Quando a gente estuda eventos históricos é natural não termos uma visão muito ampla do que aconteceu além daquilo que foi registrado. Porém, é comum também nos depararmos com os mitos e boatos criados na época e utilizados para os mais diversos fins. Os vencedores costumam aumentar seus feitos nesse período e acabam perpetuando informações erradas como verdade. Este livro mostra que muito do que se ensina e ainda se acredita sobre a Segunda Guerra Mundial está incorreto.
O livro
A propaganda de guerra não é algo recente. No famoso tratado entre Ramsés II e o rei hitita, os egípcios cantaram a bola como se tivessem ganhado a guerra e derrotado de maneira avassaladora o império hitita. Na verdade foi um tipo de armistício. É natural que cada lado coloque um monte de floreios sobre seus feitos para engrandecê-los e passar uma imagem vitoriosa. É óbvio que em um dos maiores conflitos da humanidade os floreios apareceriam. A questão é que esse floreios se estabeleceram como verdade.Às vezes leva décadas para um fato científico se tornar algo de conhecimento geral. A tectônica de placas, aves como dinossauros modernos, as extinções em massa, tudo isso levou muito tempo para ser consenso. Existe sempre um hiato entre o postulado científico, sua aceitação entre os pares e a chegada ao grande público. E quando essa ciência é parte das Humanidades, aí a coisa piora consideravelmente, já que para muitos as Ciências Humanas não são ciência.
No caso da história, cada vez mais castigada por revisionismos estapafúrdios, como ~nazismo ser de esquerda~, os fatos levam um tempo ou nunca chegam a ser assimilados pelo público. A Segunda Guerra Mundial foi brutal, tanto em perdas de vidas quanto em perdas materiais, mas a propaganda de guerra foi ainda mais efetiva. Não faz muito tempo, assisti a uma série de documentários na Netflix sobre a Segunda Guerra e, sem surpresa alguma, vários dos mitos derrubados no livro estavam nos episódios.
Como o fato de o bombardeio a Hiroshima ter sido a causa da rendição do Japão. Ainda que tenha sido um golpe duro na moral japonesa, a invasão soviética da Manchúria, três dias após Hiroshima e algumas horas de Nagasaki, foi a verdadeira gota d'água. Considerada a maior ofensiva da Segunda Guerra, a invasão obrigou o Japão a assinar uma rendição e ainda por cima mudar a imagem pública do imperador.
Para salvar o trono, é preciso reinventar seu ocupante. Hirohito é transformado, ao longo desses poucos dias decisivos, em pacifista benevolente, prisioneiro de um grupelho de extremistas. Após uma hesitação de um dia, Hirohito ordena a Kido Koichi, o Guardão do Selo Imperial e seu conselheiro mais próximo, redigir o decreto que coloca um ponto-final na guerra.
Página 233
Outro mito muito difundido é que a Alemanha perdeu a guerra unicamente por causa das atitudes de Hitler. Ele teve uma imensa responsabilidade no desencadeamento da Segunda Guerra na Europa (que não teria acontecido sem ele) e na queda e derrota do Terceiro Reich, sem dúvida. Entretanto, afirmar que a derrota foi exclusivamente culpa dele é ignorar todos os seus subordinados e fanáticos que tinham poder de decisão. As ações seguem um ritmo relativamente coeso até Stalingrado. Depois disso, a Wehrmacht começa a perceber a incapacidade de vitória - e o fato de o Exército Vermelho não deixá-la vencer.
O livro tem uma linguagem bastante acessível e acredito que até no ensino médio ele poderia ser usado tranquilamente. Os autores dos capítulos - que são curtos e bem escritos - são especialistas de suas áreas. Alguns são inclusive militares e professores de escolas superiores de guerra. A edição da Contexto tem alguns erros de revisão que precisam ser corrigidos para uma próxima edição. A tradução ficou na mão de Patrícia Reuillard e está muito boa. Apenas peço à Contexto que coloque os nomes de seus tradutores junto ao nomes dos autores em suas lojas online.
Obra e realidade
A gente percebe a força do mito quando nota que o que foi desmentido no livro é algo que você aprendeu na escola, até mesmo na faculdade. Na introdução, os organizadores comentam sobre essa dificuldade de historiadores conseguirem com que suas pesquisas cheguem ao público. Se até documentários da toda-poderosa Netflix continuam a perpetuar propaganda de guerra, quanto tempo levará para que o grande público tenha acesso a essas informações?Jean Lopez é historiador e jornalista, fundador e diretor de redação da revista Guerres & Histoire. Ficou conhecido por uma série de obras sobre a frente germânico-soviética, como Koursk. Les quarante jours qui ont ruiné la Wehrmacht e Stalingrad, la bataille au bord du gouffre. Publicou também Les Cent Derniers Jours d’Hitler.
Olivier Wieviorka é professor na École Normale Supérieure [Escola Normal Superior] de Cachan e membro sênior do Institut Universitaire de France [Instituto Universitário da França]. Especialista em Segunda Guerra Mundial, publicou uma Histoire du Débarquement e uma Histoire de la Résistance. É autor do livro O Século de Sangue, publicado pela Contexto.
PONTOS POSITIVOS
Mitos dos dois lados da guerra
Pesquisa
Bem escrito
PONTOS NEGATIVOS
Problemas de revisão
Preço
Mitos dos dois lados da guerra
Pesquisa
Bem escrito
PONTOS NEGATIVOS
Problemas de revisão
Preço
Avaliação do MS?
Foi uma leitura rápida e muito proveitosa. Eu ouvi tantas vezes a maioria dos mitos aqui derrubados que acabei aprendendo muito sobre a máquina de guerra e como ela foi eficiente e continua sendo durante a leitura. Se você também quer descobrir mais sobre esse mitos, se é estudante ou apenas um curioso sobre a Segunda Guerra Mundial, vai aproveitar esse livro. Quatro aliens para ele e uma forte recomendação para você ler também!Até mais!
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