Distopias reais

Este foi um ano surpreendente e marcante, mais que 2012, o ano do ~previsto~ apocalipse maia. Vai ver o calendário deles errou por alguns anos. O texto não tem a pretensão de ser uma retrospectiva, apenas uma breve amostra de como temos distopias tão próximas e que não devem nada à ficção.

Distopias reais




Distopia é um assunto comum por aqui. Mas sempre falo das distopias da ficção. As distopias reais não tinham sido abordadas aqui, talvez por não enxergá-las, de tão acostumada que fico com o universo da ficção científica. Mas foi pelo Twitter que a minha irmãzinha de coração, a Bel, me falou sobre um certo fascínio bizarro que ela tem pela Coreia do Norte. E perguntei por que isso, afinal é um dos países mais fechados e sinistros que existem no mundo atualmente. E é justamente por essa situação do país, uma distopia do presente, que ele é fascinante, bizarro, estranho, próximo, esquisito...

Se olharmos bem à nossa volta temos situações distópicas o tempo todo. Falei num post sobre O que é distopia? que a função dela é nos deixar desconfortáveis, é nos deixar incomodados ao olharmos para uma determinada situação que foi extrapolada ao máximo na ficção. Universos distópicos é o que mais tempos na ficção científica, sinal de que algo sempre incomoda os autores e os leitores. De 1984 a Jogos Vorazes, de Admirável Mundo Novo a Homeland, temos cenários, pessoas e crises que nos lembram do quão próximos estes mundos estão da nossa vivência.

Por exemplo, Jogos Vorazes tem uma seleção para 24 jovens serem enviados à uma arena futurística onde serão mortos para o deleite do público. No que isso é diferente da morte de adolescentes negros, principalmente pelas mãos da polícia, nas comunidades carentes pelo país? No que isso é diferente do caso Ferguson? Ainda em Jogos Vorazes, o novo filme da franquia foi suspenso nos cinemas da Tailândia depois que manifestantes imitaram o gesto de resistência feito pelos personagens do filme.

Em um mundo onde Carrie Mathison (Homeland) bombardeia um casamento atrás de terroristas, uma escola é invadida pelo Talibã, no Paquistão, porque eles não toleram ver pessoas recebendo educação formal, especialmente meninas. A Coreia do Norte é acusada de ter hackeado a Sony, causando um constrangimento global, com emails vazados, tudo porque um filme foi feito parodiando o grande líder da nação... Mas que coisa estilo Hackers, estilo Nexus... Será que vivemos mesmo fora da Matrix?

Jogos Vorazes e o gesto subversivo

Tudo isso já é visto na ficção e tem sido visto na realidade mais vezes do que gostaríamos. E o choque de ver na realidade é de certa forma mais intenso do que ver na ficção. Ler ou assistir uma distopia é bem diferente de viver uma. Enquanto nos sentimos angustiados com o modo como Winston vive e trabalha para o Partido, em 1984, temos um exemplo ótimo na Ásia de um regime que ignora o resto do mundo e permanece o mais fechado do planeta. Enquanto autores trabalharam por anos com regimes totalitários e invasões alienígenas com medo da invasão vermelha do comunismo, Cuba e Estados Unidos se reaproximam.

Temos nossas distopias, tanto passadas quanto presentes, retratadas em ficção ou não. Se foram esmiuçadas pelos escritores, se foram sentidas e imaginadas na ficção, talvez nada seja mais profundamente perturbador do que o nosso próprio mundo, do que o jornal da noite dando as notícias que rodaram o globo naquele dia. Senti que 2014 foi mais pesado que qualquer distopia que já li, como se ele resolvesse explorar os universos ficcionais e nos chocar a cada dia com a mais simples realidade.

Até mais!

Ficção científica é uma revelação psicotrópica super espiritual, um sonho futurístico, um ritual sigiloso. É surrealidade e realidade. O psicotrópico se refere à habilidade da ficção científica em induzir o sonho no escritor e no leitor, o participante. É semelhante aos alucinógenos na qualidade de fazer a ficção científica parecer real (possível) e totalmente surreal (impossível). O efeito das melhores FCs é semelhante ao efeito das melhores drogas. Enquanto o participante "vê coisas" que a maioria de nós, sem FC, não vê, o participante trabalha com essas "coisas", ele age e se comporta como se fosse quimicamente induzido.

Alex Smith


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