Como reagiriam certos capitães de naves estelares ao se depararem com civilizações menos avançadas em suas jornadas? Poderiam se tornar deuses e governar como quisessem, ou teriam a consciência de não interferirem? Foi o que me peguei pensando enquanto assistia, de novo, a Star Trek Into Darkness e depois Pandorum. Este é um conflito que pulula pela ficção científica e sempre é uma ótima maneira de debater questões como dominação, escravidão, sanidade.

Assisto aos filmes várias vezes para pescar as coisas que não pesquei da primeira vez. E estive assistindo a Stargate SG-1, Pandorum e Star Trek e me peguei pensando na Primeira Diretriz. Para quem não lembra ou não sabe, ela é uma regra da Frota Estelar, aquela que construiu a Enterprise e treinou Kirk, Picard, Janeway e Sisko, e diz o seguinte:
É proibido a todas as naves e membros da Frota Estelar interferir com o desenvolvimento normal de uma cultura ou sociedade. Essa diretriz é mais importante do que a proteção das naves ou membros da Frota Estelar. Perdas são toleradas ao longo forem necessárias para a observação dessa diretriz.
Ou seja, você deve morrer ou perder sua nave para que esta regra-mor da Frota não seja violada. A punição para quem faz isso é a perda da nave, do posto e até prisão. Não importa se o planeta será destruído, se a população será aniquilada, não importa se você tem como ajudar a essa população. Interferir no desenvolvimento de uma civilização menos avançada e mudar o curso natural das coisas é errado e nenhum oficial da Frota Estelar deve fazer tal coisa.
O histórico dela pode ser traçado às aventuras da primeira nave Enterprise, comandada pelo capitão Archer. Já naquela época ficou claro que era preciso uma regra que impedisse a intervenção de raças avançadas em raças menos avançadas, mesmo que isso levasse à aniquilação desta última. O capitão Archer assim fala:
Algum dia meu povo vai ter que inventar alguma espécie de uma doutrina, algo que nos diga o que nós podemos e não podemos fazer. Mas até que alguém me diga que esboçaram essa diretriz, vamos ter que lembrar diariamente que nós não estamos aqui para brincar de Deus.
Posso entender porque isso é errado. Uma população que não chegou ao estágio espacial, ou mesmo industrial, vendo as tecnologias que uma nave possui, vendo equipamentos que fazem em segundos o que eles levariam anos para fazer, ver uma população avançada e diferente da sua levaria a uma série de questionamentos, medo, até mesmo a criação de uma religião baseada numa experiência que eles julgam ser transcendental. E uma regra que proíba alguém de fazer isso pode inibir certos pensamentos megalomaníacos de alguns que achem que brincar de deus é maneiro.
Star Trek, A Nova Geração tratou disso muito bem no episódio Who watches the Watchers, terceira temporada, quarto episódio, onde uma violação acidental da Primeira Diretriz para salvar uma equipe de cientistas levou o povo de Mintaka III a acreditar que Picard era um deus. O personagem Liko ficou tão impressionado com o que viu que começou a acreditar nas antigas lendas de seu povo sobre um ser superior e começa a fomentar uma religião em torno da figura do capitão.
Picard precisa levar Nuria, a líder do povoado, considerada uma mulher sensata, para a Enterprise a fim de mostrar à ela que eles são humanoides, de carne e osso, seres que passaram por vários estágios evolutivos até chegarem ao ponto de voar por entre as estrelas. Foi difícil convencê-la de que ele não era um deus, nem que tinha capacidade de trazer pessoas à vida. Só quando ela se convenceu e quando Liko estava prestes a matar a conselheira Troi é que a confusão foi desfeita e o povo entendeu que ele não era nenhum deus.
![]() |
Nuria observa Mintaka III à bordo da Enterprise, com o capitão Picard. |
Em Stargate SG-1, o quinto episódio, da primeira temporada, The First Commandment, também tem uma pegada parecida. A equipe SG-9 não mandou resposta após chegar em P3X-513 e a equipe SG-1 é então enviada para saber o que aconteceu. Eles descobrem que o comandante de SG-9 se autoproclamou um deus para a população local e a governava com mãos de ferro. Ele sofreu algo parecido com o que o cabo Gallo, em Pandorum, sofreu quando recebeu a notícia que a Terra fora destruída. A diferença é que o comandante de SG-9 viu a possibilidade de se tornar algo maior do que ele era. Logicamente, a equipe SG-1 se viu obrigada a removê-lo desta posição mítica para o bem da população.
Estas situações fictícias servem como um bom exercício de reflexão. Vemos que a raça humana violou a Primeira Diretriz aqui mesmo, quando povos mais avançados encontraram tribos indígenas e nós vimos a merda que deu. Mesmo sabendo que situações perigosas para uma civilização existam e podem levá-la à extinção, a interferência de uma raça alienígena avançada certamente causaria mais danos que benefícios, ainda mais se eles se revelarem. Mesmo que nunca cheguemos a encontrar uma raça alienígena com desenvolvimento inferior, a ficção científica certamente trouxe uma contribuição importante e uma reflexão a respeito de situações de contato.
Até mais!
Já que você chegou aqui...

Comentários
Postar um comentário
ANTES DE COMENTAR:
Comentários anônimos, com Desconhecido ou Unknown no lugar do nome, em caixa alta, incompreensíveis ou com ofensas serão excluídos.
O mesmo vale para comentários:
- ofensivos e com ameaças;
- preconceituosos;
- misóginos;
- homo/lesbo/bi/transfóbicos;
- com palavrões e palavras de baixo calão;
- reaças.
A área de comentários não é a casa da mãe Joana, então tenha respeito, especialmente se for discordar do coleguinha. A autora não se responsabiliza por opiniões emitidas nos comentários. Essas opiniões não refletem necessariamente as da autoria do blog.