Resenha: O cavaleiro e a mariposa, de Rachel Gillig

Esse é mais um daqueles livros que me chamaram a atenção por causa da capa. Algo nela chama a atenção logo de cara. Primeiro livro de uma duologia gótica de fantasia, conhecemos aqui as Divinadoras da Catedral de Aisling, que profetizam àqueles que podem pagar através de sonhos. Mas todo sonho pode se tornar rapidamente em um pesadelo.

O livro
Sybil Delling (não é parente) serviu por nove anos como Divinadora da Catedral de Aisling, junto de outras cinco garotas. Todas elas esperam ansiosamente pelo fim do período em que devem profetizar para os nobres e para o povo e assim deixar os muros sagrados da catedral. Lá dentro, ela se afogam numa fonte divina onde sonham com os Agouros, seres sobrenaturais, que poderíamos chamar de deuses num primeiro momento, que as tornam capazes de ver tragédias antes que aconteçam, que pode dizer se algo no futuro será bom ou ruim.

Resenha: O cavaleiro e a mariposa, de Rachel Gillig

A violência é uma arte. A compaixão também.

Neste reino, as pessoas vivem seus dias tentando interpretar sinais dos Agouros. Por isso as Divinadoras não saem da Catedral, onde convivem com gárgulas de pedra que guardam o território sagrado. Um dia, o novo e jovem rei chega com uma comitiva de cavaleiros para pedir aos Agouros que lhe contem como será seu reinado. A divinadora número seis, Sybil, é escolhida para divinar, ou seja, se afogar nas águas sagradas da fonte e sonhar. Mas o que ela prevê para o reino é sombrio. Todos os seis Agouros dizem que o reinado no novo rei terminará em tragédia.

A autora consegue construir muito bem esse ambiente gótico e abafado da catedral, da vida regrada das Divinadoras e como elas anseiam pela liberdade e pelo fim de seu serviço divino. Os contatos com o exterior da catedral são bastante restritos, assim elas são ingênuas e não sabem bem o que esperar da liberdade. Seus olhos são sempre cobertos por gaze, elas usam vestidos esvoaçantes e andam descalças pela catedral. Parecem mais com fantasmas do que com pessoas.

Por ser uma romantasia, é óbvio que vai haver paquera e romance, mas achei que a autora soube dosar sem parecer tóxica ou brega. Um dos cavaleiros do rei, Rodrick ou Rory, ajuda Sybil quando as Divinadoras começam a desaparecer, mas o foco dela não é na paquera. Ela não fica sonhando com o dia em que vai cair de boca em Rory. Seu foco é em achar suas amigas, praticamente irmãs, pois elas são sua única família e a abadessa da catedral não parece empenhada em encontrar as garotas. Assim, Sybil abandona seus votos sagrados e resolve seguir com a comitiva do rei para achar as amigas.

Fé exige demonstração. Quanto maior o espetáculo, maior a ilusão.

Um dos personagens que mais me surpreendeu foi uma gárgula de pedra que decide abandonar a catedral junto de Sybil. Dona de uma personalidade cativante e capaz de tecer comentários ácidos sobre qualquer assunto, a revelação do final me pegou totalmente de surpresa. É sério, eu não estava prevendo isso. Os personagens são muito bem construídos, ao ponto de ficarmos com raiva e felizes de ler algo tão bom ao mesmo tempo.

Não é um livro perfeito, mas é um livro bem escrito, que consegue contar uma história do começo ao fim, mesmo sabendo que haverá uma continuação. O final aqui deixa um gancho para o próximo, mas consegue finalizar a jornada dos personagens e começar outra. Sybil cresce muito perto do final e parece enfim deixar de lado a gaze e as roupas esvoaçantes para assumir o caráter de uma guerreira por direito próprio.

Além de Rory, que é um cavaleiro muito charmoso e sombrio, temos personagens secundários cativantes, que seguram boa parte da narrativa com pouco esforço. Maude, por exemplo, é uma cavaleira experiente e que acaba por guiar muitas ações de Sybil. Aliás, me irritei muitas vezes com Sybil por se apegar tanto às tradições da catedral; por outro lado, que escolha ela tinha a não ser seguir aquilo com o qual cresceu? Não é fácil abandonar aquilo em que se acreditou e viveu por tanto tempo e acompanhamos essa evolução da personagem enquanto ela percorre o reino em busca de respostas. Quem são os Agouros realmente? E qual a conexão deles com a Abadessa? O final me fisgou e agora tenho que segurar a ansiedade enquanto espero o próximo volume.

A tradução foi de Sofia Soter e está ótima. O livro tem alguns errinhos de revisão, mas que não atrapalham a leitura. A arte da capa é de Lisa Marie Pompilio.

Perder algo dói. Às vezes, encontrar o que perdemos é de igual agonia.

Obra e realidade
A jornada de Sybil em busca de suas amigas também levanta questões a respeito da fé. A Catedral de Aisling é rica e opulenta, construída em torno da fonte sagrada que leva o sonho às Divinadoras. Muito ouro corre por essas águas, mas Sybil não vê benefícios ao povo do reino, nem mesmo a ela e suas amigas. Que deuses são esses que não se importam com os pobres mortais que tanto pedem e pagam por sua ajuda?

É também uma jornada sobre descobrimento. Quando Sybil se despe das vestes das Divinadoras e assume seu lugar como guerreira, ela também abandona essa fé que tanto machuca as pessoas, que tanto roubou dela e suas amigas. Não é uma tarefa fácil e acredito que no próximo livro ela ainda lutará contra a fé, mas desta vez contra um reino inteiro.

Rachel Gillig

Rachel Gillig é uma escritora e professora norte-americana, com especialização em teoria da literatura e crítica literária pela Universidade da Califórnia em Davis. Ela mora na Califórnia com o marido, o filho e um poodle.

PONTOS POSITIVOS
Sybil e Rory
Bem escrito
Discussão sobre religião e fé
PONTOS NEGATIVOS

Começa devagar

Título: O cavaleiro e a mariposa
Título original: The Knight and the Moth
1. O cavaleiro e a mariposa
2. (sem título)
Autora: Rachel Gillig
Tradutora: Sofia Soter
Editora: Alt
Páginas: 464
Ano de lançamento: 2025
Onde comprar: na Amazon!

Avaliação do MS?
Admito que no começo eu não sabia o que esperar de Sybil e suas amigas Divinadoras. O começo parece que não vai a lugar algum e de repente o livro deslancha e entrega um reino bem construído, com personagens cativantes e um final explosivo. Um prato cheio para qualquer fã de fantasia. Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também!


Até mais! 🦋

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