A palavra 'monstro' tende a evocar sentimentos de repulsa ou medo através de um corpo repulsivo, implicando maldade e implicando de imediato que algo está errado. A criatura de Frankenstein é um exemplo notável, que o imaginário popular traz como um ser esverdeado, balbuciante e cambaleante, criado com partes de corpos e cheio más intenções. Por um tempo, a criação se tornou uma sombra de como Mary Shelley pretendia que ele fosse durante sua evolução nos palcos e nas telas. Na realidade, ele pretendia ser uma crítica monstruosa da humanidade - e, sem dúvida, a maioria dos monstros é.
Fearless, por Disse86 |
Estudar monstros é estudar a cultura humana. Eles são empreendimentos universais, pois cada cultura tem o seu próprio, além de ter perspectivas sobre o que considera monstruoso. A coleção de 1996 de Jeffrey Jerome Cohen, Monster Theory: Reading Culture, é creditada por nomear o campo da teoria dos monstros, mas o campo em si não é novo, remontando a culturas antigas que se preocupavam em decifrar o significado dos monstros.
Monstro se origina da palavra latina monstrum, que por sua vez deriva de monere ('avisar') e eram presságios para os antigos. Embora não busquemos necessariamente profecias deles em uma sociedade moderna, ainda precisamos de monstros e seu significado.
Perseguimos esse significado por meio da compreensão da monstruosidade como sendo socialmente construída. Os monstros podem nos ensinar que a diferença não significa o mal e, de fato, olhar o mundo pelas lentes de um monstro pode fornecer uma perspectiva muito mais simpática a eles. Uma perspectiva externa pode esclarecer certas ações sociais que se acabaram normalizadas.
Principalmente, os monstros são a personificação das ansiedades humanas e a teoria dos monstros estuda suas diferenças para entender tais ansiedades e ensinar lições sobre a humanidade. A sociedade cria seus próprios monstros e os incorpora com um significado, como o que constitui comportamento "bom" e "mau", tornando os monstros o "Outro". Simplificando, os monstros personificam o diferente daquilo que a sociedade conhece e estabeleceu e nos envolvemos com o comportamento do 'Outro' baseado nessa diferença. Ao dizer que não somos um monstro, estamos dizendo o que somos.
Os monstros são construções culturais do horror que define o que tememos inconscientemente e dizem o que devemos odiar ou amar.
Ao longo da história, nós, como humanos, nos definimos em relação ao ‘Outro’, o que pode ser uma prática bastante problemática ao reforçar a marginalização e a perseguição social. Isso os torna anormais, reforçando nossas construções, estéticas e perspectivas como sendo a norma e qualquer coisa diferente é interpretada como um desafio, tornando-se o 'Outro'. Esse medo e repulsa da diferença cria monstros e pode se transformar em ódio injustificado.
Transformar grupos específicos em monstros com base na diferença ainda é evidente. Os povos antigos já faziam isso e a sociedade moderna ainda o faz. Se o 'Outro' for visto como uma ameaça ou algo que requer subjugação, está nascido o monstro temido pelo situação vigente. Para outra pessoa, somos o monstro e o 'Outro' que ameaça sua norma.
Embora os monstros possam ser usados para reforçar o que é comportamento "bom" e "mau" conforme os ditames da sociedade, não é um comportamento natural, mas construído, e os monstros também podem ser lidos como uma forma de desafio. Por exemplo, o gênero nos contos de fadas ensina o que é conhecido e ‘seguro’ que tende a ser princesas passivas, príncipes corajosos e aqueles que não se conformam são os vilões e monstros.
Saturados em construções de gênero e pensamento binário, os contos de fadas fazem parte do processo de socialização de aprender e observar o que é “normal” e esperado na sociedade. Como você pode ter o seu 'felizes para sempre' se deseja ser como a bruxa, que tende a ser uma mulher rejeitada pela sociedade? Nesse caso, a bruxa monstruosa não é a bruxa liberada? Embora ela seja perseguida e exilada por sua diferença, ela não precisa "agir" em seu gênero. Ser uma bruxa significa que ela pode se enfurecer contra o mundo. Todos devemos aspirar a ser mais parecidos com a bruxa monstruosa.
O rótulo de monstro é frequentemente usado como uma forma de controle e opressão. O monstro oferece um espaço para desafiar e questionar tudo o que é conhecido e aceito como norma. A teoria dos monstros pode trazer uma nova compreensão sobre o que é o monstruoso e decifrar os significados subjacentes. Podemos ler o valor feminista das bruxas na misoginia da era Trump ou no uso de monstros como comentários sobre racismo ou homofobia.
Embora os monstros ainda sejam um aviso, agora é mais para uma pessoa que identifica um monstro com base em sua diferença. O rótulo de monstro é frequentemente usado como uma forma de controle e opressão. Ao dar voz ao monstro, acolhemos críticas sobre a sociedade e uma reflexão sobre valores, ansiedades e atitudes culturais. O monstro pode nos iluminar, nos libertar e revelar como somos os monstros.
Até mais!
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