Radiação - agora está em foco. E depois?

Todo mundo que esteja acompanhando os acontecimentos no Japão sabe que a usina nuclear de Fukushima está com problemas desde o terremoto e do tsunami, cujas vítimas ainda estão contadas. Como se não bastasse a destruição causada pelas ondas, elementos radioativos estão sendo liberados na atmosfera, o que causa uma tensão não apenas no povo japonês mas também no mundo. Existe a sombra de Chernobyl, com certeza o evento mais conhecido e os saudosistas acabam sempre lembrando da Guerra Fria e toda a tensão nuclear entre Estados Unidos e União Soviética.



O Brasil possui usinas nucleares, Angra I e II, com a construção da terceira em andamento, na minha opinião um paradoxo no país que defende a tecnologia verde. Mas fora episódios como esse, ninguém realmente se lembra da radiação, nem sequer sabe o que ela é. Uma definição bem básica do tema:

Em física, radiação é a propagação da energia por meio de partículas ou ondas. Todos os corpos emitem radiação, basta estarem a uma determinada temperatura.

Ou...

A radiação é a capacidade que certos átomos têm de liberar energia eletromagnética de seus núcleos na tentativa de estabilizarem, como o urânio.

Ou seja, ela está em todo lugar, o tempo todo, em nossos corpos e nas coisas que usamos. O que importa é a intensidade desta radiação. O problema do Japão é o elemento que eles usam em suas usinas. Em geral, usinas nucleares utilizam urânio em seus reatores para gerar energia, mas o Japão não.

Os elementos radioativos são perigosos, pois são instáveis. Uma usina nuclear é uma instalação que se utiliza de combustível radioativo para gerar energia elétrica. E de onde vem essa energia? Como os núcleos atômicos destes átomos são muito pesados, eles liberam energia na forma de nêutrons, que colidem com os núcleos de outros átomos quebrando-os (fissão), gerando uma reação em cadeia. Com a quebra do núcleo atômico, acontece uma grande liberação de energia, que aquece a água da usina, fazendo girar turbinas, o que gera a energia elétrica, como se fosse uma usina hidrelétrica. No entanto, a radiação em grandes quantidades é extremamente tóxica, poluente e persistente no ambiente. Em seres humanos, ela causa câncer, queimaduras graves, hemorragias, diarréias intensas, desidratação e morte. O nosso maior acidente radioativo foi em 1987, em Goiânia, quando uma cápsula contendo césio-137 de um equipamento de radioterapia foi aberta na desmonatagem inadequada do material e contaminou várias pessoas, sendo que 4 morreram. A limpeza produziu 13,4 toneladas de lixo radioativo e estão hoje acondicionados numa montanha artificial de concreto no município de Abadia de Goiás, onde deverão permanecer por 180 anos até se tornarem inertes ao ambiente.

Enriquecimento de urânio

Existem entidades químicas chamadas isótopos, que possuem o mesmo número de prótons em seu núcleo, sendo que o de nêutrons podem variar. A lei da natureza diz que até 83 prótons no núcleo, a natureza consegue compensar com o mesmo número de nêutrons. Dessa maneira, existem elementos isótopos que não são radioativos, como o carbono-14.

N = P

Mas se o número de prótons for maior que 83 no interior do núcleo, a natureza não consegue manter a integridade do átomo e começa a liberar nêutrons, tornando o elemento radioativo.

N > P  --> Energia

O combustível preferido nas usinas nucleares é o urânio. Ele é retirado do mineral uranita, bastante comum no Brasil. Mas existem dois tipos de isótopos radioativos de urânio: urânio-238 – corresponde a 99,5% das reservas mundiais e urânio-235 – corresponde a 0,5% das reservas. Este urânio-235 é o único que pode sofrer a fissão, a quebra do núcleo, liberando energia. Por isso, os cientistas precisam enriquecer o 235U com o 238U para obter um subproduto da fissão. Com a quebra do átomo do urânio-235, ocorre a liberação de nêutrons. O urânio-238 decai para o neptúnio-239, que decai mais uma vez para o plutônio-239, altamente tóxico, perigoso e poluente. Esse é o principal causador de tensão entre o Irã e a comunidade internacional. Se este país, que apóia o terrorismo publicamente, começar a enriquecer urânio, no final o subproduto natural da fissão será o plutônio e ele é o principal elemento na produção de bombas nucleares.

Países como a França e a Alemanha vendem seu plutônio para o Japão, que o utiliza como combustível de suas usinas pois ele é altamente energético. Ao contrário do urânio, que é natural, o plutônio não existe na natureza, é produto industrial humano. Ele foi utilizado nas missões Apolo para a Lua e também é um dos principais combustíveis nos submarinos nucleares. Ele é muito perigoso porque tende a se concentrar na superfície dos ossos, ao invés de se distribuir uniformemente pela massa óssea como ocorre com outros metais pesados, como o urânio. Por esta razão, os níveis permitidos de plutônio são mais baixos do que para qualquer outro elemento radioativo. O fato de se espalhar numa área muito rápido o classifica também como um POP - poluente orgânico persistente - ou seja, ele permanece no ambiente uma vez que foi liberado. E isso é péssimo pois para se tornar inerte, ele leva cerca de 25 mil anos.

Exame com contraste radioativo. 
Mas radiação não é somente doença, desgraça e contaminação. Se não fosse a radiação, ninguém poderia fazer um exame de raio-X, ou poderia tratar certos tipos de câncer com radioterapia nem fazer exames de contraste, que se utiliza de um isótopo radioativo de Iodo. O problema é quando o nível é elevado ou quando a contaminação acontece como no desastre do Japão. O Brasil tem poucos estudos referentes à contaminação por materiais radioativos, mas um apanhado geral foi feito pelo Prof. Dr. Rubens C.L. Figueira, professor de geoquímica marinha do Instituto Oceanográfico da USP. Seu tema de doutoramento foi: Inventário de radionuclídeos artificiais em água do mar e sedimentos da Costa Sul do Brasil, e é o mais completo já produzido no país, infelizmente indisponível para download.

Para saber mais, seguem sugestões de leitura da Revista de Estudos Avançados da USP no Dossiê 59 sobre Energia, todos com links para download:

Fica sempre a esperança de que a tecnologia seja eficiente e não poluente. Acidentes nucleares podem e vão acontecer no futuro visto que as usinas estão velhas. Temos que lembrar sempre que eventos naturais danificam e modificam nosso modo de vida e que nada está imune à sua ação. Porém, ainda falta o interesse e o investimento em tecnologias chamadas verdes, que não conseguem superar a geração de energia das tradicionais. Fica aí um aviso vindo do Japão.

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