Resenha: Matéria Escura, de Blake Crouch

A premissa do livro é ridiculamente simples e muito difícil de responder: você é feliz com a sua vida? Você está, de fato, satisfeito com as escolhas que fez? Se pudesse mudar, se tivesse a chance de fazer tudo diferente, você faria? E a que custo faria isso se fosse possível? Pois para o protagonista, Jason Dessen, todas essas perguntas foram feitas, mesmo que ele não quisesse respondê-las.

O livro
Jason está em casa com sua esposa Daniela, ex-artista plástica e com seu filho, Charlie, fazendo macarrão. Professor em uma faculdade de médio porte, Jason pensa na carreira acadêmica que deixou para trás enquanto a família conversa animadamente. Ele poderia ter sido um cientista de renome, ganhador de prêmios, mas optou pelo casamento e pela família, a quem amava profundamente.

Resenha: Matéria Escura, de Blake Crouch

Aqui neste momento, feliz e ligeiramente embriagado em minha cozinha, nem imagino que hoje à noite tudo isso acabará. Será o fim de tudo o que conheço, tudo o que amo.

Naquela noite, ele sai para comprar sorvete e para no bar local para cumprimentar o colega que ganhou um cobiçado prêmio científico. Mas na volta, Jason é sequestrado e tratado com pura hostilidade por um homem que parece conhecê-lo bem demais para seu gosto. Ele antecipa suas ações, seu movimentos e o leva para um complexo industrial abandonado nos arredores da cidade, onde o obriga a tirar a roupa e a andar no escuro até o subsolo do complexo. Lá embaixo, implorando por respostas, machucando os pés no chão sujo, o sujeito ele lhe aplica alguma substância química. Temendo pela vida, Jason pergunta várias vezes o que aquele homem quer, até que a inconsciência o abraça.

Ao abrir os olhos e voltar à consciência, Jason encontra pessoas que nunca viu, mas que pelo visto o conhecem muito bem. Ele é tratado como se viesse de uma área endêmica e em seguida interrogado. Percebendo que elas não lhe diziam o que quisesse saber, ele foge e vai para casa, mas o que encontra o deixa completamente atordoado: é sua casa, mas não é. Pois sua família não está lá. O que lhe recebe depois da porta é um ambiente quase estéril, uma casa de um homem solteiro, sem filho, sem esposa, sem família.

Jason teve sua vida trocada por ele mesmo. Pense nisso. Você aparece e a força a trocar de vida... consigo mesma. O Jason daquele mundo trabalhava com realidades paralelas e criou uma maneira de poder transitar entre as infinitas realidades admitidas pela física. Em algum momento, ele topou com o Jason professor, pai e marido e algo o transformou. Ou foi o gatilho para o sequestro. E agora?

Blake Crouch conseguiu explicar física e realidades paralelas sem ser chato ou maçante. Ele conseguiu ser didático e ainda colocar as explicações no meio da ação. Jason tenta encontrar o caminho para casa, encontrando mundo completamente distantes da realidade, onde qualquer coisa pode ter acontecido. Curti muito a forma como o "sistema" de viagem funciona e como ele funciona elegantemente no enredo. Mesmo que você não entenda muito de física, o autor te convence que a maneira inventada pelo outro Jason é plausível.

Personagens irritantemente bem trabalhados e apesar de ter achado os capítulos meio longos e de perto do final eles se arrastarem, Blake conseguiu se valer da ciência para gerar um dilema ético bastante profundo. Com a possibilidade de ir para, literalmente, qualquer lugar, que tipos de lugares você poderia conhecer? É bem tentador, não é mesmo? Acho que no lugar de Jason eu teria explorado muito mais.

Eu já tinha lido o livro em inglês e a tradução ficou muito boa. Li em ebook, mas a edição física brasileira é de capa dura e o trabalho gráfico ficou muito bonito. O mesmo ritmo que encontrei no original foi mantido no livro e sem grandes problemas com adaptações de palavras ou frases. Inclusive a parte científica ficou bem explicada. O livro será adaptado em breve para o cinema.

Não posso deixar de pensar que somos mais do que a soma total de nossas escolhas e que todos os caminhos que poderíamos ter trilhado influem de algum modo na matemática da nossa identidade.

Obra e realidade
Ficção científica já tratou muito de realidades paralelas. É um tema bem comum em diversas séries, em gera apresentando "universos espelhos", onde o protagonista bonzinho é mauzinho no lado de lá. Obviamente que não dá para saber como seriam nossas versões nessas realidades alternativas. São muitas as variáveis que compõem nossa personalidade. Se cada decisão que tomamos abre um novo ramo de experiências, pense então quantos exemplares de você existem por aí, nas mais diversas situações?

Dá até dor de cabeça de pensar que se você deixou de comer o lanche podrão no almoço para comer a salada e o suco saudável, uma mudança aconteceu em outra realidade. Pode ser que na realidade da salada você viva mais ou seja atropelado por ter saído mais cedo do restaurante. Ninguém sabe! E ainda bem, porque eu não sei como conseguiria lidar com várias "mim" por aí. Como eu poderia continuar sendo eu mesma?

Blake Crouch

Blake Crouch é um escritor e roteirista norte-americano. É autor da trilogia Wayward Pines, que virou série de TV pela FOX.

PONTOS POSITIVOS
Ciência bem explicada
Realidades paralelas
Personagens bem descritos
PONTOS NEGATIVOS

Final apressado
Pode ser lento em algumas partes

Título: Matéria Escura
Título original em inglês: Dark Matter
Autor: Blake Crouch
Tradutor: Alexandre Raposo
Editora: Intrínseca
Páginas: 352
Ano de lançamento: 2017
Onde comprar: Amazon

Avaliação do MS?
Leitoras que tenham medo de livros de ficção científica podem se jogar em Matéria Escura. O tema a respeito das realidades paralelas pode parecer complicado em um primeiro momento, mas o autor soube trabalhar o tema sem torná-lo maçante ou complicado. E você vai se fazer as mesmas perguntas do protagonista, enquanto ele vaga pelas realidades que encontra. Você é feliz com sua vida? Quatro aliens para o livro e uma forte recomendação para você ler também.


Até mais!

Já que você chegou aqui...

Comentários

  1. Vi esse livro na Saraiva essa semana e fiquei na dúvida se levava ou não. Vou confiar na recomendação da capitã e comprar já. :D

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  2. Oi Capitã, li e gostei de sua resenha e do livro e agora, me dei conta de que não sei o motivo do título do livro... você tem alguma ideia?

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    Respostas
    1. Se entendi o livro corretamente, é porque entre essas "realidades" que o protagonista experimenta, há um grande vazio escuro desprovido de vida.

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    2. ... faz sentido. Eu li com a expectativa dele fazer uma explicação bem explicita no texto, rs. Valeu pela resposta!

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