A Chegada e o medo do outro

A Chegada é um dos filmes mais relevantes da ficção científica e um dos grandes sucessos do ano passado. Não me conformo que Amy Adams não ganhou uma indicação ao Oscar pela interpretação da linguista e professora Dra. Lousie Banks. Porém, recentemente uma crítica me deixou intrigada. De que o filme é parado. Eu já tinha comentado na resenha que isso era algo que poderia incomodar algumas pessoas. Mas há um motivo para as pessoas acharem isso.

A Chegada e o medo do outro

Se você pegar a longa história da ficção científica em matéria de primeiros contatos com alienígenas, verá que a forma como que isso é representado é quase sempre o da invasão catastrófica, muita batalha heroica pelas ruas dos Estados Unidos, com personagens que se tornam o salvador do dia, cercado de grandes efeitos especiais. Só pra citar alguns títulos aqui, temos Independence Day, Invasão do Mundo - Batalha de Los Angeles, Skyline, Marte Ataca, Guerra dos Mundos, Battleship - Batalha dos Mares, Oblivion, e a lista continua.

Alien, em inglês, é tanto um extraterrestre, quanto um imigrante. E é bastante intrigante notar que a indústria cinematográfica associa contatos com aliens como sendo algo mau, que sempre é uma invasão, que apenas coisas ruins acontecerão quando contatarmos o outro. Além disso, os filmes mostram que há algo de absurdamente especial na Terra e que os aliens destruirão toda a nossa civilização para obter. Essa mensagem está ainda mais forte agora com Trump e suas restrições a imigrantes, além do preconceito descarado que essa ação evoca.

É aí que entra a importante mensagem do filme A Chegada, dirigido por Denis Villeneuve, ainda mais no momento em que o filme estreou. O filme mostra como é longa a jornada para entender o outro. Quando a Dra. Banks reitera a importância de ser fluente no idioma alienígena é porque ela sabe que uma palavra mal interpretada pode causar mais problemas do que se imagina. Enquanto as autoridades estão ansiosas para conseguir alguma coisa dos visitantes, ela pede paciência, pois ela precisa de tempo para ensinar seu idioma e aprender o deles.

Essa situação é bem semelhante a um episódio de Star Trek A Nova Geração, em que um mediador de conflitos, Riva, que é surdo e mudo, precisa conciliar um planeta cuja população está à beira da extinção após séculos de guerra. Ele decide ficar entre a população para ensiná-los a conversar com ele. Enquanto aprendem a conversar com Riva, eles aprenderão a conversar entre si. Audacioso, mas que evoca a questão da longa jornada.

Sempre há medo e desconfiança entre desconhecidos. Entender o outro é uma longa jornada de descobertas sobre si, sobre o outro e ninguém disse que isso é fácil. Barreiras culturais e linguísticas podem causar estranhamento, podem levar a desentendimentos. Ações beligerantes das pessoas, movidas pelo medo e desconhecimento, causaram mais tragédias na Terra do que todos os filmes de Hollywood. Em um mundo feito pelas migrações - já que o Homo sapiens se espalhou da África para o mundo e assim somos todos imigrantes, de uma maneira ou de outra - você ter preconceito com o outro é incompreensível, é uma coisa movida apenas pelo medo.

Heptapods alfabeto

Para entender o outro, é preciso paciência, coragem e perseverança. É preciso diálogo e muita certeza do que se está dizendo, pois a falta de entendimento, aliada à má interpretação e preconceito podem levar a consequências terríveis. É por isso que a Dra. Banks reluta em fazer várias perguntas que as autoridades querem, ela sabe que os heptapods não vão entender ou responderão de uma maneira que não consigamos compreender completamente. Uma palavra mal interpretada quase causou uma guerra mundial.

Não pense que o filme fala só de contatos aliens, ele fala sobre a forma como conversamos uns com os outros. E que essa jornada de entendimento e compreensão sobre o Outro é longa, não está isenta de erros e sofrimento, mas que vale à pena ser seguida.

Até mais!

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Comentários

  1. A Chegada virou um dos meus filmes favoritos. Eu não consegui segurar as lágrimas no final. Que filme <3

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  2. Que análise bonita e interessante! Eu me emocionei bastante durante o filme é saí do cinema com reflexões parecidas, sobretudo sobre como a própria concepção do tempo se interliga à forma como nos comunicamos. Enfim, baita dum filme. Lamento, também, a não indicação de Amy para melhor atriz.
    Adoro seus textos, Sybylla!

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  3. Gostei muito desse filme. Eu achei o filme parado tb, mas tinha como ser de outro jeito? Parece que hoje em dia cinema só é bom se tiver correria e cortes de videoclipe! rsrsrs
    Assisti pensando que seria algo tipo um novo Contato, mas ao terminar, percebi que a comparação era injusta com os dois filmes. E pelo que vi, não acho que a Amy merecia nem indicação ao Oscar, não. Nesse ponto, sou obrigado a discordar, pois ela não entregou nada demais em se tratando de atuação nesse filme. Pra mim o filme é bom pelo roteiro e pela direção, as atuações estão na média, nem boas, nem ruins.

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  4. Adoro como estes filmes são na verdade, tapas com luvas de pelica (ou até mesmo uma porrada certeira) em se tratando de relações humanas. A alegoria com aliens, barreiras linguísticas, conflitos, leva - ou deveria levar - a uma reflexão sobre o que estamos fazendo com nossa humanidade, com nosso planeta.
    Ainda não assisti o filme, mas já está na minha lista :-)

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