Vic colocou essa bola para rolar, você não quer mais largar a leitura. A construção de toda essa situação é perfeita. Há momentos em que você se pega racionalizando o impensável, se pega aceitando o inaceitável devido aos pensamentos de Vic e pela forma como ele analisa as situações. Dá nos nervos! Mas é um sinal de como a escrita de Patricia prende e distorce as coisas, te fazendo pensar dessa forma.

Alguns talvez pensem que a autora glamoriza a violência, mas a autora apenas informa e trabalha com ela dando forma ao enredo. O livro é basicamente sobre as coisas que fazemos sob pressão e como estamos dispostos a cruzar uma linha que nunca pensamos ser possível cruzar. Por mais que a gente diga "nossa, hoje eu mato um!", a grande maioria de nós possui um freio moral que impede de fazer tal coisa. Será? Será que em uma situação de pressão, onde você nada tem a perder, apenas a ganhar, será que não cometeria o impensável? É essa a dúvida terrível com a qual você se debate ao longo das páginas.

A edição da Intrínseca está lindíssima. Este livro ficou por décadas fora de catálogo e voltou agora em grande estilo, em capa dura e papel amarelinho, com uma fitinha marca página para você não se perder na leitura. A tradução de Roberto Muggiati está ótima e não encontrei problema de revisão ou diagramação no livro.

(...) ninguém no planeta poderia provar que ele matara Malcolm McRae, mas também ninguém poderia provar que ele não matara.

Página 61

Obra e realidade
Pensando na situação de Vic e Melinda, acho que tudo poderia ter sido resolvido com um divórcio ou com uma relação aberta onde os dois concordassem com os termos. Ninguém se machucaria se eles tivessem aberto o jogo um com o outro. Isso no mundo ideal, né? No mundo imperfeito onde nós vivemos, as pessoas são sacanas, são cretinas, não se importam com os sentimentos dos outros e machucam de verdade. O livro também é sobre como as pessoas mudam ao longo do tempo, tolerando ou não mais tolerando certas coisas. Vic e Melinda eram pessoas diferentes quando se conheceram e ficamos nos perguntando como podem ter chegado naquele ponto.

Patricia Highsmith

Patricia Highsmith foi uma escritora norte-americana famosa por seus thrillers criminais psicológicos. Iniciou a carreira na década de 1940, escrevendo roteiros para histórias quadrinhos para editora Nedor, sobretudo as do super-herói Black Terror.

PONTOS POSITIVOS
Personagens bem construídos
Bem escrito
Thriller psicológico
PONTOS NEGATIVOS
Violência
Pode ser meio lento

Título: Em Águas Profundas
Título original em inglês: Deep Water
Autora: Patricia Highsmith
Tradutor: Roberto Muggiati
Editora: Intrínseca
Páginas: 304
Ano de lançamento: 2020
Onde comprar: na Amazon!
Avaliação do MS?
Para quem pegou o livro sem nenhuma pretensão, foi uma grata surpresa ser fisgada da forma que fui. Não conseguia parar de ler, completamente perdida nas elucubrações da cabeça de Vic e na forma de racionalizar as situações dos personagens. Se você curte thrillers psicológicos, não pode deixar esse livro passar. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!



Até mais!

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Comentários

  1. Essa edição está lindíssima mesmo! E fiquei feliz de saber que a história é boa também. Depois de ler a resenha, tô super curiosa pra ler e ver onde essa loucura toda vai dar.

    Acho engraçada essa categoria de livro em que, se houvesse um simples diálogo, a história não existiria, hahaha. Mas seres humanos são complicados, né?

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