Resenha: A Forma da Água (2018)

O novo filme de Guillermo del Toro já chegou levando prêmios por onde passa. Aclamado pela crítica especializada e pelo público, ele lidera a lista de indicações ao Oscar da Academia, com nada menos que 13 categorias, entre elas melhor filme, melhor diretor, melhor atriz principal e coadjuvante, ator coadjuvante, trilha sonora e a lista continua. É uma fábula adulta sobre o amor entre dois incompreendidos.



O filme
A Forma da Água é um filme sobre o amor. Passando-se numa Baltimore, Maryland, da Guerra Fria, o filme nos mostra várias pessoas sozinhas e diferentes. Eliza (Sally Hawkins) é uma moça muda, que se comunica por linguagem de sinais com as duas pessoas que lhe são mais próximas, Giles (Richard Jenkins), seu vizinho, com quem convive diariamente e Zelda (Octavia Spencer), sua colega de trabalho em um instituto de pesquisa do governo. As duas fazem parte da equipe de limpeza dos laboratórios e veem a chegada de uma criatura aquática bizarra.


O chefe do setor de pesquisa é o misógino, nojento e asqueroso Strickland (Michael Shannon), que impõe seu preconceito sobre os funcionários e trata a criatura no laboratório como um animal, inclusive lhe dando choques. Eliza mora em cima de um charmoso cinema, onde na marquise vemos o nome de um filme: A História de Rute, de 1960. O filme tem um simbolismo bastante sutil para A Forma da Água e seu enredo.

Uma das passagens mais famosas do Livro de Rute é uma leitura bem familiar em casamentos, ditas entre uma viúva e sua sogra. Rute, que é moabita, pede à sua sogra judia, Naomi, que vá a Israel com ela, depois que o marido de Rute, filho de Naomi, morreu. A passagem denota devoção e amor que transcende o lar, a família e as crenças daquele mundo. É se apaixonar e se entregar ao outro e ao seu compromisso. Não é à toa que o longa de 1960 seja evocado em A Forma da Água, já que ele trata de um amor em que para amar o outro é preciso aprender a enxergar as diferenças e também as semelhanças que os tornam profundamente iguais.

O vilão Strickland esteve na Amazônia e leva para o laboratório a criatura aquática interpretada por Doug Jones, velho parceiro de Del Toro. É um ser cultuado em seu lar, com uma forma humanoide, mas uma aparência de peixe. Ele pode respirar tanto fora d'água quanto dentro, mas não pode ficar fora da água por muito tempo. Strickland tenta estudar o misterioso ser para aplicações militares junto do Dr. Hoffstetler (Michael Stuhlbarg), que logo mostra ser mais do que um mero cientista.

Eliza, muito curiosa, visita a criatura às escondidas. É a partir daí que começa uma conexão dela com o ser aquático, a quem Strickland chama várias vezes de "abominação". Quando Eliza descobre quais são os planos dele para seu novo amigo, ela decide agir e tirá-lo do laboratório.


Com grandes atuações, o destaque certamente vai para Sally Hawkins que, sem dizer uma palavra, trouxe emoção para as telas como poucos artistas conseguiriam fazer. É sua postura corporal, é sua expressão facial, seus grandes olhos brilhantes e suas mímicas que falam sem uma voz. Boa parte da carga dramática está com sua personagem Eliza e a atuação merece sua indicação ao Oscar.

Michael Shannon (o general Zod de Homem de Aço) está absolutamente detestável no papel do vilão e Octavia Spencer tem momentos de alívio cômico, mas é a principal amiga e apoiadora de Eliza quando esta sofre com o preconceito alheio e de onde surge uma força que a personagem parecia não saber que tinha quando é preciso ajudar Eliza. E Doug Jones é um artista fantástico, por conseguir atuar com toda aquela maquiagem e ainda ser capaz de se expressar com tamanha intensidade. É possível esquecer que há um ser humano usando roupa e maquiagem e de fato acreditar que aquele incrível ser aquático de fato existe.

Existem cenas de nudez de Eliza que me pareceram sem nenhuma função no longa e há várias cenas de violência contra a criatura que são bem revoltantes, especialmente porque ele passa boa parte do tempo acorrentado.

Ficção e realidade
A Forma da Água é um conto de fadas adulto, centrado em mundo de preconceito e aversão ao que é diferente. E o que pode ser mais diferente de nós do que uma criatura aquática, com poderes sobrenaturais? Justamente por falar de preconceito que sua história é necessária nos nossos dias de grande polarização e de afirmação de discursos preconceituosos como sendo um direito. É um filme para falar de bondade, de diferenças raciais, de desejo, de gentileza e compaixão.

Evocando a ideia de Platão sobre a forma pura da água, entendemos o porque do título. Em sua forma pura, a água teria a forma de um icosaedro, um poliedro de 20 faces, que faz alusão à ideia de que a humanidade tem muitas faces. A história de Eliza e a criatura nos lembra que todo mundo é dotado de beleza e que possuem uma força capaz de mudar o mundo.

O livro baseado no roteiro, escrito por Guillermo del Toro, será lançado em breve pela Editora Intrínseca e ele já se encontra na pré-venda!


Pontos positivos
Eliza e a criatura
Fotografia
Trilha sonora
Pontos negativos
Nudez feminina
Violência


Título: A Forma da Água
Título original: The Shape of Water
Direção: Guillermo del Toro
Distribuição: Fox Searchlight Pictures
Data de lançamento no Brasil: 1 de fevereiro de 2018
Duração: 123 minutos

Avaliação do MS?
Contos de fada costumam ter finais felizes depois de nos ensinar uma lição. E A Forma da Água não deixa por menos. Chegar até o final pode ser doloroso, mas o longa vale cada minuto. O diretor conseguiu criar uma fantasia adulta que evoca esperança, amizade, compaixão e que sugere que o verdadeiro amor significa cruzar e até destruir as barreiras que nos dividem, especialmente daqueles que são diferentes de nós. Quatro aliens para o filme e uma forte recomendação para você assistir também.


Até mais!

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Comentários

  1. Gostei do filme, mas acho que ele poderia ter um ritmo melhor, muitas vezes me peguei bocejando de sono de tanto que demorava pra história andar. Discordo do que foi dito sobre a nudez feminina, pois acho que ela tem mais a ver como mais uma forma de mostrar a pureza da personagem, se despindo de todos os conceitos sociais e simplesmente sendo ela, sem maldade alguma e inclusive se colocando no mesmo grau de pureza da criatura, sempre despida. Não me lembro da câmera do Del Toro explorando o corpo dela, aliás, nem lembro de cenas de nudez nos filmes anteriores dele, por isso acredito mais no significado que isso possa ter no filme, na forma de passar algo também pela imagem (já que é cinema, né...rs).

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    Respostas
    1. É possível mostrar a "pureza" da personagem sem mostrar pelo pubiano e bico de peito, Diego.

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  2. Será que, se fosse um filme com protagonista homem, teria cena de nudez?

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