Resenha: Meu Amigo Dahmer, de Derf Backderf

Jeff Dahmer foi um dos mais sádicos assassinos em série da história. Ele matou 17 homens e rapazes, os estuprou, arrancou pele, desossou, comeu partes de seus corpos e chegou a usar a pele como parte da decoração da casa. Mas não é essa a história que Derf quer contar. Ele quer mostrar que antes de virar o monstro assassino que ceifou tantas vidas, houve um ser humano negligenciado pelos adultos ao seu redor e muito sozinho. Meu Amigo Dahmer é a primeira obra do novo selo de graphic novels da editora DarkSide.

Parceria Momentum Saga e editora DarkSide

O quadrinho
Derf Backderf foi colega de escola de Jeffrey Dahmer. Quando a notícia sobre os horripilantes crimes de Dahmer chegou até ele, Derf reparou que todos falavam de Dahmer do ponto de vista do psicopata. Mas ele não surgiu da noite para o dia. Havia toda uma história de vida, uma trajetória por trás dessa figura que poucas pessoas se importavam de conhecer. É aí que entra Derf.

Resenha: Meu Amigo Dahmer, de Derf Backderf

A primeira HQ, de apenas 24 páginas, era uma produção independente, já que o autor não conseguiu vender a ideia para ninguém. Para a mídia, Dahmer era um psicopata depravado, para Derf, era um colega que se sentou ao seu lado no colégio por vários anos, alguém com quem conviveu e conversou. Sua perspectiva era única. Como a primeira edição era curta demais devido aos custos da produção, ele decidiu produzir como tinha primeiro idealizado. Assim, ele passou a se dedicar à pesquisa intensa, falando com ex-colegas, parentes, professores e funcionários da escola na tentativa de trazer à tona detalhes da vida daquele garoto calado e sem amigos que era Dahmer.

Eles moravam em uma região pequena, provinciana e a escola explodia de tantos alunos da era "baby boom". Derf o conheceu na sétima série e já naquela época ele era extremamente solitário, que sofria com o bullying dos colegas. Ninguém reparava em Dahmer a não ser para encher seu saco, bater ou tirar sarro. Jeff morava com os pais e o irmão mais novo e o casal vivia discutindo. Sua mãe era uma pessoa frágil, com problemas psiquiátricos sérios, sofrendo de convulsões. Seu pai era químico e trabalhava em uma das indústrias da região.

O garoto mirrado se tornou um adolescente alto, parrudo, mas que ainda assim nunca reagia aos espancamentos. Imitava alguém em convulsões e arrancava risadas dos colegas, mas na verdade ele imitava as crises da própria mãe. Era também uma época de descobertas, de dúvidas, de medos. E se para um adolescente hetero já é um período complicado, um gay se sentiria extremamente reprimido, com vergonha, temendo ser tratado como um anormal. Dahmer, nessa época, passou a desejar secretamente um corredor que passava diariamente na frente da sua casa. Mas seu desejo era ter controle total sobre a pessoa e para isso teria que ser um cadáver.

O autor se questiona várias vezes durante a graphic novel: onde estavam os adultos que nunca repararam no adolescente estranho e solitário, que passava o dia bêbado? Como que ninguém tinha tempo para ele? Jeff ficava chapado de tanto álcool, na tentativa de cessar os pensamentos perturbadores que tinha. E a situação piorou muito com o divórcio dos pais. A mãe de Jeff resolveu voltar para sua cidade natal, levando o filho menor e deixando o adolescente perturbado e solitário sozinho em casa e com a formatura, começava a caminhada de Dahmer para o abismo.

A edição está muito bem feita e o autor se preocupou em situar cada uma das ocorrências da obra. Há uma parte com fontes, algumas cenas cortadas e uma descrição de cada pessoa envolvida na vida de Dahmer. Derf também teve a sensibilidade de não chocar o leitor com imagens de violência, assassinados ou de Jeff torturando animais. O foco é adolescência, esse período complicado para qualquer pessoa. Se você quer os detalhes sórdidos dos crimes cometidos por Dahmer, a DarkSide tem o livro Serial Killer, Louco ou Cruel?, em que ele figura em um dos capítulos. Capa dura e folhas robustas, com ilustrações em preto e branco.

Obra e realidade
Muita gente pode achar que Derf está tentando se isentar de culpa. Ele admite que, junto dos amigos, se aproximou de Dahmer pelas imitações que ele fazia de ataques epiléticos e da forma estranha de fazer brincadeiras. Ele inclusive virou uma expressão para as bobagens que aprontavam, fazendo "dahmerismos". Mas que culpa pode ter um grupo de adolescentes? Quem está preparado para identificar um potencial serial killer entre um grupo de estudantes? Você está?

Jeffrey tinha o porte e a aparência de um norte-americano médio, loiro, olhos azuis, ombros largos. Era uma pessoa acima de qualquer suspeita para as autoridades. Sem contar que era tido como educado e manipulador, que conseguia vencer as pessoas pela lábia. Era um cidadão tido como comum, fora do estereótipo de criminoso:

Se os policiais de Milwaukee, assim como tantos no mundo inteiro, não fossem tão preconceituosos e rígidos na construção de estereótipos de boas e más pessoas, Dahmer teria sido interrompido em sua sanha criminosa antes de cometer muitos de seus crimes.

Arquivos Serial Killers, de Ilana Casoy, página 164

Derf Backderf

Antes mesmo de qualquer crime cometido, os adultos, pais e responsáveis por toda aquela garotada nunca conseguiram perceber nada de errado em Jeffrey Dahmer, mesmo quando ele ia para a aula fedendo a bebida. Derf faz então um comentário muito pertinente a respeito: a empatia por Dahmer evapora a partir do momento que ele mata sua primeira vítima. O histórico solitário do adolescente não serve como desculpa para suas atrocidades necrófilas, homicidas e canibais.

PONTOS POSITIVOS
História real
Bem escrito e desenhado
Fontes e anotações abundantes
PONTOS NEGATIVOS

História de um serial killer

Título: Meu Amigo Dahmer
Título original em inglês: My Friend Dahmer
Autor: Derf Backderf
Tradutora: Érico Assis
Editora: DarkSide
Páginas: 288
Ano de lançamento: 2017
Onde comprar: na Amazon ou na loja da DarkSide!

Avaliação do MS?
Jeffrey Dahmer foi sentenciado a 15 prisões perpétuas consecutivas, um total de 957 anos de reclusão por 12 assassinatos, apesar do número de vítimas ser maior. Mas pelo trabalho de pesquisa de Derf, pelos relatos aqui reunidos, vemos que ele já estava sentenciado a uma vida infeliz, desregrada, solitária. Fica a questão se ele poderia ter sido desviado de sua estrada sanguinária se alguém tivesse reparado naquele adolescente bêbado e isolado. Isso é algo que ninguém pode responder. Cinco aliens para a graphic novel e uma forte recomendação para você ler também.


Até mais!

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