Resenha: Hotel Termush, de Sven Holm

Hotel Termush é a mais conhecida obra de ficção científica nórdica. Clássico distópico, ele é fruto de uma época em que o medo coletivo era sobre o holocausto nuclear. Ele seria igual para todos ou algum grupo privilegiado acabaria sobrevivendo sobre os outros?

O livro
Termush se passa num resort de luxo à beira-mar, onde só os muito ricos conseguem comprar a hospedagem. Do lado de fora, o mundo sofreu algum tipo de holocausto radioativo, e o hotel funciona como um misto de resort e bunker: serve para proteger os hóspedes ricos e saudáveis, enquanto mantém os sobreviventes doentes afastados. Só que esse frágil equilíbrio começa a ruir aos poucos, quando pessoas que não puderam pagar por um quarto passam a exigir cuidados médicos e hospitalidade, para o horror dos hóspedes já instalados.

Resenha: Hotel Termush, de Sven Holm

A vida nos quartos pode ser confundida com a vida protegida e inequívoca de antes da catástrofe. A vida nos quartos foi projetada para iludir.

Escrito no formato de diário, o protagonista sem nome é um destes hóspedes privilegiados que sobreviveram ao fim do mundo no bom e do melhor. Quase não há explicações sobre o que realmente aconteceu, apenas sabemos que lá fora é perigoso. De certa forma, me lembrou bastante Eu que nunca conheci os homens, de Jacqueline Harpman, onde acompanhamos personagens em uma paisagem árida e pós-apocalíptica, tentando montar sozinhas as peças do quebra-cabeça do que pode ter acontecido. Mas a narrativa de Harpman me pareceu mais sólida do que a que temos aqui, onde nenhum personagem se destaca.

A forma como Holm trata a radiação como um horror invisível é perturbadora: o narrador descreve a expectativa de que o mundo ao redor fosse se transformar diante de seus olhos, mas a vida continua aparentemente normal, com apenas pequenos detalhes fora do lugar. Isso gera uma sensação estranhíssima, porque o terror acaba sendo criado pela própria imaginação humana, compensando a ausência de um “inimigo visível” do lado de fora.

Nosso protagonista temia uma possível contaminação nuclear ou um colapso do governo e, portanto, ele protegeu seu futuro mudando-se para Termush, um hotel com segurança pesada e vastos recursos. E aí fica a questão: e quanto o resto do mundo? Existem outros hotéis do tipo em outros continentes? O que fazer com as pessoas de fora que acabam encontrando o hotel? Será que ele terá recursos para seus hóspedes ou terá que dividir com os doentes pela radiação? É possível notar que as perguntas do protagonista são com relação à sua sobrevivência, mas que ele terá que privilegiar a sua em detrimento de pessoas que não tiveram tanta sorte. Ele tem um tom melancólico de alguém que é incapaz de agir diante das circunstâncias.

Esperávamos encontrar um mundo completamente aniquilado. Foi para nos protegermos disso que nos inscrevemos no Termush.

O que senti que falta em Hotel Termush é a narrativa ágil que Jacqueline Harpman colocou em seu livro. Termush me parece um estudo de caso e não um livro distópico. O tom melancólico do protagonista pode ser devido à situação, mas isso não contribui para o bom andamento da leitura. Cheguei ao final em aberto sem me apegar a nada nem a ninguém, pois o autor não dá voz e personalidade nem para os sobreviventes que começam a chegar aos portões do hotel. Nem aos coitados dos voluntários que são enviados à cidade mais próxima para averiguar as imediações.

Os personagens não são bem definidos, são como borrões literários, sem passado algum, ou voz, o que significa que você não cria empatia por nenhum deles, nem tenta entendê-los. A falta de diálogos entre eles significa que você não entende muito bem como eles se sentem e por que agem daquela maneira. É tudo muito frio e impessoal e acho que mesmo as pessoas ricas e privilegiadas deveriam ter algum tipo de sentimento sobre o que estava acontecendo ou sobre quem ficou para trás. Nada disso aparece aqui. Isso vai incomodar bastante se você busca alguma compreensão ou conexão com os personagens.

Felizmente é uma leitura rápida, porque Hotel Termush tem menos de 250 páginas. Dá para ler em um dia. A tradução de Kristin Lie Garrubo está ótima e não há problemas de revisão ou diagramação.

Obra e realidade
Hotel Termush talvez parecesse algo imoral de acontecer na época de sua publicação, no final dos anos 1960, mas nos dias atuais, com esses techbros flertando abertamente com eugenia e fascismo, não parece tão distante. Os milionários, bilionários e poderosos têm projetos para bunkers e planos de contingência para momentos de crise. Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, tem um projeto de bunker em seu rancho no Havaí, avaliado em cerca de R$ 1,3 bilhão.

E aí fica a pergunta: o que seria de nós, pobres mortais? Não tenho dinheiro para comprar uma acomodação confortável em um resort para me resguardar num evento de fim do mundo. Não tenho condições de estocar comida e água. E mesmo os poderosos, por quanto tempo eles aguentariam em seus bunkers? Um hotel, um resort, precisa do trabalho de dezenas, centenas de funcionários. Se morrer todo mundo do lado de fora, algum bilionário vai para cozinha lavar a louça do almoço? É um poder ilusório estar hospedado no Hotel Termush.

Sven Holm

Sven Holm foi um escritor e dramaturgo dinamarquês, autor de várias peças, coletâneas e ensaios. Faleceu em 2019.

PONTOS POSITIVOS
Distopia
Hotel
Diário
PONTOS NEGATIVOS
Personagens rasos
Final em aberto
Narrativa monótona

Título: Hotel Termush
Título original: Termush
Autor: Sven Holm
Tradutora: Kristin Lie Garrubo
Editora: Aleph
Ano: 2025
Páginas: 248
Onde comprar: na Amazon

Avaliação do MS?
Este é um livro estranho... Ele deixa aquela sensação de que algo interessante demais ficou de fora da narrativa. Meio estudo de caso, meio diário, queria que o livro tivesse me agradado mais. Três aliens para Hotel Termush.


Até mais!

Já que você chegou aqui...

Comentários

Form for Contact Page (Do not remove)