Você se apaixonaria por um robô?

Arte de Rudy-Jan Faber
Arte de Rudy-Jan Faber

Pergunta esdrúxula, não é mesmo? Claro que não, imagina! Como se apaixonar por uma máquina?!

Pera lá...



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Deus Sex Machina
Muito tem se discutido ultimamente se seres humanos devem fazer sexo com robôs. Ian Pearson, consultor da companhia britânica Futurizon, prevê que em 2050 os robôs estarão por toda parte, bem no estilo do filme Eu, Robô mesmo. E na esteira disso, robôs voltados para sexo (AI, Inteligência Artificial, oi) também serão comuns.

Por conta disso e de um futuro que (ainda) não chegou (?), já existem movimentos que visam conscientizar a população a respeito do quão errado é fazer sexo com robôs. Campaign Against Sex Robots é uma dessas iniciativas.

A questão envolvendo nossas emoções a respeito de robôs mexe profundamente com empatia. Um estudo da Universidade Stanford, na Califórnia, feito com doze voluntários - seis homens e quatro mulheres - pedia que eles tocassem os robôs em várias partes do corpo, enquanto usavam um sensor de condutividade sob a pele para medir o nível de excitação. Em 26 ensaios, os participantes registraram uma estimulação ao serem requisitados a tocar ou apontar as "partes íntimas" do robô.

Ou seja, mesmo estando na frente de um robô, que não tem consciência nem humanidade, nossas normas sociais de não tocar em determinadas partes dos corpos dos outros se mantiveram com uma máquina. O ser humano não possui um interruptor para desligar a empatia. Nós acabamos transferindo para algo que possa ser nossa imagem e semelhança e um dia, talvez, possa vir a ter consciência.

Girl on The Net, uma blogueira que fala de sexo e relacionamentos, reformulou a pergunta que abre este post: se um robô for programado para ser sensível, amoroso, simpático, falar com você, te ouvir e demonstrar amor por você, como não se apaixonar por ele? Lembre-se, desligar a empatia é complicado.

No entanto, a Dra. Kathleen Richardson, da Campaign Against Sex Robots acha que o desenvolvimento de robôs para sexo causará uma perda de empatia. A campanha tem um viés um tanto conservador, por estipular que o único sexo que seria feito com robôs seria aquele que existe entre homem e mulher, e que ele é comparável com a prostituição, o que desumaniza as prostitutas.

Comparar prostitutas com robôs é bem complicado e perigoso. Quem trabalha com sexo é um ser humano com poder de consentimento, algo que os robôs não possuem, mas que podem igualmente ser objetificados. Vemos na série de TV Humans que as robôs voltadas para sexo são escolhidas, dobradas, usadas e largadas, todas com uma vasta programação para os mais variados tipos de sexo e posições, mas a única robô do estabelecimento, Niska, que tem consciência e humanidade, se nega a satisfazer as fantasias pervertidas de um pedófilo.

Robôs voltados para sexo hoje não possuem a tecnologia avançada que vemos em Humans, AI, Inteligência Artificial ou em Eu, Robô. Eles estão mais parecidos com bonecas infláveis do que robôs. No entanto, não é preciso um robô como Niska para termos empatia por ela, nós já temos empatia por robôs.

Vejamos o caso do rover Curiosity, em operação em Marte. No aniversário de sua chegada ao planeta vermelho, ele tocou Parabéns pra Você para si próprio... Deu risada? Mas é ou não é um caso de empatia da parte do controle da missão na Terra? O Igor Rodrigues, do falecido podcast Drone Saltitante, me contou sobre um robô usado em missões que sofreu um mal funcionamento ou algum tipo de acidente. A equipe que trabalhava com ele não queria um robô novo, queria aquele, que consertassem aquele, porque era parte do time.

Tem também o caso do Roomba, um aspirador de pó automático, que tem programação própria e sai limpando a casa sozinho. O presidente da empresa contou que uma vez uma mulher ligou no SAC da empresa dizendo que seu Roomba estava com um problema no motor e não aspirava direito. E a empresa se dispôs a trocar o aparelho, era só enviar o que tinha defeito e ela disse: não, não vou te mandar a minha Rosie!


Muita gente acusou o Campaign Against Sex Robots de querer abolir vibradores, dildos, bonecas infláveis e outros objetos. O movimento pede que bonecas em forma de criança sejam banidas, devido à pedofilia e só. Com relação à masturbação, ela sempre aconteceu, mesmo antes da chegada ao mercado de vibradores e bonecas infláveis. Eles são acessórios usados para obtenção de um prazer individual. Todos os seres humanos são criaturas sexuadas. Nós temos órgãos sexuais desenvolvidos para o ato do sexo. Plantas e animais dependem da reprodução sexuada. Quando você come um tomate você está comendo uma estrutura desenvolvida a partir do ovário de uma flor fecundada.

O que a Dra. Kathleen Richardson defende é que um robô não teria a experiência do sexo. Ele não poderia se envolver com o sexo. E que robôs, especialmente aqueles com características femininas reforçariam a objetificação feminina e a exploração sexual de mulheres, o que sabemos que já existe. Mulheres são consideradas objetos, divididas em partes inanimadas, só vermos a quantidade de propagandas de cerveja se valendo de corpos femininos. E a grande maioria dos robôs hoje tem formas femininas. Veja como uma boneca é fabricada.

A própria definição da palavra robô remete à escravidão. Karel Čapek, escritor tcheco, utilizou a palavra eslava para trabalho forçado ou escravo "robota" em sua peça de 1921 Rosumovi Univerzální Roboti (Rossum's Universal Robots). Rossum era um cientista que criou um protoplasma para utilizar em humanoides (robôs) para que fossem obedientes e realizassem todo o trabalho físico.

Mas para a Girl on The Net é impossível não antropomorfizar um robô. E já vimos que nós acabamos transferindo humanidade e simpatia para eles. Nós vemos faces humanas em objetos inanimados (pareidolia) e achamos que existe uma face alienígena em Marte, então imagine o que aconteceria com um robô pelo qual temos empatia? No filme Cherry 2000, um homem contrata uma mulher para ir com ele até um depósito de robôs para que ele pudesse conseguir outra robô da série Cherry, tamanho seu amor por ela. No fim, ele percebe que aquela mulher não era real e que uma mulher de verdade era muito mais satisfatório que um robô. Mas que tipos de abusos um robô poderia sofrer na mão de alguém que não tem empatia? Os mesmos que uma mulher sofre nas mãos desse mesmo alguém.

Talvez aí esteja a verdadeira questão. Niska, em Humans, é continuamente estuprada por clientes porque não pode mostrar que é consciente. Talvez este conflito moral tenha prazo para terminar, que é quando os robôs tiverem consciência e livre arbítrio, se isso acontecer. Porque até lá, o debate continua.

Até mais!

Podemos nos apaixonar por um robô? Claro. Nós já fazemos isso. Porque você é humano, e não pode deixar de amar.

Girl on the Net



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