A palavra é a nossa arma

Estes são tempos estranhos. Tempos onde nazistas não só existem como não têm medo de ir às ruas gritar palavras de ordem e bradar que odeia judeus, negros e gays, inspirando outros grupos a destilar ódio aberto e gratuito. Foi preciso ir para uma guerra mundial e matar quase 60 milhões de pessoas, mas eles ainda se multiplicam por aí, pregando o preconceito. O ódio que não se mantém apenas contra certos grupos, é contra toda e qualquer voz que gritar o contrário a eles. Como escritores, esses são tempos para usar nosso ofício de maneira a não compactuar com esse ódio, de mostrar o outro lado, de enfrentar essas ideias, de não tolerar tais discursos.

A palavra é a nossa arma



Émile Zola disse que os governos suspeitam da literatura porque é uma força que lhes escapa. Não é à toa que governos totalitários exerçam pressão sobre artistas e queimem livros em praças públicas, de tanto medo que livros carregando ideias que desaprovem caiam nas mãos e nas mentes das pessoas. As sátiras de Zamiátin o levaram para a prisão e depois para o exílio. O regime nazista fazia piras com livros que consideravam subversivos.

O ser humano gosta de contar histórias. De pinturas rupestres, a grande paredes decoradas de templos egípcios, dos arabescos intrincados aos mosaicos romanos, códices, pergaminhos, palimpsestos da vida humana, Gutenberg e a prensa, a democratização da palavra escrita, a conversa no bar, os tuítes, as histórias estão sempre por aí. Usadas para tudo, elas podem servir para legitimar guerras, tratados, atrocidades e massacres, bem como para iluminar, engrandecer, inspirar e erguer lutas. A luta dos seres humanos é com as palavras, com as sentenças, com as ideias.

Você não precisa ser um escritor para espalhar a palavra. Pelo bom exemplo, pelo respeito, pelas boas ideias, pelas críticas construtivas, você já inspira alguém. As histórias nos lembram quem somos, quem podemos ser e pelo o que devemos lutar. Contar histórias dá espaço para que grupos tenham sua voz e não tenham mais as narrativas silenciadas. É com as histórias que criticamos o que vemos, que tentamos entender o mundo e tentamos encontrar nosso lugar nele. Contar histórias é imaginar como o mundo pode ser - por bem ou por mal - e como podemos mudá-lo. É sobre deixar alertas, deixar avisos e impressões, deixar um sinal para que as pessoas possam seguir. Aqueles que são oprimidos, calados, castigados, perseguidos, ao se verem nas histórias contadas, quando contam suas próprias histórias, tomam para si o direito de existir, o de direito de ser humano.

Use seus privilégios para algo bom. Use seus privilégios para espalhar boas histórias. Use sua palavra como uma arma contra a opressão e contra o ódio. É o que eu sei, o que posso fazer, então é o que vou fazer. Faça o mesmo. Ao se sentir desamparada, sozinha, sente e escreva. Ou ligue para alguém. Espalhe a palavra, faça da sua história uma arma. Existem diversos papéis que as pessoas podem desempenhar numa guerra. Faça o seu. Não compactue com um sistema opressor, se oponha a ele.

Os nazistas, os racistas, os supremacistas brancos, os evangélicos que se opuseram aos muçulmanos no Rio de Janeiro, as pessoas que defendem o Escola Sem Partido, os homens que estupraram uma indiana em Delhi, aqueles que querem ter o direito de oprimir e ofender em nome do "politicamente incorreto", elas estão contando suas histórias para garantir o direito de continuarem oprimindo. Estão tomando as ruas e falando de um mundo que querem para si, um mundo errado, torto, quebrado. São pessoas que não querem um mundo justo, um mundo mais igual, são aquelas que não querem mudanças. São aquelas que querem ouvir apenas suas próprias vozes. O jeito é berrar mais alto, contar mais histórias, lutar do jeito que sabemos fazer. E contar, contar muitas histórias.

Até mais.♡

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Comentários

  1. Post perfeito! Vivemos em tempos confusos, estranhos, onde mais que nunca se faz necessário espalhar palavras que possam fazer frente a tanta intolerância explícita!

    Marina Carla- Devaneios e Desvarios

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  2. Bravo, Sybylla! Palmas, muitas palmas para esse texto do qual concordo 100%. E humildemente acrescento: nós, professores conscientes, temos o DEVER de bradar e usar palavras e vozes contra o delirante e perigoso projeto Escola Sem Partido.

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  3. O mundo anda tão pesado e cheio de ódio que às vezes, só às vezes, isso me tira o amado impulso de continuar escrevendo. Quando chego a esse extremo minha saída é me isolar um momento, repensar no que me faz feliz, que é a escrita, e daí retomar o trabalho em textos que, como bem disse na postagem, estão aí para combater esse mundo de quem quer ignorância e opressão.

    Texto incrível! Parabéns, Sybylla!

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